«Tratemos dos espíritos, porque é no espírito dos homens que as guerras começam». Compreende-se que certas potências procurem, por meio de acordos intelectuais, bilaterais ou multipartidos, cimentar a obra da segurança colectiva. Precisarão, porém, de o fazer duas nações como Portugal e a Grã-Bretanha, que desde 1386 permanecem inalteràvelmente fiéis ao primeiro tratado de amizade e auxílio que assinaram e que, unidas perante as dramáticas vicissitudes de seis séculos de história, com justificado orgulho se proclamam os mais antigos aliados do Mundo? Cremos que sim. E vamos ver porquê.

único - na história política e diplomática das nações. Como tal tem sido largamente discutida nos países interessados e fora deles. Discutida pelos historiadores; discutida pelos homens de Estado; discutida pelos economistas (quanta tinta se gastou a comentar o tratado de Methwen de 170$, mais vantajoso para nós do que pretendeu fazer-nos acreditar a política francesa!); discutida pelos mestres do direito internacional, alguns dos quais, cá e lá, consideram inactual e demasiado fluida a armadura jurídica da aliança. Debilidade dos textos; pouco conhecimento mútuo dos povos. E, entretanto, nunca em qualquer tempo a aliança foi invocada por uma das partes, que a outra não acudisse, sem sombra de hesitações, ao seu apelo. Porquê P Porque a aliança luso-britânica não está apenas na letra dos tratados; está no instinto profundo das nações. É uma tradição que mergulha as suas raízes em seis séculos de história. Não será indispensável, como já se pretendeu, actualizar a sua expre ssão jurídica. E, porém, necessário fortalecer a aliança como sentimento; tornar mais viva a consciência desse e dogma histórico» (como lhe chamou o marquês de Soveral) na alma colectiva dos dois povos. O Prof. Hui-zinga, reitor da Universidade de Leiden, presidente da Academia Neerlandesa, consagrou uma verdade quando afirmou Já vinte anos em Genebra: «Há velhas nações amigas que mão têm pressa de se conhecer». Esta observação subtil ajusta-se como uma luva ao caso da Grã-Bretanha e de Portugal. O fortalecimento moral da aliança exige entre os dois povos um convívio mais íntimo, lima comunicação mais fácil, uma riqueza maior de informações recíprocas, um contacto mais frequente e mais directo, uma mais perfeita comunhão das juventudes -universitárias e escolares. Noutro tempo, o pouco que conhecíamos um do outro nos bastava. Encontrávamo-nos de século a século nos campos de batalha; combatíamos lado a lado; quando passava o perigo apertávamos fraternalmente as mãos e de spedíamo-nos até à próxima guerra, deixando aos netos - quando Deus quisesse- o encargo de recomeçar ia epopeia interrompida dos avós. Agora, os tempos mudaram. As condições do Mundo são diferentes. É em volta do gigantesco bloco anglo-saxão que se organiza, pela força do Pacto do Atlântico Norte, a defesa do Ocidente. A guerra tem de pensar-se em inglês. Não basta, como nos prélios medievais, vestir as armas mo momento próprio. É preciso forjá-los em comum, trabalhar em comum longos anos, asperamente, incansavelmente-não já para vencer uma guerra, mas para unia empresa mais difícil ainda: para a evitar. A colaboração das espadas não é suficiente; temos de assegurar a colaboração dos espíritos. A Convenção Cultural entre Portugal e o Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, agora submetida ao nosso exame, é necessária e vem na hora própria.