O Sr. Deputado Vítor Barros ainda pretende calar a voz do Governo insinuando-lhe, infundadamente, falta de «humildade cristã», esquecendo que o cristianismo nunca poderá ficar silencioso perante os crimes cometidos, sacerdotes mortos, missões destruídas, lares desfeitos, crianças massacradas e todo esse macabro cortejo de horrores que são do conhecimento de toda a gente.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - A humildade e a caridade não rejeitam, antes se conciliam com a justiça, e esta manda punir os delinquentes, os bandidos e os traidores.

A política ultramarina portuguesa, Sr. Deputado Vítor Burros, não está errada, pois os nossos soldados batem-se e morrem heroicamente em Angola, defendendo, em rasgos de estoicismo, os princípios da civilização ocidental e cristã.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - E as nações que desprezam esses princípios civilizadores, mais cedo ou mais tarde, precipitam-se nus barrancos da mais trágica derrocada.

Já Jorge Washington, que foi o caudilho da independência norte-americana, afirmou que a religião e a moral são as escoras indispensáveis de toda a prosperidade. E quem procurasse derrubar um destes pilares da felicidade humana nunca poderia chamar-se patriota.

Como Clemenceau, que, sintetizando as teses demagógicas do seu tempo, afirmou que «Ia révolution c'est un bloc», também nós poderemos dizer que essas doutrinas subversivas que atacam a integridade da Pátria são um «bloco» de torpezas, de mentiras e de hipocrisias que, amanhã, serão severamente julgadas no pretório da história.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Pode o orgulho erguer, momentaneamente, os seus autores às culminâncias sociais, porque o tempo, iluminado pela luz da razão, acabará por escondê-los no silêncio inevitável e no tétrico esquecimento dos mausoléus. A posteridade há-de escarnecer a ficção insubsistente da sua grandeza.

Há homens - já o disse em tempos idos, nesta Câmara, o grande parlamentar José Estêvão -, há homens que, vistos à luz da sua vaidade, parecem uns colossos; mas, vistos à luz das suas ideias, nem a vista mais penetrante é capaz de os enxergar.

Sr. Presidente: perante a solene austeridade desta Câmara, tão cheia de responsabilidades como reluzente de tradições, formulo contra o discurso do Sr. Deputado Vítor Barros o protesto da mais veemente reprovação.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Pinheiro da Silva: - Sr. Presidente: é-me impossível expressar tudo quanto me vai na alma. Todavia, farei umas breves considerações, que me foram inspiradas pelo que afirmou várias vezes o orador e ainda por outras asserções que dele ouvi e li no Diário das Sessões. Farei depois uma série de perguntas, que suponho inserirem questões que para mim e para muitos constituem algo bastante preocupante.

Sr. Presidente: esta Câmara é legislativa, mas é também uma Câmara política, mas de política portuguesa, de política nacional, e este carácter impõe e implica que todos nós, seus membros, tenhamos o máximo cuidado nas afirmações que façamos.

Vozes: - Muito bem!

esquecer-se de tudo quanto devem no Governo de Salazar por tantas dezenas de anos, a tranquilidade, a paz e o progresso em que toda a sua vida pôde mover-se, o que, afinal, justifica o estarem aqui muitos deles, escorreitos de alma e corpo ... Por que razão é que um ultramarino branco ousa fazer afirmações antinacionais nesta Casa e o mesmo não fazem pretos e mestiços?

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Por que razão um europeu nascido na maior província de Portugal vem aqui afirmar que é português e em prol de Portugal trabalha, quando, a um tempo, só lhe ouvimos asserções que, no fundo, o filiam nas correntes de pensamento antinacionais?

Seremos obrigados, acaso, a crer no inacreditável? Nesta hora em que periga a' nossa existência de povo soberano, haverá quem venha a esta Câmara para condenar, mentir? Haverá quem aqui venha com lições ensinadas? Haverá quem aqui se apresente no intuito de fazer política antinacional? São meras perguntas, Sr. Presidente, mas que encerram questões gravíssimas, que devem ser solucionadas por quem faz afirmações que a todos nós feriram - que feriram o brio nacional.

Tenho dito.

O Sr. Sousa Meneses: - A Câmara ouviu com emoção e com surpresa as palavras do Sr: Deputado Vítor Barros. Comentários devidos e apropriados já foram feitos pelos nossos ilustres colegas Pinto Carneiro e Pinheiro da Silva e, portanto, restar-me-á apenas fazer um comentário muito breve mas muito sincero, e sobretudo muito português, àquilo que o Sr. Deputado Vítor Barros chamou acto de força e paz armada.

Paz armada!? Vamos talvez melhor pelo método do absurdo, paz desarmada para que o matassem a si e aos seus filhos pela única razão de ser branco?

Vozes: -Muito bem, muito bem!