A eleição dos valores humanos que hão-de formar o esciol da Nação, proclama o Prof. Leite Pinto, tem de fazer-se entre todos, e não apenas entre alguns.

Eu não sei que seja possível pensar ao invés, tão evidente, tão claro, tão conveniente, tão conforme com a natureza das coisas divinas e humanas é o acerto. Não sei.

Mas sei que, dito e redito ele, não estamos a procurar alcançá-lo com a indispensável e possível diligência.

E isso me dá tristeza e me dá pena.

Pena e tristeza que mais crescem quando reparo que naquela eleição não entram senão 20 por cento dos portugueses. Os restantes 80 por cento nem sequer suspeitam do inalienável direito que neles mora a nela entrarem também.

Porém, sei-o, e, porque o sei, aqui o clamo, se não para que o oiça quem deve, ao menos para que a minha consciência sossegue no remorso que nela ficaria se calasse o que ela sente e a atormenta.

O Sr. António Santos da Cunha: - Muitíssimo bem!

O Orador: - Em 1870, há, pois mais de 90 anos, o Ministro dos Negócios da Instrução, D. António da Costa de Sousa Macedo, redigiu o apresentou a el-rei, que a aprovou, uma reforma, da instrução pública que tornava obrigatório o ensino «para todos os portugueses de ambos os sexos desde a idade dos 7 aos 15 anos, sendo a frequência, escolar permitida a partir dos 5»!

Extraordinário governante! Visionário, lhe terão chamado.

A política menor, a política sem objectivo nacional, a que vive dos expedientes, habilidades e ajustamentos pessoais c das conveniências circunstanciais, então em plena euforia, e que aparece, aliás, em todas as épocas, impediu que tal reforma triunfasse.

Se houvesse logrado êxito, ter-nos-ia colocado entre os poucos povos da Europa que, naquela época haviam tomado já a dianteira no sector da educação e ter-nos-ia garantido hoje um lugar ao nível da Suíça, da Holanda ou da Suécia, por exemplo. Com ensino obrigatório até aos 15 anos e desde há quase um século, reconhecidas como são as faculdades extraordinárias de trabalho, de aptidão e de inteligência do português, onde estaríamos nesta, segunda metade do século XX? Quantos seríamos profissionalmente instruídos em Angola. Moçambique e Guiné? Com ensino obrigatório até aos 15 anos e desde então, que riqueza imensa teríamos aproveitado, que caminhos teríamos percorrido?

Responde-nos o eco de uma tristeza angustiante.

E a desolação mais se agrava, quando reparamos que vitória tão nobre cabia então, como hoje cabe, perfeitamente nas possibilidades da Nação. E só a tal política menor dela nos terá privado.

A lamentação nada resolve, é certo, mas ajudar-nos-á a tomar balanço ...

A política menor falhou a reforma, pelo que, 90 anos depois, estamos onde então nos encontrávamos - ensino obrigatório apenas na instrução primária de quatro classes!

Ensino obrigatório apenas nos quatro anos da instrução primária, no período etário dos 7 aos 10 a nos e mesmo esse efectivado na prática apenas desde 1956, embora viesse anunciado nos discursos desde 1820 e inscrito nas leis desde 1836!

Enquanto a totalidade da juventude dos países da Europa e de muitos de outros continentes avança, rumo ao futuro, pelo melhor caminho, o estudo ano após ano, nós quedamos a nossa população escolar em 80 por cento no termo da 4.ª classe!

Estes 80 por cento ficam de fora da eleição tão justamente pretendida pelo Prof. Leite Pinto. Fazemo-la, por isso, não entre todos os portugueses, mas apenas entre alguns. E vai nisto, nesta divisão entre 20 e 80 por cento, por fatalidade de condições que temos de combater, uma inqualificável discriminação social, de fundo económico, o que a torna ainda mais detestável, injusta e anti-humana.

E, no entanto, todos anuímos a que a constituição de um escol válido, garantia de aquém e de além-mar, tem de procurar-se à escala nacional.

Vozes: - Muito bem!

i, por isso mesmo, factor importante na produção da riqueza».

A apreciação objectiva do Dr. Veiga de Macedo é a do papel que, mesmo no plano de uma simples educação popular ao nível de um ensino primário elementar, a instrução desempenha na criação da riqueza, no acesso das populações a um melhor nível de vida.

Mas a apreciação terá, sem dúvida, maior oportunidade e justeza se se transpuser do simples ensino primário para uma instrução de maior grau, profissional ou não.

Entrámos já na idade da História em que os indivíduos dotados da acanhada ciência do saber ler, escrever e contar serão brevemente tão inúteis e incapazes como hoje o são os analfabetos em países de avançada técnica.

É que uma das realidades inelutáveis do nosso tempo, e do que se lhe seguir, é o extraordinário progresso tecnológico no mundo da economia e do trabalho. Este transforma-se a um ritmo que exige o progresso cultural e técnico das grandes massas, que, mais do que as matérias-primas, instalações e apetrechamento, são a sua dinâmica.

A organização tecnológico-cultural torna-se cada vez mais complexa e cada vez são mais necessários trabalhadores profissionalmente instruídos em todos os graus, com um alto nível cultural e profissional.

O rendimento nacional de um povo fica assim em directa conexão com o seu nível intelectual, pois este é condição fundamental, basilar, para o desenvolvimento das diversas actividades económicas - da agricultura e da indústria, do comércio e dos serviços.

Por isso se entende que os investimentos intelectuais constituem hoje o alicerce, a primeira infra-estrutura do progresso económico. As estruturas iniciais, feitas com base em máquinas, matérias-primas e outros factores, só poderão desenvolver-se e atingir o seu rendimento normal se puderem contar com suficiente potencial humano, cultural e profissionalmente apto.