O Sr. Daniel Barbosa: - Pode ser linear e ser com curvas. V. Ex.ª, por exemplo, não está a chegar ao fim pelo caminho mais curto.

O Orador: - É a opinião de V. Ex.ª mas não a minha, e sou eu agora quem usa do direito de manifestar a sua opinião.

Logo as primeiras divergências que me saltaram à vista foram as verificadas em autênticas autoridades nacionais.

Em 1946 o Sr. Eng. Ferreira Dias publicou a Linha de Rumo - Notas da Economia Portuguesa, livro este que, sem sombra de adulação, pode e deve estar à cabeceira de todos os estudiosos portugueses.

E a pp. 133 e seguintes, acamaradando com o critério do nosso colega Deputado Daniel Barbosa, estabeleceu que «apreciação mais acertada do desafogo da vida em cada país se fará tomando para conversão dos salários, em vez do câmbio das moedas, a proporção em que essas moedas são capazes de adquirir os alimentos necessários para compor uma ementa-tipo». E, considerando também, precisamente, o caso frequente de uma família, composta por pai, mãe e dois filhos, afirmou que o sustento dessa família exigirá por dia, segundo a opinião dos fisiologistas, um total de 12 400 calorias, das quais 4500 calorias pertinentes ao pai.

Já vimos, e todos temos bem presente na memória, que, nas suas brilhantes alegações de há dias, o Sr. Deputado Daniel Barbosa assentava os seus cálculos na cobertura alimentar de cerca de 12 800 calorias diárias - ou seja mais 400 calorias que as fixadas como indispensáveis nos cálculos do Sr. Eng. Ferreira Dias; e também nenhum de nós esqueceu que o Sr. Eng. Daniel Barbosa partia, assim, nas suas estimativas, «duma média da ordem das 3000 calorias diárias por indivíduo», ou seja menos 1.500 calorias, também diárias e por indivíduo, cimentadas nos alicerces dos cálculos do Sr. Eng. Ferreira Dias.

Ninguém me Levará, decerto, a mal que confesse a impressão de incerteza que tolhi logo ao primeiro tropeçar com este desacordo de autoridades igualmente estimáveis.

O Sr. Daniel Barbosa: - V. Ex.ª não pode comparar, como pretende, dado que as bases de partida são diferentes.

O Orador: - E essa incerteza agrava-se quando, em nota ao primeiro passo transcrito de p. 1133 da Linha de Rumo, vi indicada como fonte de informação do Sr. Eng. Ferreira Dias precisamente a autoridade do Sr. Eng. Daniel Maria Vieira Barbosa - «Bases para o estabelecimento dos salários industriais em Portugal», II Congresso da União Nacional, Lisboa, 1944.

O Sr. Daniel Barbosa: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faz obséquio.

O Sr. Daniel Barbosa: - Tenho imensa pena de estar a interromper V. Ex.ª ...

O Orador: - Não tenha. Estou encantado!

O Sr. Daniel Barbosa: - Muito obrigado.

É que V. Ex.ª está a laborar numa confusão tremenda. V. Ex.ª está a agarrar-se a um número rígido, e isso não pode ser...

O Orador: - Não estou. Não fui eu que me agarrei a um número rígido. Foi V. Ex.ª que o estabeleceu como base.

O Sr. Daniel Barbosa: -Então só tenho de constatar que ou V. Ex.ª não leu bem ou não me compreendeu.

O Orador: - Li. E suponho que foi o que todos nós percebemos...

O Sr. Carlos Moreira: - Parece que isso é afirmar muito. Eu, pelo menos, não passei a V. Ex.ª declaração, nem expressa nem tácita, que lhe permitisse afirmar que todos nós tínhamos compreendido assim.

O Orador: - Registo.

O Sr. Daniel Barbosa: - Só queria dizer o seguinte: citei um número de quatro ou cinco pessoas, mas tive a cautela de acentuar que o número encontrado era susceptível de variação, para mais ou para menos, agravando ou beneficiando o orçamento familiar conforme aumentava ou diminuía o número de adultos ou de crianças...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Parece-me que V. Ex.ª está a derivar. V. Ex.ª citou um mínimo mensal indispensável para que determinado agregado familiar viva.

O Sr. Daniel Barbosa: - Não estou, não senhor. V. Ex.ª é que parece não ter entendido bem o que eu disse.

O Orador: - Entendi, sim senhor.

O Sr. Daniel Barbosa: - Então terei de concluir que V. Ex.ª não sabe o que é uma média!

O Orador: - Talvez! Mas continuando: V. Ex.ª não afirmou médias mensais indispensáveis; garantiu um mínimo mensal certo...

O Sr. Daniel Barbosa: - ... que se desligou dessas médias, aliás.

O Orador: - Se V. Ex.ª me dá licença, prossigo.

A nota vem, repete-se, no final da p. 133 da Linha de Rumo, por sinal aditada da explicação de que «são tirados deste trabalho alguns dos números que seguem».

Donde resulta que em 1946 o Sr. Eng. Ferreira Dias, por si ou fazendo compartilhar das responsabilidades do facto o Sr. Eng. Daniel Barbosa, exigia como mínimo diário, quer para o agrupamento familiar, quer para o respectivo chefe, um número de calorias sensivelmente diverso do preferido pelo Sr. Deputado Daniel Barbosa nas suas alegações.

Vai daí, tais divergências avolumaram-me a desconfiança e a incerteza nas bases sugeridas como razoáveis. E deliberei atravessar as fronteiras, promover que nos autores e organismos estrangeiros mais cotados se perscrutasse o que existia de uniforme ou concorde em matéria, de mínimo de calorias diárias exigidas para um agrupamento familiar ou por cada indivíduo.

E das remotas e nevoentas invocações da história bíblica surgiu-me uma bem desenhada «torre de Babel».

Na Higiene Rural está entendido como óptimo social por Marañon e Richet como número de calorias por indivíduo: