Mas tanto não parece ser o suficiente, e a lei ficará imperfeita se não mandar o tribunal julgar das benfeitorias à luz da sua compatibilidade com a razoável economia da exploração, e se não estabelecer na proporção das rendas algum limite às importâncias que as indemnizações por benfeitorias possam atingir. Seja esta proporção moderada, sem ser paralisante, e os rendeiros saberão ser comedidos nos processos que desencadeiem contra vontade dos proprietários. Que nos outros, nos casos de mútuo acordo, fica ainda larguíssimo campo aberto a utilíssima obra!

Vistas estas duas facetas salientes da proposta - limitação dos prazos mínimos de arrendamento e benfeitorias -, o espírito não sintonizado para as problemáticas da litigação pode ainda deter-se, curioso e inquieto, sobre a cláusula introdutória do direito ao perdão de renda. Perdão desde sempre praticado pelos bons senhorios, porventura com mais garantias de equidade no seu humano juízo do que qualquer rígido articulad o, ele tomará agora corpo na legislação, mas por minha parte creio que desta vez, excepcionalmente, não é de felicitar a Câmara Corporativa pelo jeito que na matéria deu à primitiva proposta governamental.

Com efeito, esta fazia depender a redução da renda do jogo de circunstâncias imprevisíveis e de força maior, exemplificando-as de modo claro, enquanto à Câmara Corporativa basta a ocorrência de causa não imputável a qualquer das partes. A diferença parece-me substancialíssima, visto que a segunda redacção abrange evidentemente aquilo que para simplificar podemos chamar maus anos agrícolas, pois não há dúvidas de que pelo simples efeito de excessos ou insuficiências climáticas, que não chegam a ser acidentes meteorológicos de natureza excepcional, pode a produção perder-se em mais de metade.

De causa imprevisível a causa simplesmente não imputável a qualquer das partes vai grande distância, precisamente a bastante, repito, para abranger os muito maus anos Não, e tanto assim é também que a mesma Câmara Corporativa nos cita, sem discordância, a legislação italiana, segundo a qual, diz, o arrendatário pode pedir a redução da renda, salvo se a perda tiver compensação nas colheitas seguintes, para o que a redução é fixada no fim do prazo do arrendamento.

O Sr. Gonçalves Rapazote: - Muito bem!

O Orador: - Anos anteriores, anos seguintes, a noção que ressalta é a da renda como valor médio da produção estimada e dos perdões referidos à produção média verificada. Mas a verificada só até ao ano mau (que pode aliás ser logo o primeiro!), ou em toda a duração do arrendamento, que a seguir pode ser uma sucessão de anos bons?

A equidade manda, acho eu, que nos inclinemos para o segundo critério; e a probabilidade leva a esperar que no decurso de um mínimo de seis anos os dois valores se equilibrem.

Destarte, o perdão da renda, sendo os contratos plurianuais, fixar-se-ia decerto mais justamente, e com menor probabilidade de questões, segundo a base proposta pelo Governo do que segundo a redacção da Câmara Corporativa. Esta demorou-se de mais a discutir se certos casos são de força maior ou fortuitos e esqueceu, quer a boa doutrina, a que atrás tinha aderido, de dever a causa da perda ser de força maior e imprevisível, quer o bom exemplo do legislador italiano reportando à duração de todo o arrendamento o cálculo da incidência das perdas.

Toda uma destacada parte da proposta visa os arrendamentos familiares, que melhor fora chamar arrendamentos a cultivadores directos, mas convém observar como diferem as noções em torno deste conceito, segundo as procuremos na proposta do, Governo, no contraprojecto da Câmara Corporativa, nas declarações de voto que ao mesmo parecer opuseram dois dignos Procuradores e, por fim, na proposta governamental de alteração ao texto daquela Câmara.

Surgem-nos nestas diversas construções intelectuais nada menos do que três tipos distintos de cultivadores directos em regime de arrendamento rural:

a) Os que exploram em assistência assídua, e com suficiente preparação profissional, ajudados pelas suas famílias e com raro auxílio externo - não mais de um terço das necessidades totais da exploração, é o critério expresso - unidades económicas dando rendimento que lhes permita manterem-se em conveniente nível de vida;

b) Os titulares de arrendamentos a longo prazo, tomados para colonização de incultos, e continuados por vezes já até à segunda e terceira geração;

c) Todos os demais pequenos rendeiros cultivando as terras por braço próprio ou de seus familiares, incluindo os de pequenas explorações meramente complementares da economia doméstica.

A distinção entre a primeira e a terceira destas categorias é relativamente subtil de uma para a outra, podendo conceber-se infinitas cambiantes, de modo que difícil será na prática estabelecer fronteiras nítidas; mas em teoria ela é devida à face das várias concepções em causa, como muito bem nota, em aguda observação, o digno Procurador Francisco Pereira de Moura. Também será difícil a distinção entre aquela primeira categoria e a do puro patronato, quando se trate de cultivadores que, trabalhando eles próprios pessoalmente a terra, se façam todavia acompanhar, lado a lado, por não terem família que os ajud e ou já a poderem poupar às rudes lidas do campo, de colaboradores assalariados.

Onde param uns e começam outros? Problemas que na prática se hão-de pôr muitas vezes, sem soluções fáceis ou nítidas, lembrá-los deve fazer-se para não deixar esquecer a complexidade destas questões.