não poderiam deixar de ser determinantes duma política vitivinícola nacional.

O vinho, no valor principal das suas características organolépticas, não se coaduna com uma estandardização despersonalizada que o leve a considerar somente como um produto de fermentação, um composto químico de determinada composição organomolecular, em que a fórmula C2 H3 (OH), por exemplo, fosse suficiente para lhe puder conferir interesse de qualidade; está longe, para a conquista e manutenção de mercados, de se poder objectivar industrialmente por características laboratoriais correntes: subjective-se, no que toca à preferência que lhe dêem por razões que se estribam opulência da sua cor, na exuberância do seu cheiro, na riqueza do seu corpo, ira delicadeza requintada do sen paladar característico. Em todas aquelas características, portanto, que se não substituem nem se imitam e que plenamente se enquadram no inteligente aforismo que Brillat-Savaria não descurou de citar na sua Fisiologia do Gosto: «La gourmandise est un acte de notre jugement par lequel nous accordons la préférence aux choses qui sont agréables au goût sur celles Qui n'ont pas cette qualité».

É certo que o preço é frequentemente característica dominante no efectivar das transacções, mas não se pode separar da condição da qualidade, que resolve da escolha dentro de ordens de grandeza semelhante, ou que mesmo a impõe dentro de preços diferentes quando exactamente ti alta qualidade confere - como é o caso, muitas vezes - às curvas características de procura condições de particular rigidez.

Vozes: - Muito bem!

Era da conjugação, realmente, dum solo próprio e alcantilado, dum microclima deveras particular, de castas rigorosamente escolhidas, e amorosamente tratadas, de exposições especiais, do trabalho devotado e persistente do lavrador Duriense, a quem alguém já chamou o proletário mais sóbrio e paciente do Mundo, que era possível beber-se mais farde um vinho como aquele, para si qual não seria descabida a legenda que tão solenemente adorna um dos [...] de Bordéus: Regum mensis, arisque Deorum.

Nada disto, porém, nega, como se torna evidente, o lugar que si cada região caiba numa escala judiciosa de valores; o que deve é impedir que à custa dum excesso de quantidade que erradamente se crie, se é que se não criou já, venha a contribuir-se para a ruína daquelas melhores qualidades que se devem considerar indispensáveis para acreditar e manter o mercado português.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Não se poderia deduzir daqui, portanto - e nunca é domais repeti-lo -, que o Douro pretendesse, para viver, atropelar condenavelmente indiscutíveis direitos que caibam legitimamente a quaisquer outras regiões; o que ele exige, ao abrigo dos melhores princípios de equidade e de justiça, é que os outros lhos respeitem, e não vão à custa dele criar problemas sérios que, lhe acarretando prejuízos, prejudicam gravemente o próprio País também.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Está o Douro, de resto, particularmente à vontade para falar nesta triste questão do plantio da vinha, já a VV. Ex.ªs bem claramente exposta pelo ilustre Deputado que anunciou e iniciou este momentoso aviso prévio; de facto, e segundo registo cadastral da maior confiança, como é o da Casa do Douro, a cujos serviços presto, aqui, a homenagem que merecem, entre 1943 e 1953 o número de cepas desta região demarcada produtora de vinhos generosos passou de cerca de 128.6 milhões para quase 141 milhões: seja um aumento médio anual que se mede por 1 550 000 cepas, a representar uma percentagem média anual também de cerca de l.2 por cento, percentagem que não ultrapassou praticamente 1.3 por cento a partir de 1951 - convirá lembrá-lo-, correspondente A um aumento médio anual que oscila, desde então, por l 800 000 pés de vide.

A face destes números, ninguém poderia pretender que o Douro se excedeu no plantio, quando, pelo contrário até, é fácil de demonstrar, com base neles, que o Douro nem sequer tem plantado o mínimo que se tornava indispensável para manter, como se impunha, o volume de revestimento vitícola que nessa região se encontrava há uns dez anos atrás. E nisto a sua posição difere, total e simplesmente, da posição que se verifica em muitas outras regiões; dê-se a César, portanto, o que é de César, para se determinarem, na verdade, as causas dos nossos males.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - De facto, nos números que atrás referi não se devem encontrar abatidas, na sua totalidade, muitas cepas que entretanto morreram, do que resulta, que os números apresentados só poderiam considerar ainda por excesso.

Mas mesmo que assim não fosse, mesmo que os números referidos rigorosamente traduzissem o estado actual, real. do revestimento, bastaria lembrar que, admitindo já a duração média para a vide de vinte e cinco a trinta anos, sem pensar, portanto, nas quebras provenientes de secas e de enxurradas, precisaríamos de contar com um replantio anual da ordem dos 4 a 5 milhões de cepas, para se não descer abaixo dos valores inicialmente cadastrados, pela Casa do Douro, em 1940.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - É esta, Sr. Presidente, a dura realidade: uma região que pela força das circunstâncias que nos não cabe remover, é exclusivamente vitícola e onde haveria que preparar, portanto, um revestimento a tempo para suprir as quebras que ano a ano havemos de suportar. De resto, quem quisesse analisar objectivamente o problema do Douro iria encontrar na antiga e tradicional região demarcada, que só vinho pode produzir - e só vinho sempre produziu -, áreas vastas que a filoxera destruiu há cerca de oitenta anos e estão por replantar ainda: são os chamados «mortórios», onde se poderiam produzir vinhos da mais alta qualidade e que hoje apenas nos mostram, entre urzes e estevas, ruínas envelhecidas de prédios, de armazéns e de lagares.