O Orador: - Atingindo muitas delas largas dezenas de escudos e até mesmo centenas, um simples cálculo demonstra, desde logo, a impossibilidade para os pequenos moinhos e azenhas, submetidos à falta de caudal-motor nas estiagens e u um largo cortejo de contrariedades provocadas pela crescente concorrência das moagens industrializadas, de farinarem a diversa o fantástica montanha de grão que seria necessária para que a sua tonelagem produzisse, com a aplicação das citadas taxas, o valor das avenças exigidas, como correspondentes a uma pretensa laborarão mensal.

Mas assim mesmo elas vão sendo lançadas, e se não forem voluntàriamente pagas serão cobradas coercivamente em processo de execução fiscal, por lhe terem feito a graça de lhes outorgar a força de títulos exequíveis.

Como geralmente se avolumam na mesma execução várias avenças que os pobres moleiros não puderam pagar, esta, com as muitas alcavalas, atinge um valor relativamente elevado, e então comera para os executados a mais negra das expectativas, pois, para conseguirem remir os seus bens - tantas vezes parcos e simples instrumentos de trabalho que a penhora atingiu - da iminente alienação, têm de socorrer-se da usura, sempre «generosa» nestes casos de aflição, ficando privados dos recursos de que careciam para a sua sustentação, mais o do seu agregado familiar, que passa então a sofrer verdadeiros estados de necessidade.

Entretanto, novas avenças aparecem para pagamento, que não pode ser efectuado, surgem novas execuções e, consumadas elas, aumenta o número daqueles que nada tem, por tudo terem perdido. E tudo isto, Sr. Presidente, para a manutenção dum organismo que, se alguma vez teve justificada a sua criação, nenhuma utilidade apresenta agora a que se possam debitar, dentro dos primados da doutrina, os altos custos dos sacrifícios impostos a uma larga, generalidade de pequenas economias, cujos direitos são absolutamente respeitáveis.

O Sr. Elísio Pimenta: - O organismo existe apenas para pagar aos seus funcionários. São eles próprios quem o reconhece nas circulares e documentos que publicam.

Estou especialmente autorizado a dizê-lo. Pedi, desta Câmara, informações, e elas conduzem expressamente a esta conclusão.

O Sr. Pereira de Melo: - Sempre é melhor do que abandoná-los às solicitações do crime . . .

O Orador: - Concordo, mas afirmo que não pertence aos pobres moleiros das aldeias tão pesada contribuição, como já aludi.

É, portanto, Sr. Presidente, em nome dos torturados titulares desses direitos, a quem um dia se resolveu enfaticamente outorgar a qualidade de «potentados industriais» - paradoxos eternos de quem não conhece ou facilmente esqueceu a peculiar forma de vida rural, não reparando, por isso. que se estava na presença de simples moleiros, e não de abastados moageiros -, para os tornar fontes permanentes das receitas de complicados organismos da urbe, que pretendo fazer ouvir a minha voz.

Como a dos ilustres Deputados que me antecederam, em apropriadas considerações sobre este importante problema, também ela pede e clama por justiça.

Para que elas sejam ouvidas, ouso pedir a V. Ex.ª. Sr. Presidente, tão inteiramente devotado às causas justas dos humildes, como ainda há pouco, em consagração magnífica, os melhores valores da Nação jubilosamcnte reconheceram, o amparo do seu alto valimento para que superiormente se decrete a neutralizarão imediata da acção tributadora da Comissão Reguladora das Moagens de Ramas e se abra um rigoroso inquérito às suas condições de vida.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Paulo Cancella de Abreu (para um requerimento): - Desejo apresentar o seguinte

Requerimento

«Requeiro que pela Polícia Internacional e de Defesa do Estado me sejam fornecidas urgentemente as seguintes informações:

1.º Número de estrangeiros que entraram no continente em cada um dos anos de 1950 a 1955, inclusive, pelas vias terrestre, marítima e aérea, não incluindo os que passaram em trânsito ;

2.º Número de automóveis ligeiros pertencentes a estrangeiros (indicando-se em separado os que trouxeram reboque ou roulottes de acampamento) e número de autocarros de passageiros que entraram no continente em cada um dos anos de 1950 a 1955, inclusive».

O Sr. Presidente : - Pela Presidência do Conselho foi enviado à Assembleia Nacional, para apreciação, o decreto sobre as actividades desportivas do ultramar, a qual vem já acompanhado do parecer da Câmara Corporativa. Vai ser remetido às Comissões de Educação Nacional e do Ultramar. Também está na Mesa. enviado pela Presidência do Conselho, o extracto do Acordo Cultural entre Portugal e o Reino da Bélgica. Vai ser enviado às Comissões de Negócios Estrangeiros e de Educação Nacional.

Pausa

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

O Sr. Presidente: - Continua o debate do aviso prévio do Sr. Deputado Nunes Mexia acerca das carnes.

Tem a palavra o Sr. Deputado Abrantes Tavares.

O Sr. Abrantes Tavares: - Sr. Presidente: como é a primeira vez que subo a esta tribuna sob a presidência de V. Ex.ª, quero aproveitar o ensejo para lhe apresentar os meus mais respeitosos cumprimentos.

Não venho fazer propriamente uma intervenção sobre o abastecimento de carnes, mas prestar um depoimento sobre um problema que me ocupou quando transitoriamente passei por um organismo que tinha de intervir no assunto.

E começarei por fazer uma pequena nota histórica.

O problema do abastecimento de carnes a Lisboa, que se renova periòdicamente, vem já de muito longe.

O nosso Gil Vicente, quo foi um cronista risonho dos problemas e das mazelas do seu tempo, já o referiu no Auto da Feira.

Mercúrio, ao explicar os signos do Zodíaco, dizia aos feirantes:

Quanto ao touro e ao carneiro

São tão maus de haver agora

Que quando os pêm no anadeiro

Diz o povo ao carniceiro : senhor!