O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para efectivai- o seu aviso prévio sobre os organismos de coordenação económica o Sr. Deputado Ferreira Barbosa.

confiança, partilhada por todos os portugueses de boa vontade, não obsta a que entenda caber também a esta Assembleia uma palavra de ordem. Sempre me habituei a cumprir, tão integralmente quanto possível, os deveres que assuma. Deputado, sem que a alguém tenha de longe demonstrado a vontade de o ser, mas não tendo hesitado em me, apresentar ao sufrágio quando tal me foi indicado, entendo que, para mais uma vez não faltar a essa linha de conduta, tinha hoje de proceder como estou procedendo.

Assim, espero- e tenho razões para confiar- que, principalmente de V. Exa., Sr. Presidente, e dos meus ilustres colegas desta Assembleia, me não falte o apoio moral, a simpatia de amigos que acreditem na minha sinceridade.

Talvez e em verdade esse apoio moral me seja necessário, pois não posso esquecer que, logo após uma minha modesta intervenção nesta Guinara, recebi uma carta anónima (em que o anonimato vilmente se atenuava com a indicação - em que não acredito - de partir de funcionários de organismos de coordenação económica), carta anónima em que, à mistura de insultos soezes e de graçolas de mau gosto, se me faziam ameaças.

Sr. Presidente: entendo que nada pode ser mais nocivo à consolidação, propagação e desenvolvimento de um sistema doutrinário do que poder-se-lhe apontar distorções, mesmo quando correspondam a alterações aceitáveis ou justificadas sob um ponto de vista prático.

Uma doutrina tem de ser íntegra e límpida e o sistema que nela assente mostrar-se claro, nitidamente definido em todos os seus contornos e 'sem portas escusas.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Assim, o próprio pormenor nãolhe pode ser indiferente. É quando a prática, as circunstâncias ou as realidades imponham alterações ou modificações em pontos da aplicação prática da doutrina, é forçoso que se proceda de forma clara e sincera ao reajustamento imediato de posições, naturalmente e

sempre com salvaguarda dos princípios gerais e essenciais da mesma doutrina. Quando tal realmente se justifique não há por que ter dúvidas ou receios.

Posto isto, entremos mais propriamente no assunto.

Desde a sua criação que os organismos de coordenação económica foram considerados como elemento de ligação entre o Estado e a organização corporativa. A Lei n.º 2086 confirmou-lhes esta qualidade, precisando que o eram entre o Estado e as corporações. E, valha, a verdade, que, para se evitarem conflitos de jurisdição e a bem da disciplina corporativa, a ligação deveria ser de facto feita unicamente através das corporações.

Com certa incongruência (pois, s e há necessidade de ligação, é porque se trata de duas partes distintas - pelo menos assim se consideram - e não me parece normal que um agente de ligação entre duas partes pertença a uma delas), têm-se agora definido os organismos de coordenação económica como «órgãos descentralizados da Administração para a gestão económica».

Esta fórmula foi usada por S. Exa. o Sr. Secretário de Estado do Comércio, pelo menos, no seu despacho de 2 de Outubro do ano findo e na nota oficiosa relativa ao incidente com a Junta Nacional do Vinho. Também já o fora, há cerca de um ano, nesta Casa, pelo nosso ilustre colega o Deputado Dr. Dias Rosas.

É uma fórmula que os classifica quanto à sua natureza, e lhes determina genericamente o objecto. Não nos detenhamos a analisar o sabor verdadeiramente colectivista que a expressão «gestão económica» lhe dá. O ordenamento iludo às palavras «órgãos descentralizados da Administração» poderia permitir talvez duas interpretações, mas su ponho não me enganar entendendo que com isso se quer dizer tratar-se de organismos da Administração mais ou menos autónomos e mais ou menos especializados (o aposto justifica esta última conclusão).

Isto implicaria desde logo reconhecimento de um carácter estadual aos referidos organismos, o que ainda se não fez, pelo menos de forma clara e inequívoca. Não basta para esse reconhecimento, embora indique intenção em tal sentido, que se determine a anteposição no seu papel de ofícios ao titulo do organismo da menção do departamento ministerial ou Secretaria de Estado de que dependam directamente. (Verdade é também que tal cuidado e tal minúcia parecem, por outro lado, contradizer a ideia da descentralização ...).

Eis, pois, o primeiro equívoco a esclarecer.

Na situação actual, mantém-se sobre a verdadeira natureza ou carácter desses organismos uma incerteza que importa fazer desaparecer. E que, a continuarem na sua actual feição, das duas, uma: ou esses organismos mantêm uma independência e liberdade de movimentos que lhes podem realmente garantir eficiência, mas correndo o risco de se «profissionalizarem» em excesso e, portanto, incorrer nos defeitos, quiçá agravados, dos órgãos profissionais; ou acabam por cair na dependência directa e servil do Ministro, perdendo toda a iniciativa e burocratizando-se. E valha a verdade que se tem feito todo o possível neste último sentido.

Sobre os seus directores e demais funcionalismo- incertos o seu futuro e os seus direitos; funcionários do Estado quase só para as responsabilidades e deveres - pairará sempre o dilema de, apaixonando-se pelas coisas da profissão ou actividade com a qual se encontram em contacto directo, correrem o risco de suspeição e até de nada poderem afinal produzir porque não serão talvez acreditados, ou descambarem em simples, sob certo aspecto, bons funcionários, atentos às ordens dos seus superiores hierárquicos, não se atrevendo à menor divergência ou dúvida e, pondo de lado os justos