Meses antes da entrega da administração do Império das Índias, feita em 1947 pelos Ingleses aos naturais daquele território, um dos principais chefes de determinada facção política indiana, o Sr. Loya, permitiu-se a ousadia de ir a Goa fazer comícios a favor da integração do nosso território na futura União Indiana. Preso e posto na fronteira, anunciou, alto e bom som, que não tardaria a regressar, mas dessa vez à frente de milhares de voluntários indianos, que acabariam com o domínio português naquelas partes do continente asiático.

A essa ameaça respondi, quando Ministro das Colónias, que Portugal não abandonaria a Índia senão pela força, e só depois de correr muito sangue. Era isto o corolário resultante de disposições constitucionais e de declarações de ordem geral do Chefe do Governo. Marcou-se assim, por parte do Ministério das Colónias, uma orientação tendente a esclarecer os presumíveis agressores dos nossos pontos de vista e, ao mesmo tempo, assegurar aos noss os irmãos que ali viviam, apreensivos sobre as nossas intenções - depois dos exemplos de abandono da Holanda e da Inglaterra -, que não negociaríamos a sua entrega fosse com quem fosse.

VV. EX.ªs compreendem, pois, a grande satisfação com que ouvi as declarações do Sr. Presidente do Conselho, que tanto contrastam com certas hesitações de outros elementos a que adiante me referirei.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Mas continuemos.

O reforço da exígua guarnição militar da nossa índia com uns milhares de homens, levado a efeito a seguir àquelas minhas declarações, fez arrefecer o entusiasmo bélico do chefe político a que atrás aludi, restituiu a calma à população e fez com que durante três anos a vida do Estada da índia decorresse sem incidentes de maior. Visava aquele reforço militar a impedir que a erupção dos anunciados milhares de irregulares, recrutados mesmo entre a escória de Bombaim, nos infligisse o vexame de uma vergonhosa capitulação, que os escassos duzentos soldados goeses da guarnição certamente não poderiam impedir. E tal objectivo foi conseguido, como atrás ficou exposto.

Não tinha, porém, o Ministério, com a adopção da medida atrás mencionada, a estulta pretensão de resistir vitoriosamente a um ataque em força, promovido por tropas regulares, que, de resto, não se mostrava então provável, hipótese essa que só mais tarde foi encarada e deu origem a uma proposta para a adopção de novos medidas de defesa.

Decorreram alguns anos, e, como a anunciada marcha das hordas do Sr. Loya sobre Goa tinha bastantes riscos, contentaram-se alguns dos seus sequazes, enquadrados por forças de polícia, em fazê-la sobre os nossos enclaves de Dadrá e Nagar Aveli, depois de bem isolados estes por tropas, criando-nos assim uma situação de difícil saída. Difícil e delicada, o que faz com que o problema da reocupação continue em aberto e de solução coda vez mais complicada, à medida que elementos oficiais da União Indiana ali se vão instalando e expulsando quantos nos são fiéis.

E, como não é sem razão que a imaginação dos Orientais é considerada inesgotável em ardis e subtilezas, aí temos nós agora, de vez em quando, umas dezenas de pobres diabos esfomeados a atravessar a nossa fronteira, na intenção de nos enervar e de provocar medidas oficiais que justifiquem, melhor ou pior, uma intervenção das forças do seu país. O fiasco,

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Como devemos encará-la?

A guerra! Acontecimento bem sério e de consequências bem graves, é ele! Espera-se, por isso, e ainda, que a inteligência do Sr. Nehru saiba medir bem o que ela representará para o seu país, principalmente no aspecto moral; para o nosso, e sabe-se lá se para todo o Mundo, e que, portanto, ele evitará ser o causador de calamidades imprevisíveis.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Mas se tal se não der e tivermos de a sofrer, aceitá-la-emos como último recurso, a que somos forçados, em defesa do nosso direito, que se estrutura em princípios universalmente aceites como regras da convivência internacional dos povos civilizados.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Ela não nos acovardará. Portugal nasceu envolvido em guerras na Península com Mouros e Castelhanos; Portugal cresceu, sucedendo-lhe outro tanto em cinco continentes do Mundo, habitados por homens de todas as raças, de todas as cores, de todas as religiões; Portugal tem, enfim, uma história em que quase todas as suas páginas são ilustradas com clarões de glória, de epopeia, de sacrifícios sobre-humanos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E os maiores desses clarões brilharam na Índia, como certamente é do conhecimento do Sr. Nehru.

Portugal, pois, se considera a guerra como sendo uma grande tragédia humana a evitar, sempre que possível - e neste caso ele já deu mostras de extraordinário espírito de conciliação -, não o fará, como já o disse o Sr. Presidente do Conselho, sacrificando a sua honra e o seu direito, esteja S. Ex.ª o Pândita bem certo disso.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - O nosso melhor armamento e equipamento deve ser-lhes dado, pois, sem hesitações. Não de-