pequena extensão, comparada com a deste. Mas isso não impede que se estranhe a diferença de critérios.

Quanto ao lago Chiuta, ela pode justificar-se pela dificuldade de estabelecer uma linha média, dado o carácter mal definido das margens - em terreno pantanoso, que as águas ora submergem ora deixam a descoberto. Adoptou-se aí como fronteira a linha do meridiano de certo ponto da margem oriental, e, como esta faz uma bolsa para sueste, entrou considerável parte do lago para a soberania portuguesa, com o consequente direito para os habitantes de Moçambique de utilizarem todas as suas águas para a pesca e navegação.

Mas a respeito do lago Chirua, mais importante, não foi possível alterar a situação resultante do tratado de 1891; Portugal continua excluído da posse de qualquer porção das águas do lago, a não ser numa pequena enseada que a erosão cavou dentro da linha dos marcos da fronteira.

Dignos de apreço são os esforços que fez a delegação portuguesa, presidida pelo engenheiro Bui de Sá Carneiro, para obter a aceitação da linha média das águas como fronteira no lago Chirua. Mas a própria natureza tinha criado aí, desde que a fronteira fora inicialmente demarcada, uma situação de facto que dificultava as possibilidades de acordo. As águas do lago haviam recuado em relação à margem portuguesa, deixando a descoberto uma faixa de terreno, onde se tinham estabelecido algumas centenas de pescadores indígenas da Niassalândia. Não se aceitou nem que esses indígenas ficassem sob a soberania portuguesa nem que Portugal tomasse o encargo, a que se oferecia, de fazer a transferência deles para qualquer outro ponto do protectorado. Sob o risco de fazer gorar o acordo, houve que aceitar a situação e manter a fronteira primitiva.

Mas a situação não parece facilmente sustentável. Os indígenas de que se trata não podem subsistir sem o recurso à terra portuguesa para tudo o que o lago lhes não dá: a carne, a lenha e os produtos agrícolas. E a natural consequência do acerto de fronteiras agora estabelecido será que para o futuro os súbditos de cada uma das partes terão de conter-se rigorosamente dentro dos respectivos territórios. Para isso é que o traçado foi modificado noutros contos e se fez o acordo de nova demarcação. Deixaria de fazer sentido que nas novas circunstâncias os indígenas do Chirua continuassem a fazer culturas e cortar madeiras em terra de Moçambique.

Por isso se alimenta a esperança de que a questão possa ainda vir a ser revista e se não mantenha por muito tempo a situação anómala, que, felizmente, terminou no lago Niassa e, por fórmula diferente, no lago Chiuta. Além da divisão das águas dos dois referidos lagos, o acordo sanciona uma série de rectificações da fronteira terrestre na região da Angónia e de um pequeno troço na região de Mutarara.

A comissão mista luso-britânica que operou no terreno em 1899 e 1900 deveria proceder à demarcação da linha de cumeada que separa a bacia hidrográfica do Zambeze das do Chire e do Niassa, pois essa era a linha definida pelo artigo i do tratado de 1891.

Verificaram, porém, os comissários a enorme dificuldade e, por vezes, a impossibilidade de marcar no campo a linha divisória das águas, e acordaram em a substituir por uma sucessão de segmentos de recta a unirem pontos notáveis, intervisíveis, nos quais foram levantados marcos de pedra solta. A fronteira demarcada divergia, assim, da convencionada no tratado.

Com o andar do tempo os indígenas do ambas as partes estabelecidos nos territórios confinantes foram, aqui e além, invadindo o terreno alheio para estenderem as suas culturas e pastagens. Passou a haver súbditos portugueses em terras da Niassalândia e súbditos britânicos em terras de Moçambique e a fronteira de facto deixava de coincidir tanto com a do tratado como com a demarcada no terreno.

Esta situação criava, naturalmente, embaraços às administrações locais e foi fértil em conflitos entre os indígenas, por vezes com certa gravidade.

Acordou-se, pois, em encarregar a comissão mista de propor uma nova demarcação que conjugasse os interesses mútuos no terreno e legalizasse a situação existente onde isso pudesse fazer-se sem detrimento de qualquer das partes.

Do lado da Niassalândia havia interesse em adquirir algumas áreas na fronteira da Angónia, com aglomerados de nativos seus de certa grandeza, e em fazer correr inteiramente no seu território uma estrada também sua, de que alguns troços ficavam em terra portuguesa.

Da parte de Portugal interessava, além do objectivo principal, que era a demarcação das fronteiras lacustres, a incorporação no território de Moçambique de uma pequena zona da região de Mutarara onde se exercia a soberania portuguesa, mas estava para lá da fronteira definida pelo tratado de 1891.

Esses são os objectivos realizados pelo acordo de 18 de Novembro de 1954 no que respeita à demarcação de fronteiras.

Apreciado quanto u extensão dos territórios que, por seu efeito, mudam de soberania, o balanço do acordo é o seguinte: Portugal adquire uma área de 6400 km² no lago Niassa, mais 60 km² no lago Chiuta, mais 4,7 km9 na região de Mutarara. As permutas de terrenos na região da Angónia saldam-se por uma diferença de 30 km² a favor da Niassalândia. Por quanto fica exposto, a Câmara Corporativa entende que deve ser aprovado, para ratificação, o Acordo relativo u fronteira de Moçambique com a Niassalândia, assinado em Lisboa em 18 de Novembro de 1954.

Palácio de S. Bento, 4 de Fevereiro de 1955.

Albano Rodrigues de Oliveira.

António Trigo de Morais.

Francisco José Vieira Machado.

Francisco Monteiro Grilo.

Joaquim Moreira da Silva Cunha.

Vasco Lopes Alves.

Augusto de Castro.

Manuel António Fernandes, relator.