pender à suprema dignidade do Estado; que podem chegar a constituir um ensejo de insurreição e, portanto, são a porta aberta para a subversão violenta de todos os valores e de todas as instituições. E acresce - como português o digo, cheio de vergonha - que n paixão leva a transpor o pleito para o plano internacional, numa renegação de que a Pátria é o único campo para as nossas lides e de que a opinião dos Portugueses é a única que pode decidir dos interesses de Portugal.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Pode, e não sem fundamento, responder-se que estas consequências não são, por si o resultado necessário do sufrágio directo, visto haver países onde tudo se passa com suficiente dignidade cívica. E de facto assim. Mas a política não ó a dedução de fórmulas a partir de princípios abstractos, mas sim a arte da realização do bem comum no seio de uma comunidade nacional, determinada e definida por características que têm de ser tomadas em consideração.

No nosso país o que se verifica é que o sufrágio directo vem normalmente acompanhado daqueles efeito»: é nesse sentido a lição de já quase século e meio de experiência histórica. E a reflexão faz descobrir que o fenómeno tem a sua explicação, não em circunstâncias fortuitas que se verificaram ontem, mas se poderiam amanhã afastar, mas em condições permanentes que se mantêm e que por isso mesmo conduzem sempre ao» mesmos efeitos. São condições históricas, culturais e temperamentais. Talvez o sufrágio d irecto nos não esteja na massa do sangue; ele foi implantado simultaneamente com um conjunto de instituições novas, decalcadas, desconhecedoras da realidade portuguesa e contrárias a um sistema de governação muito antigo, no qual a soberania popular tinha papel de relevo e se exercia por uma foi-ma tradicionalizada. Daí uma resistência viva da Nação contra o Estado e a instalação de um clima de crise política, cujos últimos efeitos ainda hoje se poderiam encontrar. Depois, acontece que o baixo nível cultural do País, expresso nas taxas do analfabetismo e nu escolaridade limitada, faz com que o eleitorado não tenha opinião política; a competição, que é o meio, aparece aos seus olhos como o próprio fim, e a campanha de agitação torna-se indispensável para forjar as opiniões que não existem.

Por último, nós somos um povo de emoção à flor da pele e é muito conforme à nossa natureza não saber manter n calma durante o jogo, qualquer que seja o jogo.

(Risos).

Por tudo isto, tem de se concluir que o sufrágio directo arrasta em Portugal às consequências que todos conhecemos; e aquelas consequências são bastante graves para, só por si, imporem a condenação do sistema.

O parecer da Câmara Corporativa deve, porém, também neste ponto, sofrer um reparo: o de que limitou a sua crítica ao voto directo aos aspectos mais superficiais, aos inconvenientes que não estão tanto no próprio voto, como nas suas concomitâncias ou repercussões

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Quero, em resumo, dizer que, em eleições directas, o que decide não é o mérito, mas a demagogia.

Vozes: - Muito bem, muito bem!