O Sr. Mário de Figueiredo: - Depois de reflectir, convenci-me de que o devia fazer e pôr-lhe a questão.

O problema que está posto, pelo menos como V. Ex.ª o referiu, é o problema da eleição do Chefe do Estado e dos artigos constitucionais com ela ligados. Portanto, não está posto para solução o problema da designação do Chefe do Estado dentro do pensamento que tem sido o animador de toda a vida política de V. Ex.ª O problema que se põe é o de saber qual o melhor sistema de designação do Chefe do Estado dentro do regime. Quer dizer: é o da designação, num certo sistema constitucional, do Chefe do Estado; sendo assim, se se vota contra um certo sistema, é porque se pretende que fique consagrado um outro sistema, mas sempre no mesmo plano.

O Sr. Carlos Moreira: - Não apoiado!

O Sr. Mário de Figueiredo: - Eu nem chego a compreender como é que neste plano, as coisas podem pôr--se diversamente.

Há um certo problema que V. Ex.ª gostaria de ver resolvido em determinado sentido, mas esse problema não está posto.

O Sr. Carlos Moreira: - Não está posto pelo Governo, mas pode pôr-se perante a consciência política do Deputado.

O Sr. Mário de Figueiredo:- Portanto, V. Ex.ª é arrastado a esta posição: votar contra um sistema de eleição e, com isso, consagrar outro sistema de eleições pior que esse.

Estava a embaraçar-me a questão, nos termos em que V. Ex.ª a pôs, porque não acho que tenha sido posta no verdadeiro terreno. Na verdade, na hipótese, votando V. Ex.ª contra um certo sistema de designação do Chefe do Estado, que está proposto, está a votar por outro sistema de eleição - o que existe.

Em qualquer caso, vota por um sistema de eleição do Chefe do Estado tanto quando vota por, como quando vota contra, que é o que V. Ex.ª não quer.

Em qualquer hipótese, V. Ex.ª está a votar por um certo sistema de designação do Chefe do Estado.

O Orador: - A consideração e o respeito que V. Ex.ª me merece obrigam-me então a ser mais explícito. Eu disse saber que não tinha sido eleito como monárquico, mas acrescentei que por ter sido eleito não deixara de ser monárquico.

Portanto, se o julgasse oportuno nesta conjuntura, facilmente teria posto o dedo na ferida, porque bastava substituir uma palavra no artigo 5.º da Constituição para transformar o regime republicano em monárquico.

O que eu não posso é votar um artigo que impõe um sistema de escolha do Chefe do Estado por eleição, seja qual for o modo.

Quando V. Ex.ª diz que recusar um sistema de eleição é o mesmo que aprovar ou preferir outro que existia não tem razão, porque recuso toda e qualquer forma de sufrágio, por todas serem incompatíveis com a perenidade da realeza.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Eu aceito a questão nesse pé. Mas o que afirmo é que votando contra está a votar por V. Ex.ª entende que o Chefe do Estado não deve ser eleito; mas esse problema não está posto. Se não está posto, V. Ex.a, estando a votar contra um certo sistema, está a votar por outro, porque o problema que está posto, o único problema que está posto, é o da escolha entre vários sistemas de eleição do Chefe do Estado.

O Orador:- Rejeito todos. Rejeitei o de 1951, rejeitarei este e nada me impedia legalmente de propor em projecto de lei pura e simplesmente a substituição no artigo 5.º da palavra «República» por «Monarquia».

O Sr. Carlos Moreira: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador:- Faz favor.

O Sr. Carlos Moreira: - Parece-me ter entendido o raciocínio de V. Ex.ª nos seguintes termos: V. Ex.ª, em face das tais imposições de ordem nacional de oportunidade e razões de vária ordem, entendeu que não podia atacar o problema frontalmente, isto é, que não devia trazê-lo agora aqui, por imposição da consciência política, embora pudesse fazê-lo em face das prerrogativas constitucionais.

Então, desde que não concorda com a forma do regime, V. Ex.ª alheia-se da escolha do Chefe do Estado electivo, seja qual for a forma da eleição.

Ora só há duas formas de se alhear, em vista de o Regimento não permitir a abstenção: ou abandonar a sala, o que não me parece, salvo o devido respeito, uma posição aprumada, ou votar contra, porque, se votar a favor, aceita implicitamente o regime político com que não concorda.

O Orador:- Exactamente. Não é nova a minha orientação de agora, porque, repito, já a adoptei em 1951.

Sr. Presidente: termino a minha breve intervenção assegurando a V. Ex.ª e à Assembleia que, além da intenção de expor e justificar o meu voto, tive a de cumprir um dever de lealdade, de cortesia e de grata camaradagem, de que os meus prezados colegas se me tornaram credores.

Não desejo, porém, descer da tribuna sem apoiar as palavras do Sr. Eng.º Jorge Jardim e, daqui, dirigir a Salazar uma sincera e calorosa saudação e prestar-lhe, como português, gratíssima homenagem pelo notável discurso há dias proferido.

O Sr. Presidente do Conselho mais uma vez demonstrou que sabe, que pode e que deve continuar Portugal!

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão. A próxima será amanhã, com a mesma ordem do dia de hoje. Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Adriano Duarte Silva.

Alberto Henriques de Araújo.

Alberto Pacheco Jorge.

Alberto da Rocha Cardoso de Matos.

Alfredo Rodrigues dos Santos Júnior.

Américo Cortês Pinto.

António Calapes Gomes Garcia.

Armando Cândido de Medeiros.

Belchior Cardoso da Costa.

Carlos Coelho.

Carlos Monteiro do Amaral Neto.

João da Assunção da Cunha Valença.

João Cerveira Pinto.