Numa tarde de Março do ano de 1500 estava aparelhada no Tejo «a mais formosa e poderosa armada que até àquele tempo pera tão longe destes Reinos partira». Pedro Álvares Cabral era o seu capitão.

No dia 9 daquele mesmo mês a frota largou do Tejo a caminho do Brasil, ainda por descobrir à cristandade. A 12 do mesmo mês os navios estavam à vista da Madeira, que era a base avançada do sonho português em curso de realização, prosseguindo sem parar até às Canárias.

Três dias demorara aquela viagem até às alturas da minha ilha.

Desde os dias de 1500 até aos nossos decorreram quatro séculos - quase cinco.

Agora, um mês basta para pelo mar levar à Índia uma carta de Lisboa; algumas horas demorará se pelo ar se enviar.

Bem pode pois dizer-se que as várias parcelas de Portugal no Mundo se aproximaram umas das outras e, mais e mais, da Mãe-Pátria.

Porém, por mais paradoxal que pareça, para ir de Lisboa à Madeira ainda são precisos, para os que embarcam num dos v elhos navios da carreira das ilhas, como por vezes se chama aos que em busca de proventos suplementares pelo Funchal passam a caminho dos Açores, ainda são precisos, repito, dois dias.

Em quatro séculos a viagem reduziu-se de três para dois dias.

Deste modo, a parcela portuguesa que antes era a mais próxima é agora, apesar de todas as vitórias do homem contra as distâncias, a mais afastada.

Esta é sempre a duração do percurso feito por todos os portugueses que, contrariados, conseguem adaptar-se à ideia da fatalidade, mais ou menos geográfica, que impende sobre a formosa ilha.

Porém, aqueles que se atrevem a pensar em vir a Lisboa, ou de Lisboa ir ao Funchal, utilizando um dos modernos navios, esses raramente o conseguem, e quase sempre verificam que só à custa de muitas andanças e muitos empenhes pelas companhias de navegação respectivas obtêm um lugar precário e de favor. E nisso gastam tanto tempo e tantos dias, até que ganhem a certeza de que podem fazer a razão de 1$50 o quilómetro, os 1800 km de ida e volta, que entre Lisboa e Porto se pagam a $50 cada um.

E por cá e por lá ficarão, sem fazerem viagem, os muitos a quem não sobram as férias para esperar por uma passagem mais barata de navio durante semanas, nem abundam os cabedais para se meterem num avião.

Pelo Mundo ficarão também, esperando melhor oportunidade, os numerosos estrangeiros a quem o dinheiro e o tempo não permitem e o animo não consente a aventura de um passeio sem principio nem fim antecipadamente determinados.

A situação, como a descrevo, não é de agora.

É de há muitos anos, no decorrer dos quais alguns Deputados pela Madeira dela se têm ocupado nesta Assembleia. Além de outros, juntando a acção à palavra, justo é destacar o actual presidente da Junta Geral do distrito do Funchal, engenheiro Teixeira de Sousa.

Mas a situação não evoluiu para melhor, antes piorou.

Sinto que, sem perder a fé nos destinos da minha ilha e nos homens, não sei apontar as razões por que a Madeira está, neste aspecto, e continua a estar, no cabo do Mundo, nem o tento fazer.

Cuido, porém, que, dando da situação e deste lugar conhecimento a quantos com méritos e com poderes a podem resolver, legitimamente posso esperar, e comigo todos os madeirenses, pela solução mais adequada aos interesses da Madeira do que a quaisquer outros.

Sem mais motivos de atracção que não sejam as suas belezas, até agora tão fora de mão, por ali não se encontram ainda fundamentos sérios para o estabelecimento de uma carreira exclusiva de navegação. Mas, por outro lado, enquanto esta se não estabelecer, ainda que precariamente de inicio, ali levando quantos desejam deslumbrar-se mirando a ilha sem correrem os riscos de demoradas e incertas viagens, no termo das quais alguns encontram cerradas as portas do seu antigo emprego, consequência da sua excessiva ausência para além da licença concedida, não se pode esperar que esses fundamentos surjam.

Não sei porque está ainda tão longe a minha ilha, porque se tornou tão inacessível.

Mas sei que quantos nela ponham os olhos chorarão de emoção, porque ela ainda tem sinais de vir da mão de Deus, como ao infante um dia dizia um dos marinheiros das suas audaciosas caravelas, que ali logravam chegar, algumas vezes, ao sopro de vento de feição, no fim de tantas horas quantas as que agora se contam para vencer nos velhos navios a mesma distancia.

E é uma pena que assim ainda suceda.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

(Assumiu a presidência o Sr. Deputado Cota Morais).

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

O Sr. Presidente: - Continua o debate sobre o aviso prévio do Sr. Deputado Ferreira Barbosa acerca dos organismos de coordenação económica.

Tem a palavra o Sr. Deputado Mário de Oliveira.

O Sr. Mário de Oliveira: - Sr. Presidente: a questão posta no aviso prévio do nosso ilustre colega, Ferreira Barbosa traz à evidência problemas de transcendente importância e melindre.

O caso dos organismos de coordenação económica é, a meu ver, a simples expressão externa e circunstancial de um tema bem mais profundo. Em boa verdade, o que se pretende observar é o próprio fundamento do sistema de intervenção do Estado na ordem económica, em face da recente instituição das primeiras corporações.