que está de acordo com a fé, a consciência e os sentimentos cristãos da unanimidade dos seus membros».

Igual constrangimento não sentiremos nós, na nossa Assembleia,, porque sabemos auscultar e bem interpretamos a consciência nacional, que se tem afirmado, em todas os circunstâncias, crente em Deus e na sua fé tradicionalmente cristã.

Ainda se não apagaram os ecos dos cânticos e orações que envolveram o monumento a Cristo-Rei, erguido em frente desta capital lusíada. Aos pés dessa estátua e da imagem da Rainha e Padroeira celebram-se as últimas cortes da Nação Portuguesa: o Chefe de Estado, com todo o Governo, os bispos, com todo o seu clero, o povo e toda a sua nobreza de alma e sentimentos. A voz de Portugal, renovado e redimido, fez-se ouvir, pelos seus lídimos representantes, uma consagração solene e fervorosa.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - E enquanto se erguia para o Alto, nas volutas do incenso, o Te Deum laudamus, cantado na catedral aberta da terra lusa, dos corações de todos os portugueses ali presentes ou espalhados pelas outras partidas do Mundo, choviam lágrimas que regavam preces.

Apetecia gritar:

Arraial! Arraial! Por Deus, pela sua Igreja, por Portugal!

Precisaríamos mais para conhecer a vontade de um povo?

Continuemos a seguir o articulado da Câmara Corporativa. «É, aliás (diz-se no parecer), tão pouco importante a inserção de um preâmbulo do género do sugerido no projecto em análise que as leis constitucionais do próprio Estado da Cidade do Vaticano, de 7 de Junho de 1929, não se iniciam por qualquer invocação ou preâmbulo confessional do género» (Fecha o período um ponto de exclamação).

Se não fossem a, gravidade do assunto e a responsabilidade que pesa sobre a mesma Câmara Corporativa e o respeito que merece, pensaria que se tinha procurado fazer humorismo.

Não é verdade que essas leis sejam a constituição política, do Estado da Cidade do Vaticano; provam-no a forma da sua promulgação e á análise do seu conteúdo.

Encontram-se tais leis no suplemento do órgão oficial da Santa Sé - Acta Apostólicoe Sedis -, cujo título geral é este: «Suplemento para as leis e disposições do Estado da Cidade do Vaticano».

Não convém, por certo, a publicação solene de uma constituição um título em que nem o termo clássico aparece, nem outro de igual significado, e onde as leis andam de mistura com disposições.

Seguem-se seis leis, singularmente promulgadas, cada uma com o seu título especial:

Lei fundamental da cidade do Vaticano, lei sobre as fontes do direito, lei sobre o direito de cidade e residência na cidade do Vaticano, lei sobre a organização administrativa, lei sobre a organização económica, comercial e profissional, lei sobre a segurança pública. Não creio que a Câmara Corporativa queira chamar a todo este conjunto uma c onstituição política!

Que estranha lei constitucional seria esta, promulgada em seis leis distintas, todas datadas do mesmo dia?!

A matéria de algumas dessas leis tinha entrada numa constituição, mas nenhuma delas, por si só, a forma. O primeiro grupo - lei fundamental - poderá suscitar alguma dúvida. Se o analisarmos de um modo geral verificamos que os elementos que dão corpo a uma constituição, como, por exemplo, a forma de Governo, a instituição do poder supremo, a eleição do Chefe do Estado, etc., não se encontram estruturados, mas supõem-se já constituídos. A razão está era que a cidade do Vaticano tem o seu fundamento na própria Santa Sé, cuja Constituição é de direito divino.

Nessa lei fundamental determina-se a orgânica do Estado do Vaticano, no que toca ao seu governo efectivo e- delegado, regula-se o funcionamento dos tribunais, sua jurisdição e competência, e indicam-se a forma, cor e armas da sua bandeira.

Todas estas leis, verdadeiramente orgânicas, ordenam-se à execução dos Acordos de Latrão com que estão intimamente ligadas, pois foram assinadas por Pio XI no próprio dia da troca das ratificações dos mesmos acordos.

E se, em hipótese não verificada, se tratasse realmente da Constituição Vaticana, a missão divina do legislador não lhe dava a qualidade que o parecer chama «confessional»?

Anota ainda a Câmara Corporativa o facto de não estar praticamente na tradição constitucional portuguesa uma formulação invocativa do nome de Deus. Mas a nossa primeira Constituição Política, promulgada por D. João VI a 23 de Setembro de 1822, inclui o seguinte preâmbulo:

«Em nome da Santíssima Trindade» ... Não será isto mais do que invocar somente o nome de Deus? Não tem razão a Câmara Corporativa ao afirmar que não está na nossa tradição constitucional uma invocação a Deus, quando essa invocação aparece de uma forma especial na nossa primeira Constituição.

E recordemos ainda as cortes de antanho, por vezes autênticas assembleias constituintes, onde sempre se invocava o nome de Deus!

Esta é que é a nossa genuína tradição.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Nunes Barata: - V. Exa. dá-me licença? Estou a ouvir encantado as considerações de V. Exa. e a interrupção que quero fazer é ainda a propósito da Constituição do Vaticano. Há um pormenor que à Câmara Corporativa talvez possa ter escapado: é que todas as concordatas celebradas entre a Santa Sé e os outros Estados começaram por invocar o nome da Santíssima Trindade, o mesmo acontecendo com a Concordata celebrada com o Governo Português em 1940 e com 'todas as concordatas desde que a Santa Sé as celebra.

E note-se que uma concordata tem uma projecção internacional muito maior que uma simples constituição, pois é instrumento de direito internacional.