A principio respondia, com mal disfarçado orgulho, que era Deputado e que vinha participar nos trabalhos desta Assembleia. Alguns olhavam para mim de soslaio, com ar desconfiado, como se eu fosse um polícia à paisana. E se outros me felicitavam pela posição alcançada, não faltou quem me atirasse com esta: «Deputado? Mas para quê?». Isto para me persuadir de que toda a minha actividade era inútil. Ninguém me ouviria!

Ora a realidade é muito outra, e só por maldade ela pode ser deturpada a tal ponto.

Na verdade, Sr. Presidente, estou hoje aqui rendido e agradecido. E para agradecer ao Governo, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é para registar com o mais vivo apreço e profundamente reconhecido, em meu nome próprio e no das populações que represento, a satisfação de algumas aspirações aqui expostas e o bom encaminhamento em que outras se encontram já.

O navio Santo Antão navega nas águas de Cabo Verde desde Julho último, com grande aprazimento da minha gente. Só se espera que a sua exploração se faça em condições de servir as ilhas. Estou certo que isso não deixará de suceder logo que as naturais hesitações iniciais se solucionem e em termos que permitam a conjugação dos interesses de todas as ilhas, sem pressas e sem atropelos. É indispensável adaptar-se o navio à província, e não a província aos caprichos ou comodidade de cada um.

A companhia que explora as pozolanas da ilha de Santo Antão tem novos estatutos, nos quais se prevê a entrada do Estado como accionista, com 500 acções, aliás já subscritas - segundo me consta -, o que envolve uma actuação ainda mais pertinaz do Governo na protecção do produto. Assim ficará melhor assegurado o cumprimento dos despachos que a propósito citei na intervenção feita no primeiro período. A pozolana será um produto pobre, mas representa alguma coisa na economia também pobre de Cabo Verde.

Vejo com certo entusiasmo, não sem alguma preocupação ainda, que se formou uma sociedade com sede em S. Vicente, tendo por objecto toda e qualquer actividade industrial relativa a ou relacionada com hidrocarbonetos sólidos, líquidos ou gasosos, o que me foz supor que se vai caminhando para a instalação de uma refinaria naquela ilha. Sei, porém - e aqui estão as causas da minha preocupação -, que a coisa é difícil e que grandes peias se têm levantado e outras se levantarão por certo.

Aliás, dizia-me «há dias alguém, em tom displicente: «Mas. porque se há-de instalar uma refinaria em S. Vivente?»

Ora, valha-nos Deus! Pergunta a minha ingenuidade: mas porque se não há-de instalar uma refinaria em S. Vicente?

Vozes - Muito bem!

O Orador: - Numa terra de tão depauperada economia, porque se há-de entravar toda a tentativa para a fazer sair do ponto morto em que caiu? Se há quem queira instalar a refinaria, porque impedi-lo de o fazer, desde que não se trata de uma aventura?

Deixo as perguntas em suspenso e responda quem for capaz.

Apenas acrescentarei que não fizemos o cais acostável para «inglês ver». Antes - suponho - temos de tirar partido de tanto dinheiro gasto e da magnífica posição do Porto Grande, que durante tantos anos desprezámos em benefício de outros que bastos proveitos tiraram da nossa inércia. Daqui a pouco instalam-se refinarias em Dacar ou nas Canárias e nós teremos de transformar o cais em objecto de arte ...

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Finalmente, Sr. Presidente: nem eu fui a Angola ou a Moçambique, nem V. Ex.ª ou os Srs. Deputados foram a Cabo Verde. E certo. Não tive, assim, a honra e o grande prazer de receber VV. Ex.ª Mas a ideia de os responsáveis visitarem as províncias ultramarinas não caiu em cesto roto, ou antes, não foi só minha. O Ministro do Ultramar cessante, Sr. Prof. Doutor Adriano Moreira, acompanhado de altas personalidades ligadas à nossa administração ultramarina, esteve no arquipélago durante 28 dias e percorreu, com a sua comitiva, todos as ilhas, sem esquecer mesmo a desabitada Santa Luzia.

Claro que, em face deste balanço do realizações, a que se liga ainda o alargamento da pista do Sal para jactos, já em preparativos de execução, não vou dizer: «Que grande sucesso!» De modo nenhum!

Não me cabem, na verdade, as honras de tão úteis medidas tomadas, mas ao ilustre Prof. Adriano Moreira, a quem dirijo deste lugar as mais efusivas saudações do povo de Cabo Verde, reiterando ao que foi um dos mais dinâmicos Ministros do Ultramar os protestos da nossa maior consideração e do mais elevado respeito e apreço pelas suas extraordinárias qualidades de trabalho, a que se aliam uma lúcida inteligência e uma sólida cultura, alicerçada em profundo e directo conhecimento das terras e das gentes do nosso ultramar.

Vozes: - Muito bem!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Seja como for, Sr. Presidente, Cabo Verde orgulha-se pelo interesse que, mesmo pobre como é, mereceu do Prof. Adriano Moreira, além do mais que fica dito, pela viagem que fez às suas ilhas, que visitou uma a uma e de lês a lês.

E não foi tarefa cómoda, nem fácil. Eu tive a prerrogativa de acompanhar S. Ex.ª e sei quão dura e fatigante foi a longa caminhada por montes e vales, a pé, a cavalo, de jeep, de avião, de borco, por mares encapelados e ate às cavalitas sobre homens ...

E verdade, Sr. Presidente - até às cavalitas sobre homens!!!