uma ideia que tem de ficar perfeitamente clara: é que na simples inadvertência não há qualquer sanção, qualquer medida ou punição. O que a lei geral diz é que a culpa em matéria de contravenção é sempre punida, e certamente só haverá culpa quando não tiver havido pura e simples inadvertência. Admitamos o caso de que, por erro dos sorvidos, por insuficiente preparação do pessoal ...

O Sr. Mário de Figueiredo: - Gostaria do saber se o Sr. Deputado Carlos Lima tem a mesma opinião que V. Ex.ª

O Sr. Carlos Lima: - Estou a ouvir e no fim direi qualquer coisa.

O Orador: - Se o Sr. Deputado Carlos Lima tiver a mesma opinião que eu, terei muito que me felicitar; diz-se que os espíritos formosos se encontram, e nesse caso eu seria um espírito formoso.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Quando estas divergências ocorrem entre juristas, pois o Sr. Deputado Tarujo de Almeida também é jurista, o que não será a perturbação no ambiente daqueles que o não são ...

O Orador: -V. Ex.ª Sr. Deputado Mário de Figueiredo, é um grande mestre em direito. E neste ponto creio que não pode haver dúvida nenhuma. A punição resulta da culpa e a inadvertência para a qual se não concorre é a ausência de culpa.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Então a simples inadvertência não é punível ...

O Orador: - Ora vejamos: quando surge a punição? Quando houve, pelo menos, culpa. Eu quero aqui perguntar: a punição será então demasiadamente severa? Sem dúvida nenhuma que nesta parte, em que se impede o exercício de funções em cargos directivos, a sanção é austera, é pesada, mas temos de pôr o problema desta forma: as razões que ditaram esto diploma que estamos a discutir são razões de interesse e ordem pública, o a tradição legislativa portuguesa, nesta matéria em que está em jogo a economia nacional, designadamente em toda aquela família dos delitos antieconómicos que tanto têm preocupado a nossa acção judiciária, é precisamente a da severidade punitiva. Ou as medidas são intimidativas, ou os diplomas ficam letra morta.

O Sr. Carlos Moreira: - Há uma coisa superior à economia, que é a moral nacional.

O Orador: - Toda a escala de sanções para delitos antieconómicos é muito mais grave que aquela que se propõe.

O Sr. Proença Duarte: - V. Ex.ª sabe bem que o excessivo rigor estabelecido nas leis antieconómicas levou por vezes os tribunais a absolver, por considerarem rigorosa em excesso a penalidade para casos que, estando na letra da lei, não estariam no espírito do legislador.

Ora pretende-se que esta Câmara diga qual a interpretação de uma e outra propostas, para que os tribunais possam, na consulta das actas desta Assembleia, fazer a interpretação da lei.

O Orador: - Em todo o caso, durante os anos da guerra, foi o medo que guardou a vinha: a severidade da lei foi útil. Efectivamente, se não houver sanção, como já se disse aqui, valerá a pena sempre jogar.

O Sr. Proença Duarte: - Para os desonestos, esses seriam abrangidos pelo dolo e pela má fé.

O Orador: - Exacto! Para os desonestos; e para esses não vejo que as sanções sejam pesadas, além do que é justo e conveniente.

O Sr. Carlos Lima: - Sr. Presidente: peço a palavra para encerrar a discussão.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Carlos Lima, em nome dos signatário:- da proposta de substituição e do artigo 3.º do projecto de lei, deseja usar da faculdade regimental de encerrar o debate. Portanto, se mais nenhum Sr. Deputado deseja fazer uso da palavra, vou dar a palavra ao Sr. Deputado Carlos Lima, para encerrar o debate.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Tem a, palavra o Sr. Deputado Carlos Lima.

O Sr. Carlos Lima: - Sr. Presidente: um apontamento, para finalizar.

Acaba de observar o Sr. Deputado Proença Duarte que a experiência nos ensina que as penas excessivas podem levar os tribunais a fugir à aplicação dessas sanções. Neste caso, não vejo que sejam excessivas, as penas previstas, tendo designadamente em conta as possibilidades daqueles que eventualmente podem ter que suportá-las. Isto, mesmo sem entrar a discutir se o reparo tem ou não base.

O Sr. Proença Duarte: - Pergunto se na proposta do Sr. Engenheiro Camilo de Mendonça V. Ex.ª considera toda e qualquer espécie de infracção ...

O Orador: - A infracção penal, como V. Ex.ª sabe, é uma espécie que comporta duas subespécies, que são o crime e a contravenção.

Dentro da orientação das propostas, as infracções previstas devem classificar-se como contravenções.

Porém, como já acentuei mais de uma vez, tais infracções são puníveis, quer na forma dolosa, quer na culposa.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Observo apenas o seguinte: qual é a posição de V. Ex.ª sobre este problema? Quando um administrador, por simples culpa, por inadvertência, por negligência, recebe mais do que devia, aplica-se-lhe ou não esta sanção: não pode continuar a ser administrador de nenhuma empresa durante cinco anos?

O Orador: - Já respondi a essa pergunta e fi-lo no sentido afirmativo.

Como, porém, também já disse, para que haja infracção, e, portanto, punição, é preciso que se verifiquem, pelo menos, os requisitos da culpa.

O Sr. Dr. Tarujo de Almeida, de quem sou muito amigo, insistiu muito em que a referida inibição de exercer funções de administração implica uma verdadeira «morte civil ».

Sobre isto direi que a inibição temporária para administrar só pode considerar-se como «morte civil» para aqueles que «viverem para ser administradores», pois, para além disso, ficam-lhes abertas todas as demais actividades.