até ao fim da campanha, é para não aproveitar à batata nacional, que, entretanto, não virá aos grandes mercados.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Ora, a escassez ultimamente sofrida resulta essencialmente disto: o preço que se tem querido impor no retalho deixou de ser um preço realista, porque nos mercados das regiões produtoras já corre mais alto. Uma carta que correspondente desconhecido (não anónimo!) me enviou há dias de Chaves diz isto, e com isto diz tudo:

Na feira do fim do mês, ontem, em Chaves, a batata vendia-se a 2$30 cada quilograma, e não aparecia quase. Chaves é cognominada a capital da batata: como se pode vender em Lisboa a 1$90?

Não pode, e tanto é que teve de vir do fora, ganhar o preço negado à de cá.

Sr. Presidente: a luta do Governo pela estabilidade dos preços dos géneros essenciais à alimentação pública tem sido longa, e tem sido verdadeiramente heróica. Ano após ano, resistindo a solicitações tão repetidas como prementes, o Governo, com pertinácia que admiro antes do que louvo, tem-se recusado a consentir em mais do que em actualizações mínimas, considerando de maior vantagem para o público sujeitá-lo a ocasionais privações do que a uma inflação com riscos de ir longe.

Esta tenacidade, e o rigor das fiscalizações, tem sido talvez a característica mais constante de uma política económica que no mais, servida por Ministros ora dirigistas, ora liberais, por Secretários de Estado ora revolucionários, ora conservadores, deixa muito observador indeciso na busca de uma linha de continuidade (risos).

Aplicada em toda a sua força aos produtos agrícolas - é só ver como têm subido os preços do peixe! -, ela tem constrangido a lavoura a tensões económicas que começam a atingir os valores de ruptura.

Aos agricultores queixosos da sua triste condição responde-se oferecendo crédito, sobretudo apontado à continuação das mesmas culturas que os arruinam, ou aconselhando-os a reconversões, para as quais nem já há capital, que os constrangimentos dos preços queimaram ou não deixaram arrecadar, nem abundam atractivos. De sorte que um número crescente de explorações agrícolas está em vias de ter de cessar actividades por atingirem a falência ou de as restringir quase até à paralisação para não chegarem lá tão depressa.

O Governo e o País têm de se ir preparando para novas e maiores crises no abastecimento público, de que esta da batata não é senão pálida amostra, e o aviso que quis deixar, ao debruçar-me sobre as dificuldades do momento, é o de que essas se desencadearão inevitavelmente se dirigentes e consumidores não se resignarem à actualização dos preços dos produtos alimentares de origem agrícola, actualizações que terão de ser tanto mais gravosas quanto mais se têm demorado.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Martins da Cruz: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faz favor.

O Sr. Martins da Cruz: - Pareceu-me na última afirmação de V. Ex.ª um certo pessimismo. Quero dizer que confio muito nos organismos de coordenação económica.

O Orador: - Bem-aventurados os simples de espírito! (Risos).

De outro modo regressaremos ao regime do género barato, sim, no papel, mas ausente dos mercados, que tão profagado foi sob este mesmo tecto há duas dezenas de anos.

Nem pense alguém que poderá fugir-se às actualizações de preços, como de outra vez, pelas importações maciças de produtos estrangeiros. Muitos desses já estão mais caros do que os nossos - veja-se ainda a nota de ontem sobre a batata -, e de qualquer maneira as divisas de que a Nação pode dispor têm de ter outras aplicações.

O Sr. António Santos da Cunha: - Muito bem!

O Orador: - Estas crisezitas incomodaram? Pois bem, outras maiores virão se providências não forem tomadas para tornar economicamente possível a continuação da produção agrícola. Não se iludam tão-pouco com que a alternativa esteja nas receitas de gabinete para aumentar a produtividade: essas receitas custam caro a aplicar, e à lavoura não a deixaram capitalizar para investir na própria modernização.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - A mais próxima crise será talvez a do leite, que se insiste em não consentir valorizar em mais de dois terços do preço do vinho; ...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - ... esta, tudo indica que está à porta.

Há que consciencializar o público para estas verdades; há que lembrar aos homens das cidades que os maiores consumidores dos seus próprios produtos são ainda os campesinos, mas não poderão continuar a comprar-lhos se não tiverem com quê!

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - A imprensa pode ser um precioso elemento esclarecedor e orientador da opinião nesta conjuntura; e a imprensa, que se lastima dos efeitos do encarecimento dos artigos industriais no custo do seu próprio produto, há-de decerto compreender a situação da lavoura, vendendo com ainda bem menos valorização produtos em cuja base entram também em proporção crescente matérias provindas da indústria.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Vítimas ambas da subida dos preços fabris, estão nas condições de se entenderem e entreajudarem.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - São porém muitos os que ainda querem explorar, até ao limite das extremas possibilidades, em proveito próprio, os magros restos da lavoura, e lhe saem ao caminho procurando tolher qualquer iniciativa que ofereça dar alentos à produção agrícola para resistir às suas maquinações.

Tivemos ainda há dias um exemplo que impressionou certos sectores do público e se concretizou não sei se num se em mais artigos de jornal e em não sei também quantos telegramas de protesto nas secretarias ministeriais.