justificar-se, por exemplo, a anexação do Alasca Americano pelo Canadá ou pela Rússia, a das Guianas pelo Brasil ou pela Venezuela, a da Irlanda do Norte pelo Eire, a do Gibraltar Britânico pela Espanha (ainda que, neste último caso, devam ter-se em conta os direitos gritantes da história).

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Não analisarei igualmente o lado histórico - que o Estado da índia é português há 450 anos e a União Indiana, ao lado dele, faz figura de arrivista, com a arrogante audácia da sua pouco mais de uma dúzia de anos. Tão-pouco recordarei eventuais resquícios, na alma racista do Sr. Nehru, da negregada teoria do espaço vital -, que os 400 milhões de habitantes da União Indiana em nada podem ajudar a satisfazer a sua fome com os minúsculos 3500 quilómetros quadrados de Goa, Damão e Diu u nem deles carece, naquela área enorme com que a dotou a liberalização britânica, para enterrar os seus milhares d u mortos de miséria, epidemias, insalubridade.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Quanto a exigências de defesa militar, nem a audácia afirmativa do Sr. Nehru seria capaz de supor que alguém no Mundo acreditaria nelas. Por sua vez, a errada inclusão daquela nossa província ultramarina nos territórios pela O. N. U. denominados «não autónomos» - e digo errada porque os nativos são cidadãos de pleno direito, ascendendo, em perfeita igualdade com todos os portugueses, à burocracia, ao magistério nos seus vários ramos, aos diferentes graus d n hierarquia militar, à magistratura e às funções políticas, ao mesmo tempo que desfrutam, ou desfrutavam, de um nível médio de vida superior ao dos seus vizinhos da União Indiana -, essa tese, repito, levaria a exigir não a anexação, mas a autonomia (que já era existente) através do uso do chamado princípio de autodeterminação, que o Sr. Nehru de antemão sabia ser-lhe inteiramente desfavorável. Não lhe foi, sequer, possível invocar simples pretextos, por mais que os resbucasse ou tentasse forjá-los, porque a nossa reflectida paciência e a nossa prudente política impediram-no de os encontrar, de modo que a União Indiana teve de comportar-se, à face do Mundo, como o velho lobo da fábula perante o cordeiro..

Mas, se não vale a pena demorar-me a analisar as falsidades do verbalismo lupino do Sr. Nehru, nem por isso será demasiado secundar com. aplauso a justa classificação que o Sr. Presidente do Conselho fez da agressão indiana, concebida na alma cínica e hipócrita do pândita, segundo a expressão de um comentador estrangeiro.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Onde está, na verdade, o apóstolo da coexistência pacífica e da não violência! Onde está o melífluo discípulo de Gandhi, com as suas falaciosas blandícias?!

A brutal agressão contra Goa, Damão e Diu é um autêntico acto de roubo e a mais rotunda negação de todos os princípios morais de que se fazia evangelizador, de todos os valores jurídicos de que se dizia pregoeiro, de todo o pacifismo de que se mostrava doutrinador.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Postas a nu as falsidades da sua alma, dele resta apenas, como já se escreveu, uma triste caricatura.

Acentuei, há pouco, que o seu procedimento se identificava com o do lobo diante do cordeiro. Já assim o definira o Sr. Presidente do Conselho em oportuna entrevista ao Figuro. Um autorizado comentador internacional, seguindo naturalmente a mesma esteira, equipara-o ao «peixe maior que devora outro mais pequeno», acrescentando que, quando a China, peixe mais grosso, atacar ao longo da linha Mac Mahon, ouviremos os «gemidos indianos» - que então, legitimamente, «não poderão encontrar eco no Mundo».

No fundo, Sr. Presidente, a agressão da União Indiana, perpetrada nas antevésperas de eleições gerais naquele país e como uma espécie de neto pré-eleitoral, quando do outro lado da fronteira se desenha fortemente a ameaça da China, não foi apenas em seu benefício, mas também no da União Soviética, sempre desejosa de perturbar a paz no Mundo e de criar complicações por toda a parte, em permanente desfavor do Ocidente.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O apoio decidido da Rússia, que tinha então o seu Presidente em visita oficial a Nova Deli, explica a completa inutilidade das iniciativas inglesa e americana, junto do Sr. Nehru, no sentido da desistência da agressão. Londres e Washington, como já é tristementes habitual, foram vencidas diante de Moscovo!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Portugal apelou para o falsamente chamado Conselho de Segurança da O. N. U. Como muito bem acentua a comunicação governamental, era politicamente indispensável este apelo, embora de anfemão houvesse a certeza da sua inteira inutilidade prática. E, na verdade, como se esperava, a Rússia, pelo seu veto, paralisou a acção da O. N. U., impedindo o prosseguimento da proposta de resolução, apoiada pela esmagadora maioria dos membros do Conselho, no sentido de se censurar a agressão da União Indiana e de se reclamar a cessação das hostilidades.

Uma vez mais a O. N. U. se mostrou impotente e também uma vez mais se verificou penosamente a cedência da Inglaterra e da América diante da Rússia e do apoio decidido por ela prestado a outra potência. Conforme a justa observação de um avisado comentador, «a O. N. U. já tinha perdido a vergonha» (se alguma vez a possuiu !) ...

Vozes: - Muito bem!