O Orador: -À cegueira dos autores da moção pode juntar-se, pois, a manifestação do seu ódio, explosão incontida de um recalque que mal conseguem reprimir.

Antes de' prosseguir quero pôr em evidência a inanidade de um estribilho muito em voga, imaginado pelos empresários da nova África e assoprado aos ouvidos de miríades de tribos que nela habitam. Quando se diz "a África para os africanos" devia compreender-se para os que lá nasceram, lá cresceram e lá edificaram os seus lares, como, por exemplo, os americanos dos Estados Unidos.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: -Devia compreender-se para os que a povoaram e a organizaram em estados constituídos, como, por exemplo, os dos vários estados das Américas Central e do Sul.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - Ligadas por idêntico fenómeno de atraso, a África e a América conservaram-se estáticas no passado, sem grande avanço nas manifestações da sua civilização. Foi preciso que o homem europeu para lá fosse, lá se instalasse e para lá transportasse a civilização cristã para que esses continentes progredissem e ganhassem a feição moderna de estudos organizados.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - Se a África para os africanos tiver que assentar no mesmo princípio que a América para os americanos, não vejo o motivo por que os pretos hão-de escorraçar os brancos da África.

Vozes:-Muito bem!

O Orador: -Na expressão popular, porém,. e na luta que se trava em Angola, é exactamente isto que está em evidência.

O Sr. Lopes Roseira: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador:-Faz obséquio.

O Sr. Lopes Roseira:-Não é isso que está em evidência em África ou Angola. Em Angola quem luta são os brancos, mas escondem-se atrás dos pretos, que empurram para a fogueira.

O Orador: -Muito obrigado pela intervenção de V. Ex.ª. Mas queria referir-me aos terroristas em acção activa.

O Sr. Lopes Roseira: - Os terroristas são elementos activos sob o comando encoberto de brancos.

O Orador: - A mística da negritude é tal, no arraial das reivindicações, que um grupo de dirigentes negros norte-americanos, conforme noticiaram os jornais, avistou-se com o Presidente Kennedy e com o delegado à O. N. U., Stevenson, para pedir que sejam adoptadas sanções económicas à África do Sul e proibido o fornecimento de armas a Portugal. Pediram também um "vasto Plano Marshall" de auxílio a África e o emprego de maior número de negros norte-americanos, devidamente preparados para a diplomacia e a condução de política externa.

No conceito destes negros americanos não deviam ser fornecidas armas ao verdadeiro povo angolano, que vive em Angola e defende vidas e bens dos intrusos que os pretendem subverter. No conceito destes negros americanos o povo de Angola, constituído por brancos, pretos e mestiços, devia deixar-se matar para dar entrada aos bandos de criminosos que os seus sequazes açularam, candidatando-se eles para seus dirigentes imediatos.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - E o complexo rácico ressalta dessa proposição oportuna, despida de disfarces, como se a cor da pele bastasse paru moldar a consciência dos povos.

É difícil para os que estão fora do ambiente a compreensão do nosso modo de viver. Embora se tenha dito já em vários tons, no próprio seio da O. N. U., repito: em Angola não há segregação racial, nem há lugares reservados para pretos ou para brancos. Há, sim, a consciência de um povo em formação; de naturais e não naturais, aglutinados pela civilização cristã, a coberto da paz portuguesa.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - Na apreciação do comum dos casos pode compreender-se o recalque dos colonizados que não tiveram honras de cidadania, Compreende-se ainda a luta dos excluídos pela conquista de uma posição no Mundo e pela realização dos sagrados princípios da fraternidade humana. O que não se compreende já é que essa luta seja orientada no sentido de dar a todos os casos a solução forçada de um modelo único, que não se ajusta do mesmo modo aos variados povos que tem de servir, alguns dos quais estão sofrendo as consequências desastrosas, vítimas desse mesmo modelo único.

Vi no Congo Português os assassinos de Holden Roberto alcunhados de nacionalistas angolanos. Vi como eliminaram vidas a esmo de homens indefesos e de crianças inocentes. Vi como violentaram as mulheres e as retalharam em seguida, na mais hedionda expressão de animalidade. Vi como saquearam os haveres dos proprietários e incendiaram os edifícios que levaram anos a construir. Vi como escalavraram as estradas e destruíram as pontes. Vi como se fez tudo isto, com ódio impregnado por uma propaganda persistente e estimulado por pregoeiros incansáveis da legitimidade do roubo e do crime.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - Aqui, deste lugar, acuso Holden Roberto como criminoso de alto coturno, responsável pela supressão violenta de milhares de vidas, levada a efeito pelos bandos de assassinos que lançou em Angola.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - O seu ódio ao branco, amadurecido no Congo ex-Belga, depressa se transmudou em ódio generalizado ao português de Angola.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Na impossibilidade de extremar raças, como aconteceu naquela antiga colónia belga, quando lhe foi dada a independência, mandou matar indiscriminadamente homens e mulheres de todas as cores que confessavam ser portugueses.

Comprometido numa decisão, com outros que como ele desconhecem o nosso modo de viver, esbarrou contra uma situação de firmeza que lhe causou engulhas. Não contava com ela o estranho homem que cresceu no Congo