10$ por dia é menos de metade do salário de um trabalhador agrícola.

Façamos votos no sentido de que todas estas questões, e tantas outras mais, venham resolvidas no novo estatuto, até para prestígio da justiça.

Sr. Presidente: as considerações constantes desta intervenção não têm outro objectivo que não seja o de contribuir para corrigir o que está mal e aperfeiçoar o que já está bem, se possível for.

São o produto do contacto directo' de vários anos com os problemas, e que muito facilmente escapam ao legislador mais prevenido.

Termino-as dirigindo a S. Ex.ª o Ministro da Justiça, Prof. João de Matos Antunes Varela, de quem tive a honra de ser condiscípulo, as minhas respeitosas e amigas saudações.

Mais do que isso, o meu agradecimento de homem dos tribunais e de português pela obra de cunho verdadeiramente nacional que vem realizando na sua pasta, no sentido de dotar o Paia com diplomas legais actualizados, enriquecendo, desta forma, o nosso património jurídico.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se a

O Sr. Presidente: - Continua em discussão na generalidade a proposta de lei relativa às providências destinadas a assegurar o funcionamento dos órgãos de governo do Estado da Índia.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Pires.

O Sr. José Manuel Pires: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: eu não subiria hoje os degraus desta tribuna se não fora pelo nosso Estado da índia que iniciei, já lá vão quase duas dezenas de anos, a minha vida de funcionário ultramarino, como professor do seu Liceu Nacional Afonso de Albuquerque. Não é, pois, meu intento discutir a proposta de lei do Governo,- à qual dou o meu voto incondicional. Adias, já os Srs. Deputados juristas desta Câmara o fizeram com raro brilho. Quero apenas chamar a atenção da Câmara para o alto significado moral, cultural e histórico da nossa presença em Goa.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Ali aprendi, nas ruínas eloquentes de um passado de glória, a compreender e a sentir, entranhadamente, toda a majestade épica da arte, da historiografia, da ciência e da literatura da era gigante dos Descobrimentos e Conquistas.

Na verdade, renegar Goa é rasgar as páginas de ouro do que há de mais belo na historiografia de Quinhentos (nas Lendas da índia, de Gaspar Correia; nas «Décadas» de Barros; no Soldado Prático, de Diogo do Couto); é ultrajar o poema da Raça, o nosso maior contributo ao humanismo renascentista; é aniquilar, a golpes de camartelo, essa incomparável, jóia de arte manuelina que é o Mosteiro dos Jerónimos, perfeitos «Lusíadas de pedra lavrada», e que sintetizam o génio artístico de um povo de heróis e de santos, que «deu novos mundos ao Mundo; ...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - ... é vilipendiar obras de ciência que fizeram o assombro do tempo, como os três Roteiros, de D. João de Castro, misto de herói e de humanista de garra; os Colóquios dos Simples e das Drogas, de Garcia de Orta; o Esmeraldo do situ orbis, do quase lendário Duarte Pacheco Pereira; é apostatar ante o espiritualismo cristão de S. Francisco de Xavier, semeador de cristandades florescentes até aos confins da Ásia misteriosa. Por isso Goa ocupa lugar inconfundível na vida da grei. E sejam quais forem as surpresas desagradáveis que o futuro nos reserve, ninguém, à força do canhão, ou pelos imperativos da lei da selva, poderá destruir esta obra eterna de espiritualismo lusíada, que marcou bem fundo a aluía da comunidade goesa.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Goa foi, durante a gestão heróica de Quinhentos, a arena adusta em que se retemperava a alma dos heróis portugueses, no crisol da honra e do pundonor.

Todos os paladinos do nosso século de ouro ali aprenderam a brandir a lâmina nua da sua espada de fogo, ao sol da glória, sem nunca virarem a cara à adversidade. Por isso Goa é parte integrante do património cultural, moral e histórico do Portugal descobridor e civilizador de povos.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: o ambiente político da hora presente é de um dramatismo sem par na história do Mundo. Pô-lo bem em evidência o notável discurso histórico do Sr. Presidente do Conselho a esta Câmara, o qual deveria ser atentamente meditado pelos chamados grandes do Mundo. Este pobre planeta arde, em labaredas altas, porque os leaders da política internacional do nosso tempo perderam a perfeita noção da dignidade humana. Falta-lhes coerência de princípios, seriedade de conduta e, o que é bem mais grave, o respeito pelos direitos mais elementares do semelhante. Por isso o Mando arde, num mortífero incêndio de revolta e sangue, que ameaça subverter todo o património cultural e moral da humanidade carreado, penosamente, ao longo dos séculos. Basta abrir os olhos para o panorama degradante da política internacional contemporânea. De um lado, a desoladora inexperiência político-social dos potentados do dólar, a quem falta, ainda, uma sólida sedimentação mental que os povos europeus foram aprendendo, penosamente, no longo transcurso dos séculos. Falta-lhes, em suma, uma Idade Média. Por isso passaram do carro de bois ao avião de propulsão por jacto e aos mísseis interplanetários. Do outro lado, a rigidez petrificada do despotismo soviético, que o chamado Ocidente livre tem deixado tripudiar à solta, fazendo sangrento colonialismo na Europa do Leste, e armando-se em arauto do anticolonialismo dos povos afro-asiáticos; e tudo isto, Srs. Deputados, a coberto do manto protector daquele hilariante areópago internacional da O. N. U.

Ah!, meus senhores, como é consolador deparar neste ambiente saturado de deserções morais, políticas e di-