Decorridos quase vinte e quatro anos de experiência de Casas do Povo e vinte de Casas dos Pescadores, já não será difícil colherem-se elementos úteis a uma evolução jurídica ajustada aos factos.

Para as Casas dos Pescadores, em número actual de vinte e sete, abrangendo já praticamente todo o território marítimo do continente e ilhas adjacentes, em que a sua Junta Central 1 «representa a federação de todas elas», não se levanta o problema como para as Casas do Povo. Não invalida, evidentemente, que se encare q agrupamento das Casas dos Pescadores em federações.

As Casas do Povo estão a ser orientadas e coordenadas pelo Ministério das Corporações e Previdência Social, principalmente por intermédio dos delegados distritais do Instituto Nacional do Trabalho e Previdência, em estreita colaboração com a Junta Central das Casas do Povo.

Ao apostolado daqueles delegados é devida uma grande parte dessa obra imensa que é já hoje a das Casas do Povo. Foram os pioneiros da preparação do clima político-social e doutrinário, indispensável à formação do espírito, que imprimiu alma à sua criação e que ainda perdura. Os dirigentes, formados, sobretudo, pelo contacto pessoal, parece terem ficado inoculados de mística corporativa para todo o sempre, pois que ainda hoje, decorridos tantos anos, são os melhores paladinos e os mais activos obreiros do ideal corporativo nos meios rurais.

Uns e outros encarnaram o que se contém no discurso proferido pelo Sr. Presidente do Conselho aos delegados do Instituto Nacional do Trabalho e Previdência no momento da partida para a arrancada corporativa no País, que lhes disse:

Têm sobre si unia tríplice função: função de propaganda, função de patronato e função de organização.

Propaganda. - Propaganda intensa, constante, dos factos e das ideias, da doutrina que está feita e da doutrina a criar.

Patronato. -... Fazer justiça a todos e proteger os mais fracos tem de ser o lema do vosso trabalho.

Organização. - Estamos em país em que é preciso organizar de alto a baixo, porque, o pouco que parece não o estar, está tão desorganizado como o resto.

Improvisar quadros, estatutos, sindicatos, corporações não nos interessa; levar os interessados a assimilar os princípios, a ver o interesse da organização, a desejar servir-se dela para elevar o nível económico, intelectual e moral dos seus pares, isso é o que para o futuro da obra. principalmente nos convém. Caminhamos com fé, melhor, caminhamos sem receio neste fortalecimento dos indivíduos pela vida intensa dos seus grupos naturais 2.

E ainda recentemente o Sr. Dr. Veiga de Macedo, antigo delegado e actual Ministro, lhes indicava:

Nesta tarefa de reconquista e de renovação cabe aos delegados do Instituto um lugar de principal relevo, como homens que são da primeira linha de combate. Cumpre-lhes reavivar o entusiasmo perdido, encorajar os mais fracos de vontade, esclarecer os que andam longe da verdade, defender o prestígio da organização corporativa e lutar contra, os inimigos do equilíbrio social e do entendimento na paz e na justiça, entre o capital e o trabalho 1.

A Junta Central, criada doze anos mais tarde (Decreto-Lei n.º 34373, de 10 de Janeiro de 1945), tem, desenvolvido acção profícua na administração do Fundo Comum e na orientação dispensada às Casais do Povo.

O movimento de subsídios concedidos por aquela Junta, por força do Fundo Comum das Casas do Povo, desde 1943 a 1955, inclusive, foi o seguinte:

A Junta, por falta de recursos e meios de acção não se tem desempenhado plenamente da sua missão. É um microrganismo central bastante desproporcionado à grandeza das funções que lhe cabem e à vasta, rede de Casas do Povo em actividade, espalhadas por todos os distritos do continente e ilhas. Poderá ajudar a encaminhar os primeiros passos das federações, e com aquelas em melhor funcionamento estarão, ma is facilitados os contactos necessários e encurtadas as distâncias grandemente.

Numa fase de emancipação corporativa, como a que estamos a viver, não se justifica que as Casas do Povo sejam coordenadas e orientadas directamente pelo Estado e muito menos é admissível que fosse este a presidir à escolha idos seus representantes à Corporação da Lavoura. Por conseguinte, impõe-se a criação dos organismos próprios que de tal se desempenhem e impulsionem as Casas do Povo.

É uma lacuna a preencher no domínio do direito e pode ser uma forte esperança propulsora de largas, perspectivas nos factos.

Pretende-se «ampliar aos trabalhadores do campo os benefícios corporativos, a que causas económicas ou psicológicas ainda não permitiram, para eles, plena triunfo».

Assim, a proposta de lei em exame não só é de flagrante oportunidade como necessária ao reacender da. cruzada corporativa nos meios rurais. Preconiza a proposta de lei o agrupamento das Casas do Povo em federações.

Para melhor apreciarmos o todo - federação -, analisemos, ainda que de relance, as partes - Casas do Povo. Pelo Estatuto do Trabalho Nacional não podemos afirmar que as Casas do Povo sejam elementos, primários da organização corporativa, porque só o diz;

1 Teixeira Ribeiro, Princípios e Fins do sistema Corporativo Português, Coimbra, 1939, p. 55.

2 Oliveira Salazar, «Os delegados do I. N. T. P. e a Reforma Social», discurso proferido no gabinete do Ministro das Finanças, em 20 de Dezembro de 1933, aos delegados do I. N. T. P., que partiam a ocupar os seus postos (in Discursos, vol. I, 3.ª edição, Coimbra, 1939, p. 276).

1 Discurso proferido, em 26 de Julho de 1955, no acto de posse do delegado do I. N. T. P. na Covilhã (in Boletim ao I. N. T. P., ano XXII, n.º 14, p. 312).