rentes das empresas, e o mesmo não suceda relativamente àqueles que conseguem apor felizes circunstâncias alcançar na indústria altos lucros e acumular uma fortuna», nem contra um cirurgião ou advogado de talento que percebem no fim de cada ano grossas quantias de honorários.

Aceito, é claro, que a valorização e remuneração do trabalho não pode ser função de critérios meramente quantitativos, mas, ao contrário, deve depender de variadas circunstâncias, ora de significado objectivo, ora de incidência subjectiva, entre as quais avultam a sua natureza, qualificação profissional, cultural ou intelectual que exige competência e mérito do prestador de trabalho, etc. Não tenho, na realidade, a mais ligeira dúvida de que as inevitáveis diferenças de homem para homem, quer naturais, quer resultantes da diversa preparação, cultura, sentido prático, etc., não podem deixar de reflectir-se também no plano da remuneração do respectivo trabalho, sob pena de, além do mais, se aniquila r o estímulo no sentido de ser e fazer melhor, indispensável ao progresso de toda e qualquer comunidade.

Aceito, portanto, o essencial de uma das premissas postas na declaração de voto que tenho em vista.

Sucede apenas que isso nada de interesse põe ou tira para a questão de saber - e essa é que está em causa - se devem ou não ser limitadas as remunerações dos corpos gerentes das empresas, e de um modo especial das empresas com determinadas características e certos tipos de ligação com o Estado.

É que o problema implicado pela pretendida limitação não se cifra nem esgota em indagar se o melhor trabalho deve ter melhor paga, contrariamente ao que parece pressupor-se na argumentação da declaração de voto em vista, mas consiste antes em averiguar se, considerando o conjunto da riqueza e do rendimento de certa comunidade, atendendo ao grau da sua evolução económica e social, tendo em conta os níveis de vida da generalidade dos seus membros, apurados através dos vários índices utilizáveis, e designadamente através daquilo que o próprio Estado pode pagar aos seus mais categorizados servidores, olhando a um natural sentido das proporções radicado numa elementar sensibilidade moral e até num elementar bom senso, atendendo àquele mínimo de equilíbrio económico e social que, mesmo nos países menos evoluídos, já ninguém com responsabilidade e noção das realidades concebe que possa ser rompido, o problema consiste, repito, em averiguar se, tendo em conta tudo isso, e o mais que na mesma ordem de ideias pode invocar-se, e sem prejuízo de uma adequada remuneração de trabalho mais qualificado, se justifica e legitima, ou não, à luz da consciência colectiva e dos juízos éticos que informam os quadros políticos, a imposição de limites à percepção de remunerações que ultrapassam toda a noção de medida concebível adentro do condicionalismo específico da comunidade que estiver em causa.

O Sr. Carlos Moreira: - Muito bem!

O Orador: - E, posta a questão nestes termos, basta pensar naquilo que entre nós auferem como remuneração os titulares dos mais elevados cargos civis e militares, que, para serem atingidos, pressupõem indiscutível qualificação e incontestável valor, e basta atender a que somos um país em que o rendimento per capita anda à volta de 7 contos anuais, para logo se concluir que não há lógica económica, política ou social, não há dialéctica nem argumentação, não há moral, e muito menos moral cristã, que possam legitimar os «chorudíssimos» proventos que notoriamente são recebidos pelos corpos gerentes de diversas empresas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Para me não alongar demasiado, dispenso-me, pelo menos de momento, de entrar em concretizações.

Por mais aturado que tenha sido o estudo e preparação das pessoas em tais condições, por mais larga e valiosa que seja a sua experiência, por maior que seja a sua qualificação, ainda que se trate de «casos à parte», quase capazes de operarem como que novos milagres do multiplicação dos pães, dentro da relatividade de todas as coisas e neste país, que conhecemos e sabemos como vive, não podem considerar-se tais excessos como socialmente legitimáveis, nem há trabalho que os valha.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A desproporção é gritante, e mais gritante se torna quando se pensa em que para uns acumularem tão volumosas «maquias» têm outros de auferir rendimento muito inferior ao rendimento médio acima apontado.

Vozes: - Muito bem!

s respectivos exercícios sociais pela particular eficiência da acção administrativa.

Resulta do exposto que as considerações produzidas pelo Sr. Dr. Pinto Coelho, em vez de enfrentarem o verdadeiro problema posto pelo projecto, envolvem antes a sua deslocação e, portanto, o seu desvirtuamento.

Pela minha parte julgo ser não só legítimo mas absolutamente necessário, no plano social e político, que se fixe um limite às remunerações visadas pelo projecto.

Tal fixação, além de ter sido estabelecida em outros países, nos quais talvez o problema não tivesse tão acentuada acuidade, nem mesmo constitui entre nós um princípio inovador.

Efectivamente, conforme já aqui foi dito, o que nele há de essencial teve consagração no texto do Decreto-Lei n.º 26 115, tendo apenas acontecido que foi quase sistematicamente desrespeitado, e isto naturalmente pela singela razão de que foi vertido numa norma (jurídica P) meramente platónica e «coxa» por ser desacompanhada de adequada e imprescindível sanção.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E. mormente nesta matéria, é contra-indicado e ilusório confiar na boa vontade dos homens.