sem paralelo: a que Ricardo Espírito Santo desenvolveu no campo das artes e das letras!

Quantos artistas puderam afirmar-se como tais graças ao seu amparo; quantas publicações se editaram sob o seu incentivo e patrocínio; quantas obras de arte dispersas pelo Mundo vieram ou regressaram a Portugal por sua interferência!

E, como se tudo isto não bastasse para que a contei corrente da sua vida tivesse já um saldo sobejamente credor, quanta gratidão devemos todos ainda a esse homem excepcional que há dois anos nos legou a Fundação Ricardo Espirito Santo, num gesto magnânimo de verdadeiro príncipe da Renascença, que, a bem da Nação, abdicou de tão avultada fazenda e de tão preciosa colecção.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Este formosíssimo museu de artes decorativas, constituído exclusivamente por obras portuguesas do maior interesse, é bem o espelho da sua alma de artista e do seu coração generoso, e é também, só por si, motivo de gratidão geral.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:-Por isso, evoco aqui com sentido pesar, e já com dolorosa saudade, o nome de Ricardo Espirito Santo, que a partir de boje se inscreve nas sagradas páginas da história, e faço votos para que a sua alma encontre no Céu a paz que merece, e que o exemplo da sua benéfica acção frutifique na Terra, inspirando novos e semelhantes feitos, como fonte criadora de valorização nacional.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

O Sr. Presidente: - Continua o debate sobre o aviso prévio apresentado pelo Sr. Deputado Paulo Cancella de Abreu relativamente a problemas Vitivinícolas.

Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Garrett.

segue o que aqui se diz. E o esclarecimento poderá talvez contribuir, ainda que modestamente, para as conclusões do debate.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Parto de duas premissas fundamentais:

1.ª O vinho è um alimento de grande utilidade;

2.ª O alcoolismo só em pequena parte deponde do hábito de beber vinho.

O vinho não é apenas um soluto de álcool etílico. E uma complexa mistura de substancias nutritivas, proteicas, glucídicas e salinas, rico em vitaminas. Pelos éteres aromáticos, principalmente, é um alimento eupéptico. O álcool produz sete calorias por grama, o que dá ao vinho um valor energético importante.

O álcool ingerido absorve-se rapidamente, difunde-se por todo o organismo, é oxidado à medida que nele vai entrando, desde que o ingresso não seja grande, nem rápido. Se assim não for, o organismo tenta eliminar o álcool que não pode queimar e, se a eliminação total do excesso se não faz com brevidade, o álcool impregna as células dos tecidos orgânicos e intoxica-as. As investigações cientificas sobre estes fenómenos mostraram que durante a refeição podem ingerir se, sem qualquer inconveniente, entre 2 dl e 5 dl, segundo a massa corporal de cada indivíduo e a sua feição nutritiva. Fora das refeições, estas quantidades, para serem inócuas, têm de ser bebidas lentam ente, aos poucos.

Em suma, o uso moderado do vinho, nos termos que acabo de lembrar, é benéfico e aconselhável, por ser um alimento higiénico de notório valor.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:-O abuso do vinho conduz, como é sabido, a fenómenos de intoxicação aguda ou crónica, sendo esta a que sanitariamente mais interessa, pelas lesões irreversíveis que provoca. O alcoolismo de origem vi n iça é, porém, menos importante que o devido às bebidas fortemente alcoólicas de graduação superior a 40, as quais geralmente dão intoxicação crónica sem o alarme da intoxicação aguda; e isto ainda é mais sensível quando contêm, além do álcool etílico, álcoois diversos de maior toxicidade sobre o sistema nervoso. Isto faz com que o público olhe, sobretudo, para o alcoolismo provocado pelo vinho, impressionado pelo espectáculo da embriaguez, sem saber que há alcoólicos que nunca se embriagaram.

A intoxicação crónica pelas bebidas alcoólicas é, afinal, da mesma ordem que as intoxicações causadas pelo abuso de outros géneros alimentícios, tal como sucede com o relativo a carnes e gorduras, responsável pelo desgaste visceral, sobretudo do fígado e dos rins, e p elo endurecimento das artérias, estados patológicos tão frequentes nos indivíduos de alimentação rica.

Resumindo: a higiene indica ser o vinho um alimento de alta qualidade, que a todos convém, desde que bebido em quantidade e forma que o não transforme de útil em prejudicial. Verdade esta cientificamente firmada, que já Hipócrates, o pai da Medicina, na velha Grécia, por simples observação, havia proclamado. Não é por haver uns quantos que dele abusem que esta verdade deixa de se impor.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:-Posto isto, qual deverá ser o consumo desejável para o total da população?

Abstraindo os menores de 10 anos, que aliás devem beber, mas em diminutas quantidades, podem estabelecer-se as seguintes rações médias diárias: 3 dl para adolescentes e mulheres e 6 dl para os homens. Estas médias correspondem às variações individuais, tendo em conta as idades e as ocupações, de trabalho físico ou sedentárias. São médias determinadas com grande parcimónia,