O direito da contacto desdobra-se fundamentalmente em direito de visita e direito de correspondência, e ainda em direito de contacto activo (direito a fazer visitas, a enviar correspondência) e direito de contacto passivo (direito a receber visitas e correspondência). Nesta lei é encarado primordialmente do ponto de vista do doente e à luz do seu interesse; mas isso não quer dizer que do direito de contacto ora regulado seja sempre titular o doente. Interessa, numa lei de assistência psiquiátrica, determinar ainda em que medida pessoas titulares de interesses especialmente relevantes - o seu curador, o seu cônjuge, o seu advogado - só pode considerar terem o direito de visitar o doente ou de lhe enviar correspondência, sem que u direcção do estabelecimento em que o mesmo doente está internado possa a isso opor-se.
A Lei n.º 2006 consagra ao direito de contacto uma disposição única e breve, a do n.º l da base XX, que diz:
É assegurado ao internado, em qualquer regime, o direito de se corresponder livremente com o director do estabelecimento, a Inspecção da Assistência Social e o Ministério Público.
A disposição o por um lado insuficiente (trata apenas do direito activo de correspondência do doente, e entre as entidades que refere alta flagrantemente o seu tutor); por outro lado, é demasiado rígida. São concebíveis casos em que o exercício deste direito de livre correspondência prejudica o tratamento do doente, sem que a isso se possa opor o director do estabelecimento, mesmo assegurando de outro modo (visita, por exemplo) a fiscalização das condições da sua situação.
O projecto consagra ao assunto uma disposição bastante extensa: a da base XX, ora em análise.
O direito de correspondência é regulado em pormenor, embora por vezes talvez não com o melhor critério, quer do ponto de vista da forma [não havia necessidade de uma tão detalhada enumeração de pessoas nas alíneas a), b), c) e d) do n.º l, dado que a parte final da alínea a) - "pessoas ... que por ele revelem interesse" - engloba toda a gente], quer do ponto de vista do conteúdo (a correspondência não entregue ao hospitalizado deve ser remetida ao seu tutor ou representante legal, e não devolvida ou arquivada).
O direito de visita é englobado num direito de contacto com o exterior (que permite abranger os telefonemas), e este submetido ao mesmo regime "na parte aplicável" - forma que parece incorrecta quando um dos pontos fundamentais do regime (termos da proibição do exercício do direito, n.ºs 2 e 3) não pode ser aplicado por natureza - não se pode devolver ou arquivar ou remeter uma visita ou um telefonema -, pelo que a aplicação dos referidos n.ºs 2 e 3 seria sempre por semelhança, quase por metáfora.
Parece à Câmara de novo oportuno lembrar a disposição do artigo 92.º da Constituição Política - "as leis votadas pela Assembleia Nacional devem restringir-se às bases fundamentais dos regimes jurídicos"- como um dos fundamentos do regime que passará a propor.
As bases gerais do regime jurídico desta matéria parecem dever ser as seguintes:
Aplicação expressa do mesmo princípio ao direito de contacto com o exterior, acrescentando-se que é proibido o regime que por completo o tolha;
Possibilidade de recurso judicial ou de reclamação hierárquica a qualquer pessoa ou entidade injustificadamente afectada, nas suas relações com o internado, pelas restrições impostas.
Tudo o mais será desdobramento destas bases gerais do regime jurídico, a fixar - com cuidado e pormenor, aliás, dada a importância e melindre da matéria - em regulamento.
A liberdade do internado só pode ser restringida na medida em que o justifiquem o seu tratamento, o bom funcionamento dos serviços ou a ordem e segurança públicas.
Aliás, este preceito merece o seguinte reparo: sendo a intervenção judicial uma garantia, garantia da liberdade individual contra medidas abusivas de tratamento psiquiátrico, tomadas na maioria dos casos pelas entidades n que a base se refere, não se compreende que fique dependente da vontade destas (como o dá a entender o termo poderão) a efectivação da mesma garantia. A antecessora desta base XXI do projecto, a base XIX da Lei n.º 2006, se pouco clara também, e no entanto de melhor técnica, pois diz:
O internamento nos asilos para anormais perigosos e anti-sociais carece de confirmação judicial.
Por estes motivos, a Câmara propõe a supressão da base XXI do projecto.
Base XXII do projecto
Base XXIII do projecto