Que eu creio, aliás, não dever atribuir-se só no nateiro a permanência da fertilidade no Ribatejo, em sensível decréscimo de resto, mas também, e muito, à estrumação verde, à verdadeira sideração que resulta do enterro mento das searas mortas pelas cheias. Mas este é outro problema, cujo estudo seria, todavia, interessante.

A inundação, pois, não é assim tão benéfica; e a inundação causa erosão de duas maneiras. Os americanos chamam-lhes erosão em ravina e erosão em folha. Nalguns pontos é erosão em ravina, que cava, mas na maioria é a erosão alastrada em larga folha - pacífica, mansa, discreta, que a pouco e pouco vai levando as matérias mais férteis dos solos.

Nestas áreas é que a vinha oferece boa maneira de fixação, e, ao contrário do que alguns têm mostrado pensar, é um elemento de fixação não tanto pelas suas raízes, mas pelos seus troncos e ramos, que reduzem a velocidade de curso cias águas e, portanto, a sua capacidade de fazer erosão, erosão em folha; esta a fixação que a vinha produz, porquanto, e evidentemente, não há árvore ou arbusto que resista à força da água quando ela é muita e rompe fundo.

Em suma, e insistindo: não é pelo seu sistema radicular que a vinha fixa a terra inundada, é pela sua rama, e pela diminuição que esta impõe à velocidade das correntes, que a defende à superfície - e aqui está a grande, a certa, a bem conhecida e largamente patente acção da vinha como elemento protector das terras erosionáveis. E depois a vinha resiste ao assoreamento melhor do que qualquer cultura herbácea: onde morre a seara resiste a vinha.

Andou acertadamente o legislador que previu o uso da vinha como defesa contra a erosão e contra os prejuízos do assoreamento, como meio de fixação da terra que pode ser deslavada e desgastada em superfície.

O Sr. André Navarro: - Julgo que essa argumentação, que é justificável, pode aplicar-se a todas os bacias hidrográficas que estão erosionadas. E o caso da bacia do Mondego, onde a erosão é mais intensa que na do Tejo e onde a vinha não foi utilizada ainda como elemento fixador.

O Orador: - Em relação ao Mondego não tenho de fazer críticas, pela não utilização da vinha, pois penso que será uma questão relativa aos habitantes dessa região, que não a quiseram empregar.

O Sr: Camilo Mendonça: - Não a deixaram plantar, o que é diferente. Houve uma razão técnica, pois os serviços entenderam -bem ou mal, mas entenderam - que naquela zona o vinho não era de qualidade e, consequentemente, não deviam autorizar o plantio.

Eu não sei o suficiente para dizer se os serviços agiram bem ou mal; apenas posso afirmar que foram razões técnicas que determinaram essa atitude, isto porque esse malfadado Decreto n.º 38 225 é mais restrito quanto às plantações nestes casos do que era o anterior, o de 1944.

O Orador: - Não sei se o decreto ó malfadado, se apenas mal aceite.

Agradeço ao Sr. Deputado Camilo Mendonça o ter respondido por mini ao Sr. Deputado André Navarro, e aceito a resposta.

O Sr. André Navarro: - Com a qual não estou de acordo.

O Orador: - A este respeito foi todavia aventada a ideia de ter a vinha o exclusivo dos merecimentos, citando-se designadamente os choupos como plantas também fixadoras.

Sem dúvida, mas creio não se dever pôr com tanta, simplicidade a alternativa. Raros serão, decerto, as terras ou as regiões que não aceitem senão uma espécie de plantação de interesse agrícola; o que compete ao agricultor é escolher, de entre aã várias possibilidades culturais, a de maior vantagem económica, que só a lei lhe deve dizer onde se opõe ao interesse geral.

Que se tenham plantado nestas terras do Ribatejo antigamente e agora, vides em vez de choupos ou outras espécies arbustivas ou florestais é simples acto de administração, de boa administração, que não merece críticas.

Doutro modo o argumento, que tem para isto dois gumes, autorizaria qualquer a discutir a legitimidade da viticultura em qualquer das regiões que clamam ser esta o seu melhor recurso, sempre que se pudesse apurar não ser o único, atenta sobretudo n hipótese de povoamento florestal.

O Sr. Daniel Barbosa: - V. Ex.ª dá-me licença P Tenho uma dúvida muito grande no meu espirite e desejaria que fosse esclarecido um ponto. A defesa de V. Ex.ª para esse plantio, que eu compreendo, estriba-se mima questão de qualidade ou, principalmente, numa questão de defesa da manutenção da terra para outras culturas?

O Orador: - Não estou a defender o plantio do Ribatejo no sentido de justificar que aí se tenha plantado maior ou menor número de pés em maior ou menor número de anos. Estou expondo as razões por que, ao contrário do que se tem dito aqui, não se leve entender que as inundações depositam só matérias férteis; e que as terras plantadas de vinhas são susceptíveis de serem economicamente aproveitadas para outras culturas.

O Sr. Daniel Barbosa: - Quer dizer: V. Ex.ª situa-se na análise restrita da província do Ribatejo.

O Orador: - Não estou fazendo uma análise; estou fazendo uma exposição de factos que, devido u minha experiência e conhecimentos de habitante da região, me parecem exactos, em oposição a noções que aqui foram apresentadas.

O Sr. Carlos Borges: - E que se aplicam a todas a regiões do País.

O Sr. Daniel Barbosa: - V. Ex.ª dá-me licença?

Eu aceito o problema como V. Ex.ª o põe, e a minha pergunta de há pouco visava esclarecer-me, pois compreendo que as várias regiões possam apresentar argumentos para a defesa do plantio, mesmo naquela em que na sua policultura a plantação da vinha representa um complemento de interesses.