quando o centeio e o mel recuavam; limito-me a enumerá-los: massas alimentícias, bolachas, conservas de peixe, carnes frigorificadas, sumos, frutas em calda, produtos exóticos, salsicharia industrial, que alargam ou tornam mais variada a dieta de muitos e que são muitas vezes consumidos fora de casa.

Em 1935 o malogrado professor do Instituto Superior de Agronomia Lima Bastos publicou um interessante estudo sobre «Níveis de vida e custo da vida».

Era um trabalho cauteloso, medido, revelante, baseado em cinco pequenas monografias criteriosas e detalhadas sobre a vida de cinco trabalhadores rurais.

O nível de vida destes homens era francamente baixo e traduzia-se numa alimentação deficiente e numa habitação sem conforto. Registava-se que viviam em piores condições do que os trabalhadores dos países europeus, embora os produtos alimentares em Portugal se obtivessem mais baratos.

A natureza dos inquéritos e a experiência destes dados supunha levar mais longe a indagação: separar o trabalhador do campo do operário citadino; discriminar os que dispunham duma ocupação permanente daqueles que só trabalhavam uma parte do ano.

A alimentação reconhecia-se escassa em gordura, desprovida de elementos minerais, como cálcio e fósforo, e de proteínas animais.

Mas era preciso estudar ainda. Ver como a mortalidade traduzia carência. Examinar o subemprego estacionai. Aprofundar por igual o exame dos orçamentos familiares.

Este estudo foi apropriado e debatido nas discussões eleitorais como tema irresistível de propaganda, nesse capítulo da história já distanciado.

A nossa moeda valorizava-se. A crise financeira havia sido vencida. Como resultados dela surgia o crédito, capaz de desenvolver e restaurar certos sectores. O desemprego maciço dominante limitara-se mais do que em qualquer outro país europeu. A produção agrícola subia. A moeda fortalecia-se. Mas pela conjuntura mundial surgiam novos problemas de desemprego e rurais.

Todavia, para algumas pessoas, tomadas de exaltação política e perdendo o sentido das proporções, as nossas massas rurais e fabris patinhavam na miséria, e isso se devia, diziam, à liquidez da Tesouraria. O Estado enriquecera e a Nação empobrecia.

Lembro-me de que nessa altura alguns países começaram a tributar directamente os salários.

Não se via que, se havia deficiências, falta de proteínas, avitaminoses, carências de conforto, elas vinham dum passado que não podia ser de dois ou três anos. Vinham de longe, vinham do «deixar fazer» e do «deixar correr», vinham da desordem social, política e financeira, que inutilizava, não só os esforços, mas os melhores intentos.

Assim, os estudos e inquéritos que fotografavam hábitos, modos de vida e padrões sociais tradicionais do povo português converteram-se numa arma na mão de certos políticos, mas uma arma de dois gumes.

Era nessa altura (1935) o regresso à tese do Dr. Brito Camacho, na sua conferência de 15 de Jane iro de 1909, na Associação Comercial de Lojistas de Lisboa -«Miséria económica e ruína financeira»-, da qual se poderia tirar a ilação de que só um movimento sedicioso arcaria com enfrentar o problema.

O que foi feito daí em diante em matéria de fiscalizações e abastecimento, de melhor distribuição é conhecido, e os inquéritos citados traduzem já melhoria.

Sr. Presidente: é demasiadamente conhecida a organização, alcance e defeitos da estatística, particularmente da alimentar, para insistir sobre estes aspectos.

Elas precisam de ser confrontadas com os inquéritos que as completam e até relidas, para nelas se encontrar novos significados.

Tive na minha frente, ao preparar-me para comentar as teses deste aviso prévio, vários inquéritos alimentares às famílias rurais e fábricas do Douro Litoral, Entre Douro e Minho, Ribatejo, distrito de Vila Real e arredores de Lisboa.

Muitas vezes as calorias são número satisfatório, faltam prótidos de origem animal, há deficiência de sais de cálcio e vitamina B 2, nota-se certo equilíbrio de princípios energéticos. O vinho fornece calorias, o pão, a broa e o centeio dão uma base defensável. Mas a composição das dietas de gosto e tradições, como já disse, dos consumidores não é, não pode ser, a que os nutricionistas sonharam. Adiante veremos com mais detalhe as fraquezas das nossas propensões e abastecimento.

Antes de mais, isto mostra uma certa viragem na maneira de compreender estes factos, de que vou dar um apontamento, por ter interesse político.

(Nesta altura assumiu a presidência o Ex.mo Sr. Deputado Augusto Cancella de Abreu).

Retomo a leitura das estatísticas internacionais, porque elas contém ainda aspectos de aproveitar.

Passo agora a referir-me aos níveis de consumo dos principais víveres, segundo o relatório da O. E. C. E. - 1956 (estudo da dinâmica).