O Orador: - Tem-se visto com tanta clareza e afirmado com tanta insistência que o problema português é essencialmente um problema educativo que não consigo compreender que estranha força nos retém e não deixa passar das declarações, que nos obrigam, às realizações, que efectivamente resolvem e perduram.

O segundo aspecto a que prometi referir-me ó o das condições humanas do trabalho e o das consequências sociais que não deixarão de advir dos factos da deslocação de uma parte da população, que ato agora se ocupara nos campas, para as actividades industriais e do próprio aumento do rendimento nacional.

Não se trata manifestamente de criticar o II Plano de Fomento, mas de chamar a atenção para as concomitâncias do sector económico com o conjunto mais vasto da vida portuguesa e para as medidas que, a meu ver, a sua execução aconselha se tomem nos sectores limítrofes.

a) A primeira nota a fazer a tal respeito é a que se refere às relações humanas da produtividade.

Os valores espirituais do homem são hoje reconhecidos como um factor decisivo até sob o puniu de vista estritamente económico. No homem que trabalha há o braço, mas há também o espírito; e é a actividade do espírito, mais que a força do braço, que determina o rendimento do trabalho. Esta doutrina, a que os homens da economia se mostraram surdos até nào há muito, constitui hoje uma das preocupações fundamentais dos técnicos da produtividade e tem sido objecto de estudos aprofundados, de investigações de carácter rigorosamente científico e de reuniões internacionais.

O que se procura conseguir é que o trabalhador se sinta ligado ao conjunto da empresa por vínculos conscientes de dedicação, que se estabeleça uma compreensão mútua e um clima de dignidade nas relações com o patronato e que a empresa, mais do que uma simples unidade económica, seja uma comunidade moral, na qual os homens se sintam integrados, numa integração tão natural e humana como a que os prende à família ou à Nação.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Esse enquadramento revela-se a melhor via para restituir ao trabalhador a plenitude das suas forças espirituais; trata-se, em resumo, de interiorizar nas almas uma nova estrutura ...

Vozes: - Muito bem, muito bem!

nacionais; o contacto directo e assíduo entre o patronato e o pessoal trabalhador dentro da empresa, de modo a conseguir que seja no seu âmbito, e não no das classes, que todos os problemas se discutam e resolvam; a valorização cultural geral do trabalhador, e especialmente a valorização profissional específica, e a aquisição de graus de habilitarão unicamente válidos na empresa que os concede, mas dando direito ao acesso e à promoção dentro dos seus quadros; a constituição de grupos de trabalho tendo em atenção a personalidade dos componentes; o estudo analítico das tarefas individuais feito em ordem ao interesse e à adesão psicológica; a protecção à família e a atracção dela ao maior número possível de actividades da empresa; a habitação concedida como complemento do salário; e até a localização e o estudo da dimensão, feito com obediência, nào unicamente a considerações de ordem económica, mas também de ordem humana.

Tais medidas, fomentando a adesão total do homem ao trabalho, põem ao serviço não só os corpos, mas também as almas: sobre o valor do rendimento por hora diminui a frequência dos acidentes pessoais e o desgaste do material, eliminando-se estados de conflito. Mas, para além dessa utilidade económica directa, há o enriquecimento espiritual do homem e a sua promoção a uma vida de maior dignidade.

Quando a Nação se propõe investir recursos tão consideráveis no desenvolvimento industrial penso que não podem deixar de ser postos os problemas dos factores humanos do trabalho e do examinar se a estrutura actual da organização corporativa é a mais própria para conseguir a sua plena resolução.

A questão que deixo enunciada é da maior importância; e confesso que ainda não encontrei razões que me dissuadissem da opinião que tenho de que a recusa em aceitar a unidade da empresa e a manutenção de duas ordens distintas na organização do patronato e do pessoal trabalhador são dificilmente compatíveis com a conquista daqu eles fins superiores de humanismo cristão a que há pouco aludia.

O Sr. Cid Proença: - V. Exa. dá-me licença?

O Orador : - Com muito prazer.

O Sr. Cid Proença: - Tenho estado a ouvir com muito interesse as considerações de V. Exa., mas tenho uma dúvida. Como é que resolve o problema da protecção efectiva do trabalhador com uni sindicato único, mantendo a estrutura actual da empresa? Eu adiro às considerações que V. Exa. está produzindo, mas supondo uma reforma da estrutura da empresa, pois com a actual estrutura o sindicato misto significaria a não existência de qualquer organismo representativo dos interesses do trabalhador.

O Orador: - Só posso responder à dúvida de V. Exa. com uma surpresa: a que me causa o aprender que a eficiência da intervenção estadual na organização de todos os sectores interessados na produção é tão débil que num momento tão sério como este, em que parece estar a surgir uma pátria nova, consideremos um embaraço irremovível essa necessidade de dar à empresa uma estrutura, mais de acordo com a sua função humana.

O Sr. Cid Proença: - Mas com o pressuposto da reforma da empresa estou de acordo com V. Exa. ...

O Sr. Carlos Moreira: - Parece-me, afinal, que estamos todos de acordo.

O Sr. Camilo de Mendonça : - Suponho que a verdade é que, embora a reforma de estrutura esteja im-