(...) valorização de um e outro na balança de pagamentos da comunidade portuguesa elaborou-se um mapa que nos dá, à primeira vista, o efeito dos maiores preços obtidos por estes produtos a partir de 1949 ou 1950:

(ver tabela na imagem)

Apenas se consideraram as mercadorias exportadas.

As sobrevalorizações ainda seriam maiores se se considerasse o café e a cortiça consumidos dentro dos territórios da comunidade. No caso do café apenas se levaram em conta as exportações de Angola.

Nota-se logo que, se não houvesse sobrevalorização nestes produtos nos cinco anos que decorreram desde 1949, seria negativo o saldo da balança de pagamentos neste período.

Considerando apenas os anos de 1950-1953, e calculando as sobrevalorizações em relação aos preços da tonelagem exportada em 1949, verifica-se que a soma dos saldos positivos da balança de pagamentos totalizou 5 105 000 contos e a das sobrevalorizações do café e da cortiça exportada atingiu 4 188 000 contos.

De modo que, sem contar com as sobrevalorizações de produtos, como o volfrâmio e outros, ocasionadas pelo conflito coreano, as daqueles dois são inteiramente responsáveis pêlos saldos da balança de pagamentos, se forem excluídas, no seu cômputo, as quantias provenientes do auxílio americano. O que acaba de se apontar revela o carácter aleatório da balança de pagamentos, que oscila ao sabor de factores de origem externa, comandados por circunstâncias a que somos alheios.

Mostra, portanto, a necessidade de melhorar os instrumentos de produção nacionais, como repetidas vezes tem sido apontado nos pareceres.

Se forem incluídas no mapa acima transcrito as tonelagens correspondentes a cada ano, verificar-se-á ligeira melhoria na exportação do café os números vêm de 44 000, 37 600, 47 600 t, respectivamente em 1949, 1950 e 1952, até 64 400 e 71 600 t, em 1951 e 1953 -, com pronunciada baixa em 1954, segundo as últimas estimativas.

No caso da cortiça, a baixa em toneladas exportadas foi acentuada: veio de 210 000 em 1950, para 158 500 em 1953, com valores intermédios de 232 000 e 149 000 toneladas em 1951 e 1952.

A delicadeza do problema da balança de pagamentos torna-se evidente ao notar que o café e a cortiça, em 1903, representaram 3 087 000 contos, ou 35,1 por cento das exportações totais da comunidade.

Uma baixa, ainda que pequena, nas cotações destes produtos poderá criar situação delicada à balança de pagamentos e às trocas internacionais. A economia da metrópole e do ultramar necessita pois de ser revigorizada. Ela repousa sobre a produção de poucos produtos para exportar e no carácter oscilatório dos seus preços, dependentes em parte de acontecimentos externos. As crises periódicas verificadas na balança de pagamentos seguem-se às vezes tempos de desafogo na entrada de divisas.

Em geral, os períodos de desafogo derivam da alta passageira de certos produtos, umas vezes por motivo de conflitos internacionais, outras vezes por força de contingências meteorológicas que destroem culturas noutras regiões, ou de altas inesperadas nos consumos, como no caso do café e da cortiça.

Todos estes factores têm influência considerável no nível de vida. Eles afectam a balança de pagamentos. Quase sempre, nas épocas de alta de preços, esquecem-se as crises da balança de pagamentos e os consumos supérfluos sobem a níveis incomportáveis pela produção.

As consequências dos rápidos períodos de euforia conduzem sempre a crises graves, como a de 1949, que até influenciou a própria vida financeira do Estado e só pôde ser debelada por se lhe ter seguido um período de alta nos preços. Há a tendência, logo que melhoram as condições da balança de pagamentos, para confundi-las com um real aumento dos rendimentos nacionais proveniente do progresso dos instrumentos da produção.

Salvo o devido respeito por esse modo de ver, que não assenta em realidades, o desenvolvimento da produção só pode derivar do acréscimo da produtividade ou do progresso dos próprios instrumentos da produção. Não é o acréscimo temporário nos preços, acréscimo artificial e aleatório, que conduz à estabilidade económica e social. Pode ate afectá-la, pêlos desenganos e ilusões que semeia.

Nos últimos anos a balança de pagamentos da comunidade portuguesa foi fortemente positiva porque houve na verdade um aumento anormal nos preços de certos produtos - volfrâmio e outros metais a princípio, café e cortiça e o utros depois.

Um simples cálculo mostra que se estes produtos mantivessem os níveis de preços normais, o de períodos anteriores a 1950, seria de muito menor projecção a influência da balança de pagamentos, e nalguns anos até se mostraria deficitária, apesar de auxílios financeiros de outra origem, patentes nos meios de financiamento.

Não devemos, pois, ter ilusões sobre esta matéria. O parecer das Contas não pretende ser nem optimista nem pessimista. Procura apenas apreciar a realidade dos fenómenos; que possam ter influência nas Contas Públicas, através do volume das receitas, e indicar os meios de vigorizar uma economia que baloiça delicadamente com acontecimentos internacionais, alheios a própria vontade interna. Há muitos anos se acentua neste lugar que o progresso económico nacional só pode ser obtido por melhorias acentuadas nos instrumentos da produção, que tendam a extrair maior rendimento do trabalho e dos recursos que felizmente existem dentro do País e são susceptíveis do poderem ser desenvolvidos para bem da comunidade nacional.