O Orador: - Mas o caso não se compadece com proibições temporárias e em troços limitados dos rios; exige medida mais radical, como dentro em pouco exporei.

E os perniciosos efeitos da pesca à rede são ainda muito agravados pelo pouco ou nenhum respeito que se tributa ao que no regulamento se prescreve quanto ao tamanho das malhas, ao comprimento das redes, ao espaço do rio que deve fitar livre e aos intervalos que entre umas e outras devem ser observados.

Além disso, e em muitos lugares, a pesca à rede é praticada quase sempre em trocos de rios cujo nível de água se fez artificialmente baixar.

É contra o regulamento, mas ninguém faz caso disso.

É sabido que, quando se permite a rede, a pesca se faz de qualquer forma, pois que o único fito a atingir é torná-la, de momento, o mais rendosa possível.

O uso imoderado, legal e ilegal, das redes é uma das causas que muito têm contribuído para o despovoamento dos nossos rios e lagoas.

E, se isto é assim em todos os cursos de água habitados por trutas das diferentes espécies, o caso assume proporções verdadeiramente trágicas no rio Minho, o único rio salmoneiro que possuímos.

Na sessão de 3 de Abril de 1951 o Sr. Deputado Ricardo Durão lançou na Assembleia Nacional o grito de alarme, denunciando a próxima extinção do salmão no rio Minho, se não se obviar a tempo a esta calamidade.

A sua voz clamou no deserto, e os factos posteriormente verificados confirmam infelizmente a razão que assistia a este nosso ilustro colega.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Na sessão de 23 de Março do ano passado o Sr. Deputado António Felgueiras, que a este assunto tem dedicado especial .interesse, mostrou, de forma impressionante, a necessidade de, sem perda de tempo, salvar o rio Minho e referiu que, se o Sr. Deputado Ricardo Durão ainda pôde indicar a centena como número aproximado dos salmões capturados nessa época, volvidos três anos esse número não deve ter excedido a dezena.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Não há dúvida de que no rio Minho está próxima e à vista de toda a gente a completa extinção dos salmões.

E, no entanto, este prodigioso curso de água poderia ter, segundo cálculos feitos pêlos entendidos na matéria, um coeficiente biológico de 60 000 a 90 000 salmões por ano.

As afamadíssimas trutas mariscas (salmo truta), de que o rio Minho já foi e poderia continuar a ser um formidável manancial, vão também a caminho do desaparecimento.

São causas desta catástrofe as artes de pesca que estupidamente se têm usado e continuam a usar até que a voz do bom senso determine que se faça alto nesta virtiginosa corrida para a perda do que poderia ser, e tenho esperança de que ainda venha a ser, um dos melhores nos salmoneiros do Mundo.

São as redes, que, lançadas de margem a margem, têm causado prejuízos enormes nos salmões, pelo facto de estes príncipes das águas não encontrarem espaço livre para subir, quando se encaminham para a desova.

São as r ilegalissimamente construídas de novo ou aumentadas ou aperfeiçoadas -. destroem quantidades enormes de alevins que descem o rio a caminho do mar.

São estas, assim sucintamente enumeradas, as principais causas do estado catastrófico a que chegou o belo e prodigioso rio Minho.

Tem sido também o inconcebível uso de redes na lagoa .Comprida, aliado às tais centenas de canas permanentemente armadas, que tem dizimado até à exaustão as apreciadíssimas trutas arco-íris, de que aquela lagoa já foi e ainda hoje poderia ser uni reservatório maravilhoso.

Mas há mais.

Estabelece o artigo 43.° do [Regulamento de 1893 que é defesa a pesca da truta no espaço de tempo que vai de 1 de Novembro a 15 de Fevereiro.

É um período demasiado curto, mas nem esse ao menos é respeitado.

Pesca-se desaforadamente durante o defeso, sem que o facto provoque escândalo nas autoridades a quem incumbe obrigar ao cumprimento da lei.

Durante a época de proibição da pesca servem-se trutas nos restaurantes caros de Lisboa e quando algum freguês, conhecedor da lei, faz a observação de que os peixes têm forçosamente de ser de conserva o criado, que não gosta de discussões, vai buscar a travessa cheia destes salmonídeos para objectivamente demonstrar que soo fresquíssimos e pescados pouco tempo antes.

Isto ninguém mo disse. Vi-o eu, e o Sr. Deputado Santos da Cunha também viu.

Tenho aqui o Diário de Lisboa de 28 de Janeiro deste ano, onde um restaurante da capital anuncia trutas e salmões.

Mas até em banquetes oficiais se têm servido trutas também em pleno período; de defeso, o que é de muitíssimo mau gosto, por todos os motivos e até porque estes peixes, pescados na época da desova, perdem muitos dos seus dons culinários por estarem doentes.

E liga-se tão pouca importância à proibição da pesca à truta na época do defeso que o próprio Secretariado Nacional da Informação, que, por dever de ofício, deve estar sempre bem informado, nesta bem apresentada publicação que V. Ex.ª aqui vêm, intitulada Pousadas do Secretariado Nacional da Informação, ao exaltar a região em que se encontra a Pousada de S. Gonçalo, no Marão, informa textualmente do seguinte:

Quanto à pesca, pode-se também, desde 1 de Novembro a 16 de Fevereiro, aos domingos (e nos outros dias com uma licença especial), descer às ribeiras do Raumalhoso e da Aboadela, molhando bragas na pesca de boa truta.

Ora o período de 1 de Novembro a 15 de Fevereiro é precisamente aquele em que é proibida a pesca da truta.