O Sr. Santos da Cunha: - Oxalá que essas instituições dêem depois os resultados que V. Ex.ª delas espera.

O Sr. Ferreira Barbosa: - Estou plenamente de acordo com V. Ex.ª, Sr. Deputado Mário de Oliveira, quando diz que a função representativa é talvez a função mais nobre das corporações. E concordo também em que devemos expurgar a organização corporativa de toda a acção de intervencionismo económico. Mas também não tenho dúvida alguma de que no espírito de V. Ex.ª está igualmente a ideia de que a nossa organização corporativa deve ter o direito de exercer funções de disciplina sobre os seus associados, e para tal, estabelecendo normas, não poderá deixar de ter funções executivas, sem o que essas normas deixariam de ter qualquer expressão.

O Orador: - Com certeza. Nada tenho a opor à acção disciplinar das corporações sobre as actividades que as integram.

Sr. Presidente: termino na consciência de que procurei evidenciar, no campo doutrinário em que a nota do aviso prévio se situa, os motivos da prevenção que formulei no início das minhas considerações.

O tema enunciado pelo nosso ilustre colega Ferreira Barbosa põe em causa o próprio fundamento da intervenção do Estado na vida económica. Daí o seu melindre e importância.

Por mim, suponho que, ao menos, fui explícito ao significar que o nascimento legal das corporações não pode nem deve afectar o poder político do Estado e da Administração, na medida em que esse poder for exercido com pleno respeito dos legítimos interesses particulares representados na organização corporativa.

Estado e nação são duas entidades que se realizam e completam entre si, tanto mais quanto melhor só projectarem e representarem uma na outra.

Não há motivos doutrinários que se opunham à permanência dos organismos coordenadores em face da ordem corporativa. Eles são a própria emanação do Estado, a presença institucional e especializada da sua Administração na problemática concreta dos principais ramos da actividade nacional.

Em meu juízo, o conteúdo orgânico e funcional desses organismos permanecerá, enquanto os ditames da conjuntura solicitarem a activa intervenção do Estado no domínio económico.

O seu desaparecimento do quadro estrutural da Administração seria indício auspicioso de uma era de equilíbrio económico e harmonia social. Nessa altura, deveria ser o próprio Estado o primeiro a contrair as suas atribuições, a reduzir ou a eliminar, por desnecessário, o seu intervencionismo, em face do apuramento da consciência cívica e moral da comunidade que representa e serve. Nesse momento ideal, que todos naturalmente desejaríamos viver, também as próprias corporações veriam aliviadas as suas próprias atribuições disci plinares e reivindicativas, pois a vida de relação revelaria comportamento colectivo meritório, em espontâneo movimento de vontade.

Não haveria que constranger os sectores e as empresas, impondo-lhes obrigações, regras e disciplinas; haveria simplesmente que consagrar esse estado social a que toda a humanidade aspira. O problema de auto-direcção iria então fixar-se não já nas corporações, mas no próprio plano da pessoa humana.

Até lá, porém - e só a formação cristã e a fé católica nos permitiram formular o conceito - há que ter sempre presente a conhecida expressão de Lacordaire: «entre o forte e o fraco está a liberdade que oprime e a intervenção que liberta».

E só o Estado, na ordem temporal, pode e deve ser o supremo árbitro do teor dessa intervenção. Aliás, é ao Estado, segundo dispõe o artigo 31.º da Constituição Política, que compete «o direito e a obrigação de coordenar e regular superiormente a vida económica e social».

Neste caso dos org anismos de coordenação económica, o Governo tem uma palavra a dizer e, sobretudo, uma decisão a tomar.

Aguardemo-las serenamente, já que Deus nos continua a conceder o privilégio da presença e do clarividente comando do Doutor Salazar.

Que Deus o guarde por muitos e longos anos, para que na palavra e nas decisões do Governo perdurem o timbre, a nobreza e a autenticidade doutrinária que sempre lhes empresta o alto espírito do Chefe do Governo.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!.

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Pereira Jardim: - Sr. Presidente: interrompo oito anos de ausência na publica discussão de problemas económicos ou da organização ligada a intervenções nestes problemas para trazer uma palavra de comentário ao debate.

Cessando de existir as inibições de ordem moral que me conduziram a esse silêncio, traz-me aqui, Sr. Presidente, o interesse pelo tema sempre vivo que conteve todos os sonhos da minha juventude, em cujo serviço fui acumulando algumas desilusões ao longo dos anos, desilusões que, porém, nunca afectaram a minha fé na doutrina e a certeza na possibilidade de ela enfrentar as realidades. É ainda essa fé que me faz ter na doutrina corporativa a única esperança de uma estruturação capaz e equilibrada da vida nacional.

Traz-me ainda ao debate, Sr. Presidente, a possível experiência e até responsabilidade de alguma acção executiva em que tantas vezes, e tantas vezes com angústia, tivemos de sacrificar alguma coisa da doutrina, angústia essa que continha em si mesma a preocupação viva de se integrar na pureza doutrinária aquilo que as realidades consentiam.

(Nesta altura reassumiu a presidência o Sr. Deputado Albino dos Reis).

um sector importante da vida nacional, quiçá dos mais importantes, se salvou toda uma actividade produtiva com largos capitais inves-