sólido apoio da sua incomparável experiência e da sua imaginação criadora, a que nem falta um extraordinário poder de previsão, para lançar e desenvolver, nos quatro quadrantes da vida nacional, os grandes planos, as grandes realizações, que possam finalmente dar «a cada boca o seu pão» e «a cada família o seu lar».

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: continuo a ser objectivo e escravo da verdade. Porque tenho abrasadoramente consumido a existência ao serviço do meu país e acompanhado de perto o desenrolar da vida nacional, neste quarto de século, aqui neste velho continente, no mar e no ultramar; porque nos mais diversos e distantes países, do Novo Mundo aos confins do Oriente, do Pacifico ao golfo Pérsico e às índias Ocidentais, me pude sempre ufanar da minha Pátria, por todos admirada e respeitada; sinto que em consciência devo, como creio que todos nós devemos, um profundo reconhecimento ao homem que a Providencia escolheu para acrescentar novos motivos ao orgulho de ser português.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Venâncio Deslandes: - Sr. Presidente: sou português e amo a minha Pátria. Quero-a honrada, engrandecida, prestigiada. Exijo-a inteiramente digna de um passado que me faz vibrar de orgulho e agradecer a Deus ter-me dado este berço.

Sei, daquele saber de experiência feito, que esteve a ponto de perder-se.

Vi, de olhos embora ainda adolescentes, o caos, a desordem, a sem-vergonha, impostos como método e como lei nos Governos, nas ruas, nos espíritos.

Ouvi conjugar, de coração confrangido, esse verbo maldito «portugalizar», como sinónimo de degradação e de boémia política, o meu país tomado como padrão da irresponsabilidade e do ridículo.

Era o opróbrio.

Sabia que nem todos eram maus. Conheci homens honestos, patriotas, idealistas, cujo maior desejo era servir e prestigiar Portugal. No entanto e apesar deles, das suas boas intenções e dos seus esforços, a nau do Estado ia resvalando rapidamente a caminho do abismo, arrastando consigo uma pobre e desorientada nação.

Um dia o Pais acordou ao som de um clarim. As suas notas vibrantes eram a própria voz da história gritando : Basta!

A força armada, com o apoio unanime dos portugueses de bom senso, ia enfim impor o respeito pela coisa pública e pela pessoa humana.

E assim se fez.

Um levantamento militar com aqueles objectivos conduz necessariamente a uma ditadura, mas esta não pode deixar de ser um regime de transição, porque não só a força armada não possui mentalidade e preparação adequadas à função política como tem de cumprir uma missão especifica de que não pode alhear-se.

Mas transição para quê? Para voltar de novo ao mesmo regime, àquele regime que acabava de provar (e de que maneira!) ser impotente e incapaz de nos gerir, não servindo por qualquer forma para valorizar e canalizar as reais virtudes que possuímos, antes estimulando e avolumando os nossos defeitos rácicos - a irreverência do nosso carácter, a violência e o descontrole do nosso temperamento, essa necessidade mórbida de desfazer e de contradizer, por cada um de nós ter sempre uma «verdade» e uma «solução» infalível para cada problema?

Não! Podiam mudar os nomes dos homens e dos grupos; as mesmas causas produziriam idênticos efeitos.

A transição tinha forçosamente de operar-se para um regime novo que soubesse ir buscar ao passado distante o influxo de valores morais que nos fizeram Nação e Império - o temor de Deus, o amor da Pátria e da família, a austeridade e a firmeza da governação, o clima heróico e missionário onde o Português sabe, por excelência, viver e é capaz de tudo sacrificar, para, na justa medida das nossas proporções, modelar no presente um futuro de dignidade e de pujança.

Partindo-se do zero, a tarefa era por de mais grandiosa, para não parecer irrealizável.

Para uma missão, um chefe.

E o chefe que uma missão desta envergadura exigia seria aquele que a soubesse definir com tanta clareza que a tornasse acessível às inteligências comuns; que

pudesse ser, na mesma medida de eleição, o filósofo para lhe moldar a estrutura mental e o homem de acção para lhe dar forma física; que a quisesse viver com tanta determinação, e tanta fé que fosse capaz de a colocar sempre acima de tudo e de todos e tudo por ela sacrificar; que estivesse tão seguro da sua verdade que as calúnias dos que a não quisessem servir e os erros daqueles que o apoiassem não conseguissem desviá-lo do caminho traçado; que tivesse um sentido tão agudo das realidades que, entre a crítica desapaixonada do presente e a cautelosa previsão do futuro, soubesse encontrar, em cada momento, a justa medida para que o passo a dar fosse seguro e definitivo; exigia -que sei eu?- que num complexo humano igual a todos nós se reunissem prodigamente o génio criador do sábio, a abnegação total do asceta e a integra firmeza do guerreiro.

Existiria esse chefe?

A mesma Providência que em Ourique iluminou o primeiro rei, sobre os rochedos de Sagres apontou ao Infante o caminho dos oceanos tenebrosos, que era o da glória da Pátria, e em tantos e tantos outros momentos sempre e sempre nos mostrou que só somos pigmeus quando não temos fé, se encarregou de o revelar quando nos era oferecida a tutela estrangeira como última amarra e pudemos encontrar força de ânimo para orgulhosamente a rejeitar.

Passaram trinta e um anos (toda uma geração!) que um professor ainda jovem foi arrancado à cátedra que iluminava com a lucidez da sua inteligência privilegiada e levado a subir definitivamente as escadarias do Poder.

Queiram-no ou não: nesse próprio momento em que pisou o seu primeiro degrau ultrapassou o destino dos mortais e fixou-se na história para sempre.

Vozes: - Muito bem, muito bem!