Foi ultimamente criado o Liceu Normal do Porto, onde pedagogicamente, após as suas licenciaturas, se completa a formação do professorado para o ensino secundário. Nu ano corrente só a secção de Ciências se encontra em exercício, confiando-se na acção governativa para no futuro período escolar ser criada a secção de Letras. A manter-se o estado actual respeitante à obrigatoriedade de possuírem as cadeiras de Ciências Pedagógicas terão os candidatos ao magistério liceal de, como voluntários, prestar provas dessas cadeiras em Coimbra ou em Lisboa.

Há quem afirme serem em número basta até para o nosso país as Faculdades de Letras existentes, apenas duas. Esta afirmação julgamo-la inteiramente destituída de base séria, e tudo quanto se fizer para elevar o nível intelectual das gerações presentes e futuras, criando novas escolas, será de resultados magníficos para a sociedade, que anseia que benefícios desta grandeza lhe sejam dados.

Não podemos nem devemos continuar sen do um povo insuficientemente desenvolvido no campo do pensamento, das ideias, e no campo das artes. À ignorância ou a incultura não engrandecem o património espiritual das nações, mas inferiorizam-no em todos os campos da actividade humana.

Está plenamente demonstrado possuirmos capacidade mais que suficiente para mantermos proveitosa e dignamente o ensino das matérias de que nos estamos ocupando.. Exige-o o nosso crescimento populacional e aconselha-o o confronto com países onde o número dos seus habitantes é equivalente ao nosso, como sejam a Bélgica e a Holanda. E já não queremos falar dos países latinos da Europa, e alguns da América, que colocam o estudo das humanidades em primeiro plano.

Assim colocada a questão, podemos verificar, e fazemo-lo com certo desgosto, quão diferente é da nossa a atenção, o interesse e o cuidado que aqueles países dedicam à sua cultura humanística e filosófica.

O número das Faculdades de Letras existentes na Bélgica e na Holanda, com. população em número aproximado do da nossa, claramente nos fornece preciosa e necessária indicação. Assim, a Bélgica, país que ocupa no mundo lugar de extraordinário relevo, possui seis Faculdades de Letras e de Filosofia, que passo a enumerar:

O Sr. Lopes de Almeida: - V. Ex.ª pode dizer-me dessas Faculdades quais são as estaduais e quais as de fundação particular?

O Orador: - Lamento não poder dar a V. Ex.ª essa informação.

O Sr. Lopes de Almeida: - Era um problema fundamental para esse trabalho comparativo que V. Ex.ª acaba de desenvolver.

O Orador: - Parece-me que a comparação não está mal feita, sejam as Faculdades particulares, sejam oficiais.

O Sr. Lopes de Almeida: - No nosso país, o problema não é o da existência ou não existência de alunos. E que deve dizer-se com toda a clareza: existindo as Faculdades, actualmente não há corpo docente para uma só.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O que não pode é ma n ter-se isto assim.

O Sr. Lopes de Almeida: - Os professores não se fazem nas Caldas ...

O Orador: - Com a Holanda dá-se facto idêntico, mantendo número igual, seis, que, como as da Bélgica, têm papel de extraordinário relevo na vida intelectual daqueles países:

Do confronto estabelecido entre o número de Faculdades existentes nesses países e em Portugal resulta a demonstração da nossa inferioridade em face dos estudos humanísticos, históricos ou filosóficos professados em institutos especializados daqueles países. E, como disse, não quero estabelecer comparação com alguns países latinos.

Julgo assim, depois do que fica exposto, possuirmos dentro dos nossos parcos recursos capacidade bastante para acrescentarmos uma nova unidade ao reduzido número das Faculdades existentes, medida cujas vantagens são extraordinariamente fáceis de compreender. E das citações que acabamos de fazer colhemos ainda uma proveitosa lição, que nos parece absolutamente oportuno realçar.

No segundo período da anterior legislatura, versando problemas de educação e cultura, a que sempre liguei a minha atenção, tive oportunidade de me ocupar com certo desenvolvimento do ensino das Universidades católicas espalhadas pelo mundo, com tão notável acção na vida das sociedades.

Falava-se então, com muita insistência e muito interesse, da criação duma Universidade católica, o que seria para nós óptima e vantajosa dádiva, grande acontecimento que agora parece adormecido ou esquecido.

O Sr. Lopes de Almeida: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faz favor.

O Sr. Lopes de Almeida: - Era para pedir a V. Ex.ª que meditasse neste facto: um país, que é o nosso, que não sustenta um jornal católico, como vai sustentar uma Universidade católica na ordem particular, cuja existência demanda muitas dezenas de milhares de contos anuais?

O Orador - É pena que assim seja.