perseverança e o tacto com que defendeu os nossos interesses, obtendo vitórias diplomáticas decisivas para a nossa presença em África.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Entretanto, solucionada a crise ministerial, o novo Governo vai tentando salvar o que pode salvar-se. O movimento patriótico atinge manifestações de exaltação compreensível e viril. Mas a política partidária continua a imiscuir-se-lhe no seio, de tal forma que, aos gritos contra a Inglaterra, já se misturam nas ruas os gritos contra as instituições. António Enes prevenia sensatamente: «Sacrifiquem ao patriotismo o seu partidarismo, que pouco sacrificam, e incorporem-se no movimento nacional sem intenções reservadas, sem programas de exclusão ou de demolição, sem gritos que afugentem condições alheias». E acrescentava, depois de proclamar que «todas as bandeiras políticas se devem abater diante da bandeira da Pátria»: «Só seremos fortes sendo unidos e só poderemos ter união esquecendo-nos de que somos monárquicos ou republicanos, regeneradores ou progressistas, para só nos lembrarmos que somos portugueses»!

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Belas palavras, escritas em 1890, condenação formal e corajosa do espírito partidário e da sua acção nociva dentro das nações!

Muito poucos as quiseram ou souberam entender. Cegos no feiticismo da sua ideologia, enredados na sua mecânica interna, os partidos esqueceram que servir a Pátria, especialmente em horas de crise como aquela, é abater bandeiras políticas e olhar apenas o interesse da Nação.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

Almeida, herói dos Dembos: «Todos os homens da ocupação se sentiram mais ou menos amparados pelo rei, estimulados, dirigidos - e ele era bem o coordenador de uma acção africana e de uma acção diplomática na Europa». Gesta maravilhosa, horas em que se vai criando história, em que a vontade da Nação se afirma contra ventos e marés, contra ameaças e cobiças.

Também então, também então se ia dizendo que era tarefa superior à nossa capacidade de pequeno país, à nossa força exígua de povo decadente. Também então, também então alguns espíritos malfadados iam ciciando que seria impossível resistir ao jogo combinado de Londres e Berlim, em perspectivas de partilha das nossas províncias de África, à força poderosa das esquadras, das intrigas, da diplomacia dos grandes. Nas mãos do Gungunhana estava a atestá-lo aquele presente da rainha de Inglaterra, taça de prata com inscrição que define uma diplomacia: To Gungunhana from Victoria Queen ...

Mas na África se escrevem, e ntretanto, belas e admiráveis estâncias de um canto heróico e pujante. Em carta ao príncipe real Mouzinho poderia escrever justamente, anos depois:

«Essas poucas páginas brilhantes e consoladoras que há na história de Portugal contemporâneo escrevemo-las nós, os soldados, lá pelos sertões da África, com as pontas das baionetas e das lanças a escorrer em sangue. Alguma coisa sofremos, é certo; corremos perigos, passámos fomes e sedes e não poucos prostraram em terra para sempre as fadigas o as doenças. Tudo suportámos de boa mente, porque servíamos el-rei e a Pátria, e para outra coisa não anda neste mundo quem tem a honra de vestir uma farda».

Acima das paixões, acima de interesses e vilezas, a figura de D. Carlos vai-se destacando e agigantando. A par da gesta africana há toda uma diplomacia que se desenha, séria, persistente, perseverante, a tentar refazer o abalado prestígio de um País caído, sobre o qual o interesse das potências atirava pedradas e pedradas de descrédito - para o amesquinhar ainda mais no concerto mundial.

O nosso interesse de nação jogava-se na África, mas o destino da África jogava-se também nas chancelarias da Europa. O soldado era preciso, mas a acção do diplomata seria decisiva. E aí vai el-rei, pelas principais capitais europeias, com o seu trato superior, cultura ágil, subtil poder de cativar, aí vai el-rei a recolher algum respeito e prestígio para o seu país. Paris, Berlim, Londres, são capitais visitadas. Traz a Lisboa o imperador Guilherme II, da Alemanha. Eduardo VII, de Inglaterra. Afonso XIII, de Espanha, o presidente Loubet, da República Francesa. Fialho de Almeida o reconhecerá: «Trazer a Lisboa, em dois anos consecutivos, os chefes dos três grandes estados políticos da Europa -Eduardo e Alexandra, Guilherme II e Loubet (os três príncipes directamente e sem itinerário por Espanha), para um País abatido, de 5 milhões e meio de habitantes, na ponta da Europa, e sem papel algum na política mundial, é um triunfo diplomático de tal maneira claro que ninguém contentará tenha ele sido alcançado pelo prestígio e esforço de táctica pessoal do rei D. Carlos, que, todos sabem, quis sempre tratar por suas mãos, e com particular cuidado, as questões de política exterior».

Estava em preparação a sua viagem ao Brasil quando o regicídio o abateu. Dessa viagem, tão carinhosamente preparada, esperavam-se resultados de grande significado nas relações dos dois países.

Sr. Presidente: enquanto a acção esclarecida do monarca se estendeu apenas aos domínios da política externa e da preservação do nosso património africano - tão entrelaçados eles andavam, por então, como hoje se interpenetram irresistivelmente - bem o deixaram mais ou menos livre, entretida a actividade partidária no jogo torpe das clientelas eleitorais, na mesquinhez aflitiva de uma guerra de poleiros, que nem deixava enxergar a obra extraordinária que a nossa diplomacia e os nossos soldados iam erguendo, a golpes de inteligência e à ponta de espada, no serviço devotado da Pátria. A nossa vida caseira ia, porém, cada vez mais, envilecendo. Gama o Castro bem o havia escrito lapidarmente em O Novo Príncipe: «toda a nação que, tendo importantes relações exte-