O Sr. Simeão Pinto de Mesquita: - Nesse aspecto de estatística de distribuições dos sacerdotes há que considerar as vocações sacerdotais, que predominam em determinadas áreas, sem prejuízo do outras.

O Orador: - Deve igualmente ter-se em conta que o deficit nos grandes centros é agravado pela emigração de populações rurais. Na verdade, Lisboa, por exemplo, tem recebido dezenas de milhares de indivíduos provenientes da província.

Ora esta multidão não vem acompanhada de sacerdotes. Aumenta assim nas cidades a desproporção entre o número de padres, que eram os existentes antes dos movimentos do urbanismo, e os seus habitantes, agora transformados em multidão pela afluência do rural.

Acontece que a diminuta quantidade de sacerdotes não está de harmonia com a frequência dos nossos seminários, revelando, antes, ser relativamente reduzido o número de seminaristas que chegam a padres. Enquanto na vizinha Espanha a taxa de desinências não ultrapassa os 30 por cento, na Irlanda 43 por cento e na Alemanha 43 por cento, ela atinge no nosso país 80 por cento.

A análise dos números (cf. a obra de João Nabais, a Vocação à Luz da Psicologia Moderna permite, por exemplo, salientar que dos 7147 estudantes admitidos (no período de 1930-1941) no 1.º ano de preparatórios dos seminários portugueses passaram a Filosofia, nas correspondentes épocas de 1934-1946, 3089, transitando para o curso de Teologia, nos anos de 1936-1948, 2168, dos quais se ordenaram (entre 1940 e 1952) 1540.

Esta percentagem média de 20 por cento de ordenações obtém-se, por outro lado, à custa de valores muito diferentes nas várias dioceses.

É o que se pode comprovar com o mapa que a seguir se transcreve, referente ao período em análise:

Ora, se atendermos a que na sua grande maioria os nossos seminaristas são recrutados nos meios rurais, entre classes de modestos recursos, e se considerarmos, por outro lado, a quase gratuitidade dos estudos nos seminários portugueses, poderemos salientar uma conclusão de incontestável relevo social: a igreja católica em Portugal contribui, através dos seus seminários, de forma eficaz, paru a promoção cultural de grande número de indivíduos, sem onerar os cofres do Estado.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Se nos reportarmos aos 5500 sacerdotes que actualmente trabalham na metrópole, poderemos, cum grano salis, afirmar que no período correspondente à sua formação outros 22 000 portugueses receberam nos seminários instrução secundária, ou mesmo superior.

Trata-se, Sr. Presidente, de um contributo notável, digno de ser enaltecido.

O sistema do recrutamento de vocações sacerdotais funda-se essencialmente, no nosso país, nas chamadas vocações, de infância.

Como se anota no depoimento de uma autoridade católica, seria injusto considerar o adolescente preso pelos seus desejos de criança. é natural que tal vocação venha a ser posta em dúvida e que muitos se sintam conduzidos a abandonar o seminário, por fidelidade a si próprios e ao alto conceito do sacerdócio.

Não será, pois, motivo de escândalo, nem para a Igreja nem para a nossa sociedade, profundamente influenciada pelo catolicismo, abordar nesta tribuna, na sua projecção social, um problema que interessa particularmente aos antigos seminaristas: o das equivalências oficiais, para efeito de prosseguimento de estudos, a dar às habilitações obtidas nos seminários.

Que esta questão preocupa os servidores da Igreja demonstra-o uma série de artigos que o diário católico Novidades inseriu ultimamente. Aí se transcreve, aliás, o seguinte passo da exortação Menti Nostroe, de Pio XII:

Desejamos recomendar, antes de mais, que a cultura literária e científica dos futuros sacerdotes seja, pelo menos, não inferior à dos leigos que frequentem análogos cursos de estudos. Deste modo, não sòmente será assegurada a seriedade da formação intelectual, mas ainda será facilitada a selecção dos elementos. Os seminaristas sentir-se-ão mais livres na escolha de estudo e será afastado o perigo de que, pela falta de uma suficiente preparação cultural que possa assegurar uma adaptação ao mundo, alguém se sinta do certo modo constrangido a prosseguir num ramo que não é o seu, adoptando a reflexão do administrador infiel: (Lavrar não posso, de mendigar tenho vergonha» (Luc. 16,3).

O abandono dos estudos pode ocorrer logo nos primeiros anos ou já num estado mais adiantado do curso.

No primeiro caso é de admitir que os desistentes facilmente se integrem no ambiente social donde provêm.

Já não acontece o mesmo quando a valorização cultural resultante de alguns anos de frequência dos seminários, lhes abriu perspectivas mais largas. Uma consciência de promoção social funde-se tom certa inadaptação às actividades primárias do meio de origem. Acresce, aliás, que certas pressões do ambiente circundante, ou até a desilusão dos familiares, geram situações menos amistosas, que agravam os conflitos psicológicos em que normalmente vêm a debater-se os ex-seminaristas.

Se o espírito de fraternidade cristã recomenda todo o carinho para com estes inadaptados, razões sociais justificam igualmente as melhores atenções dos Poderes Público nas facilidades que lhes possam conceder.

Importa, por um lado, evitar que o desamparo os conduza à revolta e logo os transforme em presa de certos pescadores de águas turvas. Convém, por outro, ter em conta a preparação que possuem, tornando-os elementos úteis para a vida da Nação.

Vozes: - Muito bem, muito bem!