E o autor francês reportando-se ao seu pais, continua:

O pouco gosto dos Franceses pura a construção e a aversão pelo grande é o fenómeno bastante recente. A Idade Média não teve medo de construir as catedrais. O século XVII concebeu Versalhes e o século XVIII a praça da Concórdia. Em 1889 Eiffel, já sem dúvida atrasado, construiu o monumento mais alto do Mundo. Pouco faltou, porém, para que esta manifestação de vitalidade não fosse anulada pelo maltusianismo. Em 1952, o projecto Zehrfuss para a U.N.E.S.C.O. levantou tempestades cuja explicação reside antes de tudo no medo doentio pelo grande e pelo novo...

Veio a pequena família, defendeu-se a pequena semana de trabalho e os próprios diários passaram a chamar-se Petit Journal, Petit Parisien ...

Daí talvez o pendor, julgamos nós, para certos sectores da imprensa gaulesa, ao referirem-se ao nosso país, dizerem le Petit Portugal ...

Este estado de espírito revela-se ainda na incapacidade para criar palavras novas, ou até numa renúncia a adoptar termos procedentes de outros idiomas.

Tal esterilidade - anota ainda o director do Instituto Nacional de Estudos Demográficos de França - não se manifesta nos países- em progresso demográfico ou de população jovem.

Exemplifique-se com o Brasil e a língua portuguesa, onde se verifica, tal como em França, a introdução de termos ingleses, em boa parte provenientes do desporto:

(Ver tabela na imagem)

Estas palavras, utilizadas em França, não se pronunciam nem à francesa, nem à inglesa, mas em termos de compromisso arbitrário.

A diferença do poder assimilador prolonga-se nas palavras derivadas: o português diz chutar; o francês, shooteer, híbrido monstruoso. O português emprega liderança, liderar, etc.

Também há, com certeza, no Brasil e em Portugal puristas que lutam contra a assimilação das palavras estrangeiras, mas os seus esforços são vãos. Em Franca, porém, esses esforços conservadores têm êxito, dado que a maioria da população perdeu o espírito criador.

Não vem para aqui discutir a possível veracidade dos juízos de Sauvy sobre a doce terra de França. Tal atitude, além de despropositada, seria, da nossa parte, deselegante. As citações que fizemos apenas nos interessam em dois aspectos: na generalidade, como quadro de pensamento; nos domínios do concreto, enquanto respeitam ao nosso país.

Tudo isto vem, de resto, para pôr à consideração de V. Ex.ª a seguinte questão:

Teremos nós, Portugueses, perdido o espírito criador?

No final do século XIX lia-se num compêndio de geografia para as escolas da índia Inglesa, livro que, Tomás Ribeiro, contava, já em 1870, vinte seis edições:

Portugal está hoje abaixo das mais abjectas unções da Europa, tanto em civilização como em moralidade. Os Portugueses são nojentos, assim nas suas pessoas, como nas suas habitações. Existe entre os Espanhóis e os seus vizinhos Portugueses uma antipatia invencível, mas uns e outros são dados ao assassínio e as touradas são o seu divertimento favorito. Ajuntai aos vícios do espanhol a hipocrisia, e tereis um português.

Perdoe-se-me, Sr. Presidente, o sacrilégio que resulta da leitura deste passo ignóbil em local tão venerando. Por unanimidade repelimos juízo tão miseravelmente malévolo. Mas ele, na sua segunda intenção, será um estímulo para avaliai-mos das nossas potencialidades.

António Sardinha, num ensaio intitulado «A agonia de Agatão Tinoco» (In A Lareira de Castela), escrito em 1919, refere o episódio relatado por Ganivet (no seu ídearíum Espanol) sobre o drama do hospitalizado de Antuérpia, no qual reconhece «que toma expressão e vigor patético todo o drama, não só do nosso emigrante, mas das pequenas pátrias portuguesas que lá longe vegetam, anónimas e laboriosas, no desapego completo da metrópole ». E, vendo na agonia do mísero Agatão a imagem dolorosa de Portugal despedaçado e humilhado, termina por afirmar que saúda o porvir glorioso de um Portugal maior, adivinhando-lhe a realização plena. E a rematar, escreve: «No entanto, meu pobre Agatão Tinoco, quando acabará a tua agonia?».

Ora as obras falam por nós. E nem as lamúrias, já que invocamos autores espanhóis da geração de 98, dum Pio Baroja sobre o nosso destino tragicamente aprazado, nem o sentido suicida de que falava o original Una-muno se consumaram. Portugal renasceu e será, porque nós assim o queremos, «uma grande e próspera nação».

Esta certeza não nos dispensa, contudo, de aceitar as correcções que as realidades presentes comportam, até poro que sejam mais radiosas os perspectivas do futuro.

Comecemos pelos indicadores demográficos:

São escassos, até ao último quartel do século passado, os elementos sobre a evolução da população portuguesa. Ná verdade, embora contemos no activo das nossas glórias o primeiro recenseamento moderno da população, ou seja o numeramento mandado realizar por D. João III, em 1527, só a partir de 1890 se começaram a, efectivar em Portugal os recenseamentos decenais da população.

Da análise dos fontes disponíveis é possível, contud o, concluir: Até ao século XIX o crescimento da população portuguesa foi lento;

b) As guerras de reconquista, as pestes, as várias fases da expansão ultramarina e o domínio castelhano operaram como factores destrutivos.

A Índia, por exemplo, absorvia por ano 8000 almas. No reinado dos Filipes a organização defeituosa da propriedade e os encargos tributários originaram uma emigração intensa para Espanha. Conta Severim de Faria que a quarta parte da população de Sevilha era portuguesa, predominando aí, bem como em Madrid, a nossa língua.

Partindo do recenseamento de 1636 de que Balbi nos dá conta, podemos considerar os números que seguem na evolução da população portuguesa.