O Orador: - Região essencialmente, medularmente agrícola, em que a propriedade se encontra dividida, a bem dizer pulverizada, com um índice muito elevado de densidade demográfica, é esmagadora a percentagem dos seus habitantes que se consagra ao amanho e granjeio da terra. E enquanto uns lá vão fruindo uma razoável mediania de vida, outros, banhados em suor, curtidos de sacrifícios sem conto -que o apego à courela, a alma ancestralmente votada à belga, o amor com que tratam do eido, grandemente suavizam-, fazem prodígios de autêntico milagre no aproveitamento exaustivo do agro - em pão, em horta, em vinha. E nada pode desperdiçar-se, e ainda é preciso dar o dia fora para que a barca da vida singre em mar que quase nunca ou só raríssimas vezes é chão ...

Será interessante pôr em evidência que os dados estatísticos obtidos em 1950 nos indicam que há no País 888 237 famílias agrícolas, constituídas por 3 814 285 pessoas.

Considerando a sua distribuição por distritos, é o de Viseu o que possui número mais alto daquelas famílias, do mesmo passo que ocupa, entre os demais, um lugar de vanguarda quanto ao número de homens e de mulheres que exclusivamente se dedicam à faina dos campos.

Posso afirmar, à parte as diferenciações do meio físico, sob certos aspectos considerado, que os caracteres do elemento humano, o enquadramento do habitat da conhecida região de Lafões, cujos vinhos vão num crescendo de fama, são, mutatis mutandis, os mesmos, com o esclarecimento de que, tanto nesta região vitivinícola como naquela outra, há o largo predomínio do pequeno proprietário: para o Dão, num total de 31.000 produtores, relativamente a uma litragem global média de 73 000 000, são quase 23 000 os que colhem menos de 2500 l; no que respeita a Lafões, em relação a 12 000 produtores, com a média duma litragem da casa dos 11 000 000, são cerca de 11 000 os que colhem, igualmente, menos de 2500 l.

Daqui se infere que, na verdade, referentemente a um elevado número de proprietários a área de cultura da vinha é tão reduzida e são tão minguadas as colheitas que as plantações feitas, uma de duas: ou visam garantir a satisfação das necessidades do consumo de vinho dos casais e casas agrícolas, ou, ratinhando e apertando imenso os gastos caseiros que dele são feitos ao pensar-

-se no preço da sua eventual venda, podem, por isso mesmo, vir a representar um elemento adjuvante para o menor desiquilibrio do magro orçamento familiar.

Nestes específicos casos, a propósito deles decalco o preâmbulo do Decreto-Lei n.º 38 525 para acentuar, por meu turno, que, respeitando, muito embora, o regime geral do condicionamento do plantio, «devem evitar-se restrições e impedimentos desnecessários à realização do fim da lei». A este ponto apraz-me dar-lhe um especial realce.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Ora, aquela realidade, que não pode desfigurar-se, oferece logo um início de pretexto para que saliente o fundamental aspecto de carácter social adstrito à nossa vitivinicultura. :

Com efeito, e encarando o problema em debate através duma mais larga visão, também pelo lado social, e essencialmente por ele, não deve descansar o Governo, e não descansará, como já principiou de prová-lo e mais deixa pressentir, em perfilhar soluções que vão de encontro e realizem os anseios manifestados em torno da efectivação deste aviso prévio.

Causa apreensões só pôr a hipótese, cuja objectivação teria as mais perturbadoras e funestas consequências, de que a concorrência da torrencial abundância de vinhos obtidos a baixo custo de produção pudesse conduzir as regiões tradicionalmente vinícolas, creditadas já no consenso geral pelos seus produtos de primeira qualidade, à horrorosa situação de abandono dos seus vinhedos.

Seria ainda verdadeiramente catastrófico pela ri queza desperdiçada, com sério risco de não pouco capital despendido ficar improdutivo e se perder, bastando que consideremos em quanto importa a aquisição de um hectare de terreno, mesmo bravio, registando-se ainda o juro do dinheiro nela investido e mais as verbas gastas com contribuições, surriba, estrume e seu transporte;, abertura de valas ou covas, pessoal empregado nestes trabalhos, compra, transporte e embalagem de bacelos, custo da sua plantação, valor dos juros a tomar em conta, necessidades de retaucha, aplicações de adubo depois, mais tarde a enxertia e outras operações ...

Enfim, seriam patrimónios que desoladamente se desfaziam, sem vantagem para ninguém e com malefício geral, pois também fatalmente havia de verificar-se a maior tragédia da crise de mão-de-obra rural, por não ter já em que aplicar-se.

Criar-se-ia, em consequência, uma situação calamitosa para os proprietários, para milhares de trabalhadores do campo, para as condições de vida do comércio e indústria regionais, para a própria economia nacional.

Seria o espectro da miséria e da mais negra fome pairando em muitos lares.

Vozes: - Muito bem, muito bem !

vo por todos visado e que é, na expressão do ilustre titular da pasta da Economia, o reajustamento económico dos preços dos produtos vínicos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: não querendo reeditar razões já produzidas, as quais, aliás, francamente corroboro, mas tão-sòmente formular meia dúzia de pertinentes considerações sobre o problema em apreciação, natural é, todavia, que os bons espíritos, como quem diz os bem-intencionados espíritos, se encontrem. Assim, direi que:

a) Deve proibir-se terminantemente e tolher-se de uma vez para sempre a plantação ou possibilidade de plantação em terrenos de várzea ou facilmente irrigáveis, porquanto são aptos para outras culturas capazes de remuneração;

b) Deve rever-se o texto do Decreto n.º 38 525, em termos de que o seu articulado se ajuste fielmente e (...)