por vezes a opinião pública, nem sempre devidamente prevenida contra tais perversões, criando mal-estar e desassossego no seio da comunidade.

É necessário, portanto, estabelecer defesas contra tais deturpações; e não há defesa mais adequada do que aquela que possa impedir situações susceptíveis de interpretações erradas. Em política, o que parece, é disse uma vez Salazar, com a reconhecida agudeza do seu pensamento. Não devemos, portanto, sujeitar-nos a que as aparências se transformem em miragens capazes de arrastar as multidões emocionais atrás de fumos e fantasmagorias de que só se vê a vacuidade quando a tragédia está consumada.

Podem estas medidas preventivas criar dificuldades operacionais em ocasiões de emergência, admito; mas a sabedoria está em escolher entre as duas faces do problema a que melhor satisfaça as necessidades do momento. K neste momento político não posso conceber divergências desinteressadas sobre qual é a solução de maior oportunidade e eficácia.

A matéria das acumulações, Sr. Presidente, está ligada também ao aspecto que já referi da justiça que impõe o chamamento à actividade política e económica do escol juvenil. Apresenta, porém, outra face que é mister olhar igualmente com cuidado e ponderação.

Os altos postos, tanto lia administração pública como na gerência económica, são sempre de molde a consumir toda a energia dos seus serventuários. Não é admissível, portanto, que possa a mesma pessoa servir eficientemente outro cargo, quanto mais múltiplos cargos. Para exercer duas funções, por vezes de natureza totalmente diferente, ou se há-de descurar os serviços da primeira ou dar à segunda um concurso meramente platónico; e para exercer mais de duas terá de se escurar o serviço de todas. Ë que a actividade humana tem limites físicos que não é permitido ultrapassar. Surgem então espontaneamente interrogações deste jaez: porque não pode um juiz, que carece da mais absoluta independência económica, acumular com o seu o mais insignificante cargo e há-de ser permitida a. acumulação a outro funcionário melhor remunerado e cuja função exige igual ou maior dispêndio de energia? Além dos inconvenientes de ordem funcional, as acumulações criam desta maneira situações de desigualdade que se tornam irritantes e conduzem a desalentos prejudiciais. Só muito excepcionalmente se podem justificar, portanto; e só devem ser autorizadas sob a condição de não perturbarem notavelmente o equilíbrio hierárquico das remunerações.

O exemplo do mal é contagioso!

Há necessidade, por isso, de dominar esta ânsia de ganhos ilimitados que o progresso material, desacompanhado de correspondente progresso moral, espalhou lias sociedades contemporâneas. Para tal efeito procuremos dignificar a vida. profligando com dureza as clamorosas exibições de sumptuosidade, em que se desperdiçam energias e riquezas, com grave dano dos sãos costumes e das virtudes ancestrais. Considere-se que não são o luxo e a ostentação que proporcionam felicidade duradoura e alegria perene, prazeres que só dá, com plena satisfação da alma, a consciência do dever cumprido na prática da missão que nos coube na efémera passagem por este inundo terreno.

Sr. Presidente: com pouca ou nenhuma convicção levantaram-se dúvidas sobre a competência desta Assembleia para estatuir um regime legal minucioso ou de execução regulamentada. Não me parece que haja necessidade de discutir esta questão, atentos os termos em que é apresentada e atenta a probidade com que se apontam razões de contrariedade suficientemente convincentes.

Parece-me necessário dizer, porém, que, havendo esta Assembleia aceitado a iniciativa do projecto de lei em discussão, decerto no entendimento de que ia ao encontro de uma reclamação imperiosa da consciência nacional, renunciando agora à sua competência e relegando a solução para o Governo faltaria às suas responsabilidades na ordem política e praticaria uma au têntica deserção, que creio bem, não estará no ânimo de ninguém desta Câmara.

Vozes:-Muito bem, muito bem

!

O Orador: - Entendo ainda ser de acentuar também que reputo nosso dever auscultar as aspirações e anseios da Nação, dever que resulta da qualidade que temos de seus directos e lídimos representantes. E porque a Nação reclama com impressionante unanimidade providências pertinentes à solução dos problemas em que se espraia este debate, estamos obrigados a ouvi-la, afrontando respeitos humanos e conveniências sociais.

Atendamos, pois, a que a Nação olha e espera.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão.

A discussão continuará na sessão de amanhã.

Está encerrada a sessão.

Eram 17 horas e 40 minutos.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Agnelo Orneias do Rego.

Alberto da Rocha Cardoso de Matos.

Américo da Costa Ramalho.

Antão Santos da Cunha.

António de Castro e Brito Meneses Soares.

Armando Cândido de Medeiros.

Avelino Teixeira da Mota.

Carlos Coelho.

Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.

Francisco José Vasques Tenreiro.

Henrique dos Santos Tenreiro.

João da Assunção da Cunha Valença.

João Pedro Neves Clara.

Joaquim de Pinho Brandão.

Jorge Pereira Jardim.

José António Ferreira Barbosa.

José Guilherme de Melo e Castro.

José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues.

Júlio Alberto da Costa Evangelista.

Manuel Cerqueira Gomes.

Manuel Maria de Lacerda de Sousa Aroso.

Manuel Nunes Fernandes.

Manuel Tarujo de Almeida.

D. Maria Irene Leite da Costa.

D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Reis.