mesmo tempo que serve o indivíduo, deve também servir a colectividade - e servi-la por modo seguramente eficiente. Assim se na na encíclica Quadragésimo Anuo:

Os fins da propriedade são atender às necessidades humanas do proprietário e também às do bem comam da sociedade.

Quando, no inicio da passada legislatura, me foi dado falar pela primeira vez nesta Câmara, fiz, entre outras, esta afirmação, que talvez tenha 'parecido estranha:

Importa que o rico com perfeita inteligência da função social da riqueza seja cada vez mais rico, precisamente para que o pobre seja cada vez menos pobre.

Note-se, Sr. Presidente, que eu digo: «o rico com perfeita inteligência da função social da riqueza, isto é, com exacta consciência das suas graves responsabilidades, com rigoroso sentido dos deveres que a Providência lhe atribui, com um conceito insofismável da justiça, que todos temos de servir indefectivelmente.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - De facto, não há que temer a «mais riqueza» em mãos de quem sinta e veja o seu valor social e quando ela se realiza, não pelo insaciável e desmedido alargamento dos seus domínios, mas pela sua cuidada e zelosa valorização em vivo empenho de servir mais e melhor o bem comum e ajudar por forma eficiente o robustecimento da economia colectiva.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador:- Quando o rico vive assim profunda e intensamente este sentido da riqueza, necessariamente o pobre só torna menos pobre.

A valorização da terra em ordem a um maior e melhor rendimento é já, só por si, notável contributo para que na casa do pobre haja mais pão e menos frio.

É quando a este esforço de valorização da terra se junta, como importa, o contacto pessoal e permanente do proprietário com os seus servidores, conhecendo-os, estimando-os, amparando-os, fazendo-lhes sempre sentir a sua presença amiga, móis assegurada se torna aquela melhoria de vida a que todos ansiosamente aspiramos.

Porque o pobre, Sr. Presidente, tem necessidade, que é também direito, de sentir, em todas as emergências, a reconfortante e tranquilizadora presença do rico.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - E quem poderá medir, em toda a sua extensão, os benefícios de ordem moral e social que desta salutar presença necessariamente resultam?

É observar, é ver os frutos de bênção que consoladoramente se verificam nos meios onde o grande proprietário, em vez de fugir da terra, mais se prende a ela e a quantos com ele colaboram na sua exploração e maior valorização!

A riqueza em mãos assim é certamente um incontestável bem para todos e a sua posse perfeitamente legitima e justa.

Quando, porém, estas salutares condições se não verificam, será possível justificá-la e legitimá-la?

Infelizmente, Sr. Presidente, mantém-se ainda inalterável em muitos espíritos o funesto conceito individualista da propriedade, com todas as desastrosas consequências que inevitavelmente daí advêm.

E então surge naturalmente a pergunta:

Qual é, neste caso, é dever do Estado, a quem rigorosamente compete velar pela segurança do bem comum? Até onde os seus direitos?

Oiçamos a voz da Igreja, que é sempre e profundamente exacta, porque toda inspirada na caridade e na justiça.

Em carta dirigida em 1952 ao presidente das Semanas Sociais de França, dizia Sua Santidade o Papa Pio XII:

famílias, não será servir o bem comum contribuir oportunamente para fazer renascer a confiança, estimular o crédito, acabar com o egoísmo e facilitar assim um melhor equilíbrio da vida económica ?

Próprio do Estado é velar porque os mais pobres não sejam injustamente lesados. Sobre este extremo o ensinamento dos nossos predecessores é terminante : na protecção dos direitos privados os governantes devem sobretudo preocupar-se com os fracos e os indigentes.

O Sr. João do Amaral: - Nesta questão há dois problemas: o direito de propriedade privada em si; e outro, o uso que se faz desse direito de propriedade.

A limitação do direito de propriedade em si, considerando-a subordinada aos interesses da sociedade, não me parece ortodoxa.

O Orador: - E quando o uso da propriedade prejudica gravemente os interesses da sociedade?

O Sr. João do Amaral: - Parece-me que havia grande conveniência em não estabelecer uma confusão com o direito de propriedade, que esse não tem limitação nos interesses da sociedade, pois é um atributo da pessoa humana; antes se deve estabelecer uma distinção nítida entre a riqueza e o uso, moral ou imoral, justo ou injusto, desse direito de propriedade.

O Orador: - Não me parece que seja muito difícil definir até onde vai o uso legítimo e onde começa o uso ilegítimo.

O Sr. João do Amaral: - O que pretendo é que não se confundam os dois.

O Orador:- Já afirmei aqui que o direito de propriedade é de direito natural; porém é necessário que o uso desse direito sirva, não só o interesse do indivíduo a quem pertence, mas também e eficientemente o bem comum.