pelos estreitos vales e abruptas vertentes dos rios afluentes, tais como o Corgo, o Pinhão, etc.

Deputado eleito pelo círculo de Vila Real, impus-me o dever de mais uma vez levantar a minha voz em prol dos legítimos interesses do Douro. Mas mais resoluto o faço, certo, como é, ser a questão do Douro uma velha, mas sempre candente, questão nacional.

Naqueles xistos e naquela disposição e exposição de terrenos a Natureza marcou as características de uma região única, propícia ao cultivo e produção de um tipo único que não tem igual ou congénere.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mais ainda: é que, sem esse cultivo, o Douro não seria mais do que uma árida e requeimada região, pela impossibilidade de outras culturas. É o tipo perfeito da monocultura, só possível ali com o produto rico que possa compensar o trabalho ciclópico do homem, sempre curvado na luta contra a erosão das enxurradas que do alto se despenham em catadupas; curvado ainda e sempre na dura safra de erguer e recompor muros, da cava, do trato constante da vide até à colheita ou vindima; o trabalhador do Douro desenvolve um esforço e realiza uma obra bem diferente, na dureza, da dos seus similares de outras regiões.

Ali, no Douro, só a custo da picareta e do ferro se rasga a terra; bem diferente nas várzeas e planuras, em que a charrua ou o arado reduz o esforço violento e continuado do simples braço do homem.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Eis porque na base do problema da vitivinicultura existe uma condição prévia a que devem obedecer as medidas a tomar: a da diversidade das vinhas e dos vinhos. Entendo que não há só um problema vitivinícola, mas alguns problemas vitivinícolas. Podem s devem conjugar-se num plano superior de medidas comuns no que é comum, mas diversas no que diz respeito a cada um dos problemas.

Julgo que igual injustiça há em tratar diversamente os que se encontram em igualdade de condições, como em tratar igualmente aqueles que se encontram em situações diferentes.

Vozes: - Muito bem!

lar sobre o assunto, dando a cada zona o seu lugar próprio e diferenciado no plano comum da vitivinicultura e no superior plano nacional.

Na administração também, Sr. Presidente, os municípios não são inteiramente iguais e menos ainda o deveriam ser. Da mesma forma as actividades agrícolas, como aquela de que tratamos, devem ter na diferenciação, que a realidade nos aponta, a base de tratamento adequada.

É o melhor meio de integração do particular no geral e de evitar as lutas que neste campo têm derivado, não da consideração específica e própria de cada região, mas antes do igual tratamento nivelador que, ao contrário da justiça e da verdade, afina pelas mesmas regras e tratamento do que é diferente.

Ninguém dirá que os privilégios concedidos por Pombal e João Franco ao Douro arruinaram ou prejudicaram por esse facto a economia da Nação, em que o vinho teve primacial papel de enriquecimento.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:- Sr. Presidente: vem de longe a tradição dos preciosos vinhos do Douro, que em suas qualidades nos aproximam dos referidos por Catão e Horácio:

O mássico, o caleno, o falerno e outros.

E aqui, neste nosso Douro, de ravinas e torrentes, os Romanos deixaram os vestígios da sua passagem e do seu gosto, como podemos deduzir das citações do grande bragançano abade de Baçal, referido por outro bragançano ilustre - o Dr. Águedo de Oliveira - no seu tão interessante e bem documentado livro Vinho do Porto, vestígios que consistem em moedas romanas, lápides, ânforas e talhas, algumas das quais se podem observar no Museu Abade de Baçal, em Bragança.

Os vinhos do Douro, que na boa medida inspiraram poetas e artistas e simples estúrdios de boa graça e pilhéria, tiveram a sua recatada vida medieva, trepidante de lutas e de heroísmo, intervalada de sossegos conventuais; depois, o vinho do Douro saudou os fulgores da Renascença s fez-se clássico; foi cortesão e peralvilho no dealbar do século XVIII.

Surgiu o século XIX e fizeram dele um romântico, elevando-o hiperbólicamente, sobretudo no fim dos repastos, a um produto de superqualidade e de preço.

António Augusto de Aguiar chamou-lhe o néctar dos deuses, a melhor ambrósia da garrafeira de Júpiter, o vinho dos bem-aventurados e dos opulentos; o vinho príncipe!

Mas hoje, Sr. Presidente, a vida é outra, debaixo de todos os seus aspectos, e sobretudo os gostos são outros.

Aquela hiperbólica concepção do vinho do Porto, que o faz vinho dos deuses, dos bem-aventurados e dos opulentos, passou de moda, e por isso aconteceu-lhe como aos últimos românticos, que se não adaptaram à nova vida e a um mundo novo.

Até à hora e a natureza das refeições mudaram, e com isso, e por outros motivos, também mudaram os gostos.

É preciso, pois, criar tipos e marcas que satisfaçam os gostos actuais.

Nesse aspecto há que diminuir a actual proliferação de tipos e marcas, reduzindo-os a número muito limitado. Só assim desaparecerá a natural indecisão do comprador e do apreciador, que se deixam ficar perplexos e hesitantes perante um rol tão extenso e variado de tipos e marcas e tão dispersivamente oferecidos.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Consultando os catálogos de algumas casas e companhias, como as casas Ferreirinha, Graham,