O odioso que traz consigo a obrigatoriedade opõe-se tenazmente à simpática voluntariedade. Em principio, todos nos sentimos diminuídos nas nossas liberdades quando nos aparecem disposições legais que não permitem usar e dispor, a nosso contento, daquilo que nos pertence.

No entanto, quando os interesses se desprendem do campo individual para pesarem no plano nacional, surge a justificação do condicionalismo imposto por aqueles a quem incumbe zelar pelos superiores e generalizados interesses nacionais.

Vozes: -Muito bem, muito bem!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E daí, talvez, o projecto de lei governamental sobre o emparcelamento dar nos proprietários todas as facilidades de se fazerem ouvir e pontificarem na defesa dos seus próprios interesses. Assim, os trabalhos que hão-de conduzir ao emparcelamento serão iniciados com uma campanha esclarecedora das populações, que se fará acompanhar de um inquérito, através do qual se avaliará do ambiente económico-social, das vantagens resultantes das operações a realizar, da delimitação da zona a emparcelar e das obras de interesse colectivo a executar.

Estabelece-se depois no artigo 2.º do projecto de lei, segundo a redacção aconselhada pela Câmara Corporativa, que, em face dos resultados dos primeiros estudos, o Secretário de Estado da Agricultura podem ordenar a elaboração do anteprojecto.

Reparem VV. Ex.ªs na expressão «poderá ordenar». Quer dizer que a possível relutância dos proprietários começa logo nesta fase a ser devidamente ponderada, a ponto de poder fazer com que a elaboração do anteprojecto não seja ordenada, morrendo logo à nascença o propósito do emparcelamento da zona sujeita, a estudos. Mas, se tal não acontecer, passa-se à fase da elaboração do anteprojecto, na qual, segundo o disposto no artigo 23.º, poderão os proprietários voltar a ser ouvidos para esclarecimentos. Esta a segunda possibilidade dada aos proprietários interessados de colaborarem na elaboração dos respectivos estudos.

Concluído o anteprojecto, conforme o artigo 24.º, pela terceira vez não chamados os interessados para a apreciarem e deduzirem as reclamações que tiverem por convenientes. Estas reclamações serão decididas pelas comissões locais de recomposição predial, mas o cuidado posto na defesa dos interesses particulares volta a impor o chamamento dos proprietários, agora pela quarta vez, concedendo-lhes recursos daquelas decisões para os tribunais arbitrais. E, se estes derem provimento ao recurso, o anteprojecto será corrigido em conformidade, sendo de novo submetido à apreciação dos interessados.

No entanto, antes de passar a projecto, novamente os proprietários, agora pela última vez, são ouvidos sobre a sua aprovação, para a qual se exige o voto favorável da maioria, com maioria do rendimento colectável. Se o projecto é aprovado, dar-se-á início às operações de emparcelamento.

e não é aprovado por aquela maioria, ali estacionará sem passar à fase da execução.

Esta é a regra geral constante do projecto do texto legal, que, como se deixa ver, é somente influenciada pelo princípio da voluntariedade.

Em que consiste então o que de coercivo contém o projecto governamental?

Numa simples excepção, que, por ser excepção, logo nos elucida das reduzidas possibilidades da sua aplicabilidade.

Realmente, o artigo 26.º, com a redacção constante da base XXVI da proposta de alteração do Governo, deixa ver que a imposição só poderá verificar-se nos casos em que a execução do emparcelamento permita eliminar graves inconvenientes de ordem económica e social.

Não basta, pois, que o emparcelamento venha a eliminar inconvenientes de ordem económica e social. É preciso que esses inconvenientes sejam graves.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E uma vez verificada a sua gravidade, isso não implica que necessariamente o Governo imponha a execução das operações de emparcelamento. A referida base XXVI não cria um direito de aplicação obrigatória por parte do Governo, apenas lhe concede uma faculdade. Já a expressão usada no texto original do projecto de lei dizia: «poderá impô-la», e não: «impô-la-á». O que quer dizer que, apesar de os inconvenientes serem graves, pode o Governo, era atenção a motivos atendíveis, não impor o emparcelamento, podendo esses motivos circunscrever-se à oposição doa proprietários.

Agora na aludida base XXVI fala-se em apreciação do Conselho de Ministros, da qual resultará a imposição ou a morte do projecto. As voltas a dar são as mesmas, pelo que delas há a esperar resultados semelhantes.

A isto se resume o quase nada de coercivo, que perde ainda muito do sen já diminuto valor quando se não entrega ao juízo de um homem só, mas ao próprio Conselho de Ministros na s ua apreciação, a competência para avaliar da gravidade dos inconvenientes e da atendibilidade dos motivos que contra-indicam a imposição do emparcelamento.

Creio que a ninguém passará pela mente, nesta Assembleia ou fora dela, conceder aos proprietários, como juizes em causa própria, o poder de apreciação da gravidade resultante da sua própria rejeição do anteprojecto.

De igual modo se não invoquem as repercussões de ordem político-social que possa causar o remoto e longínquo poder de imposição das operações de emparcelamento.

A ninguém mais que ao Governo incumbe zelar e ter na devida atenção o efeito dessas possíveis repercussões. E apesar de tais cuidados, que o Governo não