Foi por isto, pois, que apresentámos a nossa proposta, pois é necessário uma maior protecção a esses arrendatários, e eis a razão por que propusemos o prazo de 180 dias e, quando o arrendamento tiver durado mais de 10 anos, o prazo de 1 ano de aviso, o qual não nos parece tempo de mais.

Não precisava de dar exemplos, mas sempre quero citar um que há pouco me foi dito: um inquilino que tinha umas largas centenas de cabeças de gado, como rendeiro, mercê do capricho ou razões do senhorio viu-se obrigado a desfazer-se desse gado no prazo de 60 dias. Ora isto não está certo.

O Sr. Soares da Fonseca: - Seria um cultivador directo? Parece-me impossível que um cultivador directo tenha centenas de cabeças de gado.

O Orador: - Não sei, mas as circunstâncias mudaram muito.

E parece-me serem estas as justificações que devia apresentar.

O Sr. Belchior da Costa: - Apoio, em absoluto, as considerações de V. Exa., por achar que elas têm um extraordinário bom senso e são de uma grande justiça.

O Orador: - Muito obrigado a V. Exa.

Tenho dito.

O Sr. Pinto de Mesquita: - Sr. Presidente: dou a minha aprovação à proposta do Sr. Soares da Fonseca.

Retirei a minha proposta de aditamento, quanto a serviços clausulados nos arrendamentos, de um número à base XIII precisamente em favor do aditamento no mesmo sentido proposto pelo Sr. Deputado Abranches de Soveral, circunscrito ao caso de unidades agrícolas familiares exploradas por agricultor directo.

Já quando da discussão da base XIII assaz me alarguei na defesa da manutenção dos serviços a prestar, geralmente consignados nos títulos de arrendamento, e quando não que são de uso e costume, em regime de reciprocidade. Isto é muito frequente também quando um senhorio tem várias quintas vizinhas arrendadas sob o dito regime, arrendamento comportando aspectos importantes de parceria, particularmente para o vinho e o azeite.

As razões então por mim expostas justificam bem a não proibição de tais cláusulas, que nada têm, como se lhes assaca, de remanescentes dos chamados direitos banais do feudalismo.

Basta o seu carácter de reciprocidade ou simbiose para mostrar que outra coisa não são mais do que a consagração de útil, por vezes indispensável forma de se obter mão-de-obra para tarefas urgentes.

Esta forma de serviços entra mas é na tradição comunitária da nossa agricultura. Neste diploma temos consagrado alguns princípios de marca do sentido social, tal como o conceito de justiça na renda, procurando defini-lo temperadamente, a partir de elementos de ordem económico-agrária e sociais, sem perder de vista os usos e costumes locais.

Igualmente por este diploma só vai ver restaurado o princípio de o senhorio participar nos sacrifícios correspondentes aos anos de excessiva esterilidade. Era o salutar preceito das Ordenações - livro 4, título 27 -, e que geralmente no Norte, sem embargo do Código Civil, os senhorios cristãmente sempre souberam respeitar - a consagrada prática da perdoança.

Este princípio é bem a m falar nos geógrafos, como Orlando Ribeiro e Lautensach, e nos sociólogos, como Rocha Peixoto e Paul Descamps.

Num recente meritório trabalho de A. Libert, publicado na Revista de Economia e Finanças, vol. 28, sob o título «O colectivismo agrário em Portugal», acham-se sumariados criteriosamente estes fundamentais elementos.

Cumpre ainda recordar adjutòriamente que no nosso direito tradicional as parcerias rural e de animais a ganho, tal como o arrendamento, os serviços de jornaleiros e criados, tudo cabia no contrato de locação. Isto se pode ver nas Instituições, de Coelho da Rocha, §§ 830 e seguintes.

É que predominantemente se atendia as afinidades da matéria predominantemente agrária que se versava, que não à tipificação das correspondentes figuras jurídicas. O Código Civil é que, obedecendo a critério de espírito sistemático diferente, destacou analiticamente para fora desse sector aquelas matérias afins.

Este fenómeno, embora radicado na tradição agrária portuguesa, não é exclusivo do nosso país. No Norte da Itália vai ele encontrar-se correntemente.

Sobre ele G. Garrara formula, na sua obra sobre os Contratti Agrari, 1946, p. 90, considerações judiciosas, que à Assembleia peço vénia para ler:

Para alguns trabalhos agrícolas (especialmente fenação, ceifas, debulhas, vindimas, vinificação) que, devendo ser realizados em tempo curto, reclamam trabalho superior àquele de que normalmente está provido cada fundo sucede que a mão-de-obra integrativa é fornecida, para empresas agrícolas pequenas, pelos vizinhos, com a obrigação de reciprocidade nos dias em que correspondente trabalho venha a ser realizado nos fundos cultivados pelos correspectivos vizinhos.

Este sistema de troca de mão-de-obra, cujas origens vêm de séculos, disciplina-se por usos locais. A utilidade de um tal sistema não pode ser posta em dúvida por assegurar a possibilidade de realizar, com a necessária solicitude, trabalhos que tecnicamente exigem rapidez de execução e para os quais seria difícil assegurar a disponibilidade de mão-de-obra salariada, dado tratar-se de trabalhos que se acumulam na mesma época e para os quais não seria sempre bastante a mão-de-obra local, e, de outra lado, tem notável valor social porque educa as classes rurais naqueles sentimen-