salas dos tribunais, nem nas mais altas instâncias políticas, como daqui a pouco veremos, a União Indiana, embora servida pelos poderosos meios da sua influência, pôde ganhar a Portugal. O nosso direito opunha-se às suas ambições, e era tão simples, tão claro, tão inocente, que todos se viam forçados a reconhecê-lo e muitos a reconhecer-lhe as vantagens para as populações, em paz entre si e no seio da Nação Portuguesa. Era demais.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

Batida em todos os campos, o único recurso que restava à União Indiana, visto não se libertar da sua obsessão em relação a Goa, era o emprego da força, e a única possibilidade nossa de o evitar era obrigá-la a montar uma operação em grande escala, com completo desprestígio do seu pacifismo e escândalo do Mundo.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

Muito tempo se pensou na União Indiana que um simulacro de levantamento em Goa podia prestar-se a uma intervenção de simples polícia que o Primeiro-Ministro apresentaria ainda como serviço gratuito à paz. Era desconhecer as circunstâncias locais: de um lado, o moral da população, a ausência absoluta de conflitos raciais ou religiosos, o nível de vida, embora modesto, muito superior ao da União Indiana, a liberdade -de- que gozava no seu pequeno país, como se lhe referia, e finalmente a união de séculos com Portugal não convidavam à aventura de mergulhar, com interesses, com tradições, com a nobreza da história, no pandemónio de lutas e miséria da União Indiana; de outro lado, a vigilância das autoridades fazia fracassar todos os planos. Tal método não se afigurou viável, embora só tivesse sido abandonado no último momento.

Agravada a questão pelas belicosas ameaças do Primeiro-Ministro da União Indiana e o começo de mobilização das suas forças militares, estava indicado se recorresse aos elementos políticos de que nos parecia podíamos dispor no nosso jogo. Daí as diligências junto dos Governos de Inglaterra, Estados Unidos e Brasil.

Temos com a Inglaterra velhas alianças consideradas plenamente em vigor pelos dois Governos. Não vale a pena referi-las, porque o essencial para o meu objectivo se encontra na declaração de 14 de Outubro de 1899, vulgarmente chamada Tratado de Windsor. Nesta declaração foi expressamente ratificada a validade do artigo 1.º do Tratado de 1642 e do artigo final do Tratado de 1661: o primeiro refere-se genericamente à aliança entre as duas nações; o segundo contém a obrigação do Governo Britânico de defender os territórios ultramarinos portugueses - na linguagem do tempo: todas as conquistas e colónias pertencentes à Coroa de Portugal - contra todos os seus inimigos presentes e futuros.

Tem sido entendido pelos dois Governos que a aliança luso-britânica não é automática, mas depende no seu funcionamento do casus foederis ou seja do juízo que cada um dos Estados forme da situação de guerra e da possibilidade de intervir. Isto quanto à aliança propriamente dita, porque quanto à obrigação de o Governo Britânico defender os territórios ultramarinos portugueses não entendemos nunca nem ninguém pode legitimamente entender que, formulada de maneira tão precisa e absoluta no Tratado de 1661, pudesse ficar dependente do casus foederis.

Vozes: -Muito bem, muito bem!

Aplausos.

Quer dizer que a obrigação de defender o nosso ultramar pela maneira adequada às circunstâncias não pode ter elidida.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

Aplausos.

Parece porém pretender desviar-se desta Unha a interpretação britânica, segundo a declaração feita na Câmara dos Comuns em 19 de Maio de 1958 pelo Secretário de Estado vara os Negócios Estrangeiros, que se referiu à forma de aplicação dos Tratados a territórios e a circunstâncias particulares sem a distinção que acima fiz. É peculiar à escola da prudentíssima diplomacia britânica, que tanto admiro neste particular (risos), esforçar-se, mesmo nas mais graves circunstâncias, por obter compromissos concretos em troca de promessas vagas (aplausos); e em face desta tendência uma simples declaração parlamentar, não acordada entre os Governos, não nos pareceu poder ter o valor de interpretação autêntica de um Tratado, que demais contém referência expressa às vantagens que Portugal concedera em troca da obrigação assumida pela Inglaterra.

Vozes: -Muito bem!

A nossa interpretação devia pois ser a melhor.

Vozes: - Muito bem!

Eu nunca fizera, em mais de trinta anos de governo, apelo aos Tratados de aliança, por entender quê uma fidelidade nunca desmentida os converteu de textos a invocar e discutir em sentimentos profundos e atitudes permanentes na política das duas nações.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

Aplausos.

Mas a Inglaterra, sim, invocou expressamente a aliança, por exemplo, para a concessão de facilidades nos Açores, em 1943, apesar da nossa declaração de neutralidade no começo da guerra. O livro branco sobre os Açores publicado em Londres em 1946 omitiu a referência às notas de 16 e 23 de Junho, 14 de Setembro e 4 de Outubro daquele ano, precisamente aquelas que se referem às garantias dadas pelo Governo Britânico a respeito da manutenção da soberania portuguesa em relação ao ultramar.

Vozes: - Muito bem!

Aplausos.

Verdade seja que a mesma prudentíssima diplomacia (risos) embora não limitasse no tempo a garantia prestada, a circunscrevera indirectamente às ameaças ou riscos que derivassem das nossas concessões de então. Dado o aperto em que a Inglaterra se encontrava, não nos pareceu bem levantar a questão e gastar