-se-lhes pouco e, por isso, não é lícito exigir-se-lhes muito.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E como relativamente pouco se lhes pede, a paga também não pode ser grande.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Serviço prestado e remuneração paga devem estar, numa grande parte dos casos, dentro de uma mais ou menos justa proporção.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mas, a par dos que tendo apenas a instrução primária ou mesmo sem oficialmente a possuírem, conseguiram, com uma preparação feita quase sempre junto do professor da localidade, adquirir o diploma de regente de posto escolar, há muitos outros que senhores de apreciável cultura, foram levados, pelos azares da sorte, a terem de se contentar com o exercício de tão modesta função.

Quantos não há que, ou por haverem decaído de fortuna, ou por terem sido forcados a desistir dos seus cursos, ou por não possuírem diplomas oficiais, ou por qualquer uma das milhentas conspirações dos acontecimentos, não viram, em determinado momento da sua vida, outra solução que não fosse a de recorrer ao exame que os habilitasse à função de regente escolar?

A estes há ainda a acrescentar os que se apaixonaram pelo ensino, e que à custa de trabalho indefeso e de heróico esforço, conseguiram um nível de cultura que não teme confronto com o dos professores diplomados.

É sabido que dado o espantoso aumento de escolas no País -uma das muitas e das mais belas realizações em que o Regime pode rever-se-, tem havido necessidade, de se pôr à frente delas um número apreciável de regentes escolares.

Segundo os dados que colhi no notável discurso aqui proferido pelo nosso ilustre colega Dr. José Saraiva aquando da discussão do II Plano de Fomento, estavam ao serviço, no fim de 1957, 7000 regentes escolares e, destes, havia 1231 colocados em escolas que deveriam ser dirigidas por professores.

Há regentes - escolhidos entre os melhores, evidentemente - que durante anos e anos seguidos (quatro, seis, dez anos e mais) têm desempenhado por forma brilhante as funções de professor.

Que falta para que lhes seja facultada a ascensão definitiva ao professorado? O curso oficial?

É pouco; é muito pouco; é quase nada.

Longe de mim a ideia de aventar genericamente, como mora hipótese sequer, a desnecessidade de cursos oficiais para o exercício de funções docentes.

O que afirmei e reafirmo é que no caso particularíssimo de que estou a tratar, negar-se o acesso ao professorado primário aos regentes escolares que estão nas condições que apontei, com fundamento na falta de curso oficial, é pouco, é muito pouco, é quase nada.

Muitos de nós poderão certamente afirmar que entre os mais notáveis professores que tiveram se contam alguns que não possuíam nenhum curso oficial nem jamais haviam estudado teóricas ciências pedagógicas.

As qualidades didácticas nascem com a própria pessoa; o estudo e a prática depois as apuram e sublimam.

Em contrapartida, todos nós conhecemos professores que, não obstante haverem recebido a sagração dos cursos e diplomas oficiais, nunca foram capazes de desempenhar com eficiência a sua missão, por falta de qualidades que só a natureza é capaz de fornecer.

A Sr.ª D. Maria Irene Leite da Costa: -V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Com muito gosto.

A Sr.ª D. Maria Irene Leite da Costa: - Então V. Ex.ª não aceita a necessidade de uma prepararão pedagógica?

O Orador: - Aceito, mas o que estou a dizer é que, entre os notáveis professores que tive, alguns, e dos maiores, não tinham nenhum curso oficial.

A Sr.ª D. Maria Irene Leite da Costa: - Há quantos anos vai? É que o ensino evoluiu.

O Orador:-Vai há muitos anos, infelizmente para mim. Mas estou convencido de que hoje esses homens continuariam a ser notáveis professores.

O Sr. Rodrigues Prata: - Do seu tempo. E ainda assim, são excepções.

O Orador: - É evidente. Eu disse que genericamente não aventava, como hipótese sequer, a desnecessidade de cursos e diplomas para o exercício do magistério. O que afirmei e continuo a afirmar é que as qualidades didácticas nascem com as pessoas.

Isto é uma realidade indesmentível e contra ela de nada valem feiticismos oficiais ou conceitos apriorísticos deturpadores da visão correcta das coisas.

De resto, que melhor curso se pode exigir para professor primário do que o exercício da função, com provada competência, durante anos e anos seguidos?

Se há regentes escolares que têm demonstrado, ano após ano, serem bons professores, elevá-los a esta categoria parece-me ser acto de pura justiça.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Com isso beneficiaria o ensino e dar-se-ia merecido galardão a quem dele se mostrou merecedor.

Quando no fim do curso, tirado com aproveitamento, se dá um diploma, premeia-se o estudo realizado e confere-se o título indispensável ao exercício da profissão; mas nunca há a certeza de que o diplomado irá ser um bom profissional. A prática, depois, é que o há-de dizer.

A Sr.ª D. Maria Irene Leite da Costa: - Mas V. Ex.ª acha que um regente escolar que tem apenas a 4.ª classe, por exemplo, só porque foi um bom professor está na mesma situação do que os outros com muito mais habilitações?!

O Orador: - Se ele esteve dois, quatro, seis ou dez anos investido na função de professor e demonstrou, por actos e factos, que era competente, não sei porque não se lhe há-de permitir o acesso a essa categoria...

A Sr.ª D. Maria Irene Leite da Costa: - Para V. Ex.ª portanto, um indivíduo que tem feito um certo exercício de medicina deveria considerar-se como médico...

É necessário colocar o problema num aspecto diferente quanto ao ensino das ciências pedagógicas. E hoje a psicologia é uma ciência em qualquer parte do Mundo ...