Projecto de proposta de lei n.º 519

A Câmara Corporativa, consultada, nos termos do artigo 105.º da Constituição, acerca do projecto da proposta de lei n.º 519, elaborado pelo Governo sobre a autorização das receitas e despesas para 1957, emite pela sua secção de Interesses de ordem administrativa (subsecções de Política e administração geral e de Finanças e economia geral), sob a presidência de S. Ex.ª o Presidente da Câmara, o seguinte parecer:

Apreciação na generalidade

Forma de apresentação da proposta de lei de receita e despesa A preponderância crescente do Executivo sobre o Legislativo constitui uma das tendências essenciais de direito financeiro dos nossos dias. Na sua génese encontramos as lições da grande depressão, de uma guerra total e o esforço gigantesco da reconstrução e reconversão. Através delas aprendemos que o mundo havia entrado bruscamente e quase sem transição na era do planismo e do dirigismo económico e social. A revolução técnica a que se assistiu, a crescente organização dos interesses particulares e o anseio de uma maior justiça por parte das massas tornaram a intervenção do Estado um fenómeno necessário, até porque se mostrava independente de toda a opção doutrinal e política.

Foi então que a ciência das finanças se viu colocada na necessidade de rever o seu tradicionalismo jurídico e a sua neutralidade económica. Sendo o orçamento um plano de conjunto em que todas as partes são solidárias, quer se trate de assegurar o equilíbrio financeiro, numa ou noutra das suas a cepções, quer de levar a cabo uma intervenção no domínio económico e social, as exigências técnicas levaram, quase por toda a parte, ainda que em medida variável, a eliminar a sanção legislativa de Câmaras que não derivam do sufrágio directo e a restringir ou a abolir o direito de iniciativa dos Parlamentos em matéria de despesas. Esta evolução acentuou-se e precipitou-se com a fecunda elaboração científica levada a cabo nas duas últimas décadas. Ela ajudou os governos a tomar consciência dos pontos de inserção da economia pública no conjunto da economia total e revelou que a sua actividade, quer quando realizam despesas, quer quando arrecadam receitas, não é economicamente neutral.

Esta influência não depende de quaisquer considerações doutrinais: é um facto. Que os governos e os indivíduos a aprovem ou não, nem por isso ela deixa de se verificar. O problema que se suscita é, pois, o de saber se o Governo, consciente desta influência, a vai utilizar no sentido requerido pelo interesse geral. Se o fizer, e outra hipótese não é de encarar, a elabo-