Adultos números reais decisivamente optimistas, a verdade é que os 27 000 emigrantes praticamente alfabetos contribuíram, pelo menos, para a manutenção de uma taxa que qualifica de vergonhosa se a maior vergonha da verdade, como dizia Lope da Vega, não fosse o estar oculta.

Mas não são estes os únicos sintomas alarmantes carreados pelo fenómeno migratório português.

Um tema como este que estou a versar não me permite fugir ao lugar-comum de que Portugal foi, é e certamente continuará a ser um país agrícola.

Facto por todo reconhecido, por todos afirmado; mas o Estado, tão fértil em mutações e tão pronto a desfazer hoje o que decretou ontem (embora há cerca de trinta anos vivamos em maior coerência administrativa), parece manter há pelo menos, um século a invariável linha de conduta de não acreditar no referido lugar-comum.

E, se muito realizou neste último quarto de século, a verdade é que a renovação e o incremento da agricultura (que ocupa cerca de 40 por cento da população) ficam a (perder de vista quando comparados com outros aspectos da obra levada a cabo sob n égide de Salazar.

Começo a convencer-me de que se trata de uma fatalidade histórica: antes nos apelidássemos de país essencialmente industrial - talvez a lavoura conseguisse os benefícios e atenção a que tem. iniludível direito.

O desabafo poderá parecer inconciliável com a ordem do dia - e dele me penitencio ante V. Ex.ª, Sr. Presidente -, mas a verdade é que à questão agrícola, mais certamente à crise da agricultura, encontra-se indissoluvelmente ligado o fenómeno migratório.

Por outro lado, tem-se afirmado que sofremos de excesso demográfico, mas desta conclusão, generalizada, aliás, desde longa data, me permito discordar, embora a admita para as ilhas adjacentes. Com efeito, no continente, do Minho ao Algarve, pode haver uma má distribuição demográfica, mas não há um efectivo excesso populacional: o que nós encontramos é um aflitivo excesso de dificuldades.

Está, de resto, ultrapassada a teoria que justificava a emigração pelos excedentes demográficos, e no mundo de hoje bem se pode verificar que não são os países de maior densidade populacional os que mais contribuem para a conjuntura migratória.

Pode a densidade avolumar o movimento emigratório, mas nunca aparece como causa principal do fenómeno. O que se verifica é que há emigração onde há desencontro entre a evolução da população e o progresso económico. Ora o caso português enquadra-se na- regra, mas tem uma fisionomia sui geniris, porque às dificuldades de vida entre nós existentes acresce, para animar o movimento emigratório, a nossa tradicional vocação de caminheiros e peregrinos através, do Mundo.

Efectivamente, se compararmos a densidade populacional da Bélgica e da Suíça (640 e 772, respectivamente) com a nossa (que era, em relação ao último censo, de 88,8 para o continente), teremos de concluir que o número não representa um excesso de pop respeita ao abandono a que pretendiam reduzir o ultramar, aparecem agora bem vivas e bem justas, clamando por uma melhor distribuição demográfica aquém fronteiras e uma consequente reforma agrária, que haveria de evitar a demasiada divisão de propriedade no Norte e o regime de latifúndio em que ainda hoje. Se vive no Alentejo.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Parece então que seria mais aceitável que o Governo, ao passo que concretiza planos grandiosos de industrialização pesada, a que da o seu aval e em que o País investirá cerca de 2,5 milhões de contos, cuidasse de melhor distribuir a gente pela terra portuguesa, ...

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador:-... fertilizando designadamente o Alentejo, de modo que, em vez da reduzidíssima densidade populacional que lá se verifica, acolhesse um mínimo de braços aceitável, em aceitável nível de vida.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Fertilizado e colonizado o Alentejo, conseguiríamos alcançar rapidamente a escala dos 12-15 milhões de habitantes e poderíamos então contemplar sem receio o progresso das outras nações. É que ao valor e a importância dos povos não se medem pela área: medem-se pela densidade da sua população e pelo desenvolvimento e distribuição da sua riqueza».

Fomentemos e investamos, sim, mas que se fomente ao sabor das realidades; que se invista de acordo com u viabilidade económica dos empreendimentos, sem esquecer a pobreza e a pequenez do nosso meio, sem atropelar a ordem lógica e cronológica das realizações.

Bem me parece, assim, que o país real não entenderá a existência de poderosas unidades industriais, concentradas nas mãos de poucos indivíduos, a laborarem em regime de privilégio pautal e à sombra de proteccionismos por vexes exagerados, enquanto os trabalhadores rurais do Minho, de Trás-os-Montes, das Beiras continuarem a receber em média 17$ diários, de sol a sol, sem qualquer luz que lhes ilumine o futuro.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Claro que é investindo e produzindo que se conseguirá elevar o nível de vida e trazer ao convívio da civilização e da cultura aqueles milhões de portugueses que vivem da terra.

Mas é necessário não esquecer, repito, que somos e seremos sempre um país agrícola; desprezar a problemática da terra, sonhando com a industrialização do País, é equacionar uuilateralmente a conjuntura.

Recordemos, Sr. Presidente, que trinta anos após o início de uma obra política a todos os títulos notável, e não obstante o espantoso ressurgimento nacional já conseguido, ainda hoje vivem no continente famílias cujos réditos não atingem os 600$ mensais, cruel sin-