Data de 1950 a última revisão geral dos direitos de importação. Nessa altura foi concedida à produção nacional protecção que, na generalidade dos casos, a colocou em fácil posição de suportar a concorrência externa. De então para cá houve períodos de certa perturbação do mercado internacional. Sobretudo as implicações económicas da guerra da Coreia -que falsearam temporariamente as condições de concorrência: a prática de duplos preços em período de escassez de materiais- foram certamente, e nesse momento, o factor mais importante das dificuldades sentidas em alguns sectores da nossa produção.

Se ainda não está sanada por completo, a situação do mercado tende decididamente para a normalização das condições de concorrência e de acesso às matérias-primas e produtos semiacabados. Só uma nova perturbação da política internacional poderá contrariar esta tendência, e não parece que devamos jogar nessa hipótese para nos furtarmos a encarar as consequências de um c lima de trabalho em condições de normalidade. E, por isso, chegado o momento de procurar saber em que medida a produção nacional aproveitou e aproveita o incentivo de aperfeiçoamento que lhe foi dado através de protecção pautal.

E podem reduzir-se a três os motivos que principalmente determinam a fiscalização a que se refere o artigo 9.º da proposta:

Defesa das receitas do Estado, ou seja a defesa do interesse geral;

Defesa do consumidor;

Defesa do próprio trabalho nacional.

Já no relatório da proposta de lei de autorização para 1956 se salientou a posição excepcional que às cobranças da alfândega cabe entre as fontes de receita do Estado.

E num momento em que se deseja e se precisa intensificar a acção em prol da melhoria geral das condições de vida, o problema do volume das receitas ordinárias assume importância capital. Que estas receitas tenham de ser aumentadas, sob pena de renúncia ao ritmo desejável de progresso, é verdade que não carece de demonstração. E, se são vários os sectores onde o Estado poderá actuar para arrecadar o que for necessário e legítimo, verdade é também que não deve, em nome do interesse geral, deixar de actuar. No seguimento desta orientação, escreveu-se no relatório do ano findo:

No que toca a defesa da produção, não deverá esquecer-se que os direitos de importação, sempre que visem proteger o trabalho nacional, por defi utal o fizera renunciar.

Este o primeiro dos motivos que impõem se averigúe como e por que forma a produção aproveita a protecção que lhe é concedida.

Mas, para além do nível das receitas do Estado e da sua repercussão no campo da cultura, da saúde, da justiça - numa palavra, na melhoria do bem-estar geral -, a protecção tem incidências directas e imediatas sobre o consumidor. E este aspecto do problema não pode descurar-se, quer o olhemos através de um prisma puramente económico, quer o apreciemos em função da justiça: ao consumidor, que, no geral, não beneficia directamente da protecção, só é legítimo exigir-se-lhe que compre mais caro, a qualidade pior, quando esse sacrifício se lhe imponha em nome do bem comum -que é também o seu-, e não para engrandecimento das margens beneficiárias dos utentes da protecção.

Quanto a este risco da protecção já o Presidente do Conselho, então Ministro das Finanças, em 9 de Março de 1939, exarava, em processo da Comissão Revisora de Pautas, despach o do qual aqui se arquivam as passagens seguintes:

... ser necessário que do processo fiquem a constar os preços e condições de venda que têm sido feitos pelos requerentes, para que a cada momento se possa verificar se a protecção começa a ser aproveitada, com os motivos ou pretextos do costume, para maior carestia do artigo. Nesse momento deverá voltar-se ao statu quo ...

a experiência demonstra que, em geral, as indústrias nacionais que pedem o reforço da protecção existente passam, apesar das promessas feitas com o pedido, a incorporar nos seus preços os novos direitos, com lesão dos interesses dos consumidores dos seus artigos, e nada conseguindo afinal senão transferir a luta de concorrência para nível mais alto de preços. Outras vezes, senhores do mercado pela protecção, descuram a qualidade dos produtos e fica o consumidor nacional ou mal servido, ou obrigado a comprar muito caro o produto estrangeiro ...

Mas o contrôle da utilização da protecção redundará afinal em benefício do próprio trabalho nacional: sempre que um alto nível de direitos se possa transformar em incentivo à ineficiência permanente ele será contrário aos interesses reais e a mais longo prazo do próprio trabalho protegido.

A concorrência é uma necessidade na medida em que for determinante de uma permanente melhoria de produtividade. Quando pela protecção -necessária, aliás, em virtude da dimensão do mercado e das características da produção- esse factor natural de progresso se anula, o Estado vê-se forçado à promulgação de medidas que, assegurando a protecção, simultaneamente garantam a maior produtividade.

Ao longo das notas sobre a economia internacional ressaltou nítida a tendência para o progressivo abaixamento dos direitos: a nossa produção tem de preparar-se activamente para esta nova fase da luta.

Parece assim não poder duvidar-se da oportunidade da medida proposta no artigo 9.º, tanto mais que ao mesmo tempo se concederão novos benefícios fiscais ao investimento e que está a chegar ao seu termo a reforma do crédito, reforma indiscutivelmente necessária ao esforço de readaptação e criação que se pede à produção nacional.