Lícito será perguntar se nós, os da velha Universidade dionisiana, os de Paris e Bolonha, os do Oxford e de Cambridge, os do Salamanca o Alcalá e de Heidelberg e Upsala, leremos do enviar os nossos filhos a estudar novos direitos das gentes a Mogadoxo ou Conacry.

Que novas e poderosas sínteses deixarão a perder de vista, as construções do pensamento europeu? Talvez um dia a vitória, suprema, se alcance quando for "moralmente" possível incluir o Sahti ou um canibalismo moderado na futura declaração dos direitos do homem afro-asiático.

É certo que a tradição cultural africana tem em Santo Agostinho um dos mais altos cumes da inteligência humana. Não consta, porém, que os modernos dirigentes do nacionalismo africano pretendam edificar a Cidade de Deus, preferindo talvez ir buscar a Cartago a sua fonte de inspiração. Outros, mais progressivos, respeitarão uma certa modalidade de tradição cristã, tentando rasgar na selva e no deserto, entre chuvas tropicais e poentes flamejantes, as gélidas planuras espirituais de um novo Paraguai, de inspiração baptista.

Sr. Presidente: há-de o mundo ocidental reconhecer um dia que o nosso esforço de boje se dirige não só à defesa, do solar herdado, como à dos próprios princípios da civilização que nos formou. Eu sei que as civilizações crescem e morrem e já lá vai o tempo em que Ocidente e Civilização se identificavam no espírito dos homens. Entre umas e outras há-de sempre ser possível um entendimento, porque todas assentam num substrato moral que é a marca específica do humano. Cada uma delas, porém, pode abreviar por culpa própria o ciclo orgânico da sua existência histórica. Quanto as culturas, quantos regimes, se não extinguiram, corroídos de vícios internos e dissociados dos elementos vitais que lhes deram o ser e a força! Eis o motivo por que a cada geração cumpre velar para que o vício não alastre, o abuso seja castigado, as exigências natural e espirituais do homem respeitadas, o instinto eternamente rebelde da cupidez submetido à mais férrea disciplina social.

Cada geração é um elo na cadeia vital que prolonga e transmite a centelha de espirito que no início recebeu; mas é também um mundo em si, com a responsabilidade indeclinável do seu próprio destino e salvação. Nenhuma geração está mais longe ou mais perto, disse Ranke, porque todas elas são equidistantes da eternidade.

Deus julga as nações através da história, e os portugueses não constituem excepção. Pondo de parte as ilusões farisaicas de alguns, compenetremo-nos da estrita obrigação moral que nos incumbe de nos purificarmos no espírito, pelo espírito e para o espírito, de tal modo que os futuros portugueses possam proclamar a autenticidade sacral do holocausto que neste momento exigimos aos que por Portugal se batem e morrem no Portugal de além-mar.

Pagaram já o seu tributo os valorosos colonos que primeiro acorreram em defesa da terra e dos lares. Pagou e duramente o Exército em alguns dos seus melhores elementos, desde os altos comandos até aos cadetes heróicos e ao soldadinho raso.

Seja-me permitido. Sr. Presidente, prestar aqui a minha homenagem emocionada a essa magnífica e heróica juventude!

Vozes: - Muito bem!

Vibrantes aplausos.

O Orador: - Colhida de surpresa, soube arrancar à maravilhosa ancestralidade a capacidade de adaptação, o ânimo intemerato, o engenho improvisador, que ao desafio das hordas bárbaras e de um mundo hostil deram a retumbante resposta com uma vitória rápida e final!

Perante essa juventude que se deu integralmente e constitui a certa certeza de que amanhã plantaremos na esperança e na fé o jardim da abundância lusitana, todos nós tomos responsabilidades que esta Assembleia não quererá enjeitar.

À faina diária dos comandos, o penoso esforço dos diplomatas, a obscura laboriosidade dos administradores, as preocupações esmagadoras dos governantes, tudo isso, que é muito, e tudo digno do mais incondicional louvor, há-de executar-se para essa juventude, há-de alimentar-se do seu optimismo milagroso, que é um dos mais sólidos alicerces do futuro português.

Sr. Presidente: disse V. Ex.ª que o resultado da eleição há pouco realizada exprime, sobretudo, o mandato imperativo da defesa da honra e da integridade da Nação. E eu sei que, na plena consciência desse mandato, nunca interpretarei melhor o sentir da representação nacional que inicia a sua actividade do que no momento em que, em seu nome, ofereço a V. Ex.ª e ao Governo a mais decidida e pronta colaboração.

Esta Assembleia quer ser a imagem da unidade moral da Nação e tem a peito não só a defesa das terras e dos bens, mas a dos princípios da própria civilização.

Todos aqui são portugueses de lei, capazes de afrontar as mais graves decisões a prol do comum. Todos sentem a certeza de que não encontrariam comando mais firme e esclarecido do que o de V. Ex.ª e o do Governo da Nação.

Renovadas nos seus quadros e fortalecidas com um inequívoco mandato popular, a Assembleia Nacional e a Câmara Corporativa saúdam todo o mundo português e iniciam os seus trabalhos numa atitude de decidida firmeza e inquebrantável fé nos destinos de Portugal. Assim Deus, cujos Evangelhos levámos aos confins do Mundo e a quem nesta hora humildemente invocamos, nos queira acompanhar com a Sua protecção.

O orador foi muito ocasionado.

Terminado o discurso do Sr. Deputado António Augusto Gonçalves Rodrigues, o Sr. Presidente da Assembleia Nacional disse:

Em nome de S. Ex.ª o Presidente da República, declaro inaugurada a VIII Legislatura da Assembleia Nacional e da Câmara Corporativa. E, ainda em nome de S. Ex.ª declaro encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 20 minutos.