no plano político. Tínhamos bem presente a ciência dos grandes obreiros do ultramar.

Já em Maio de 1902 o governador-geral de Angola, conselheiro Cabral Moncada, no seu admirável relatório à Secretaria do Ministério da Marinha, assim se pronunciava:

Por isso, sem advogar a teoria absoluta de uma descentralização completa, que essa até a combateria, é minha opinião, associada aliás à de tantos, cuja companhia ilustra, que é absolutamente preciso confiar mais na iniciativa das autoridades superiores locais, alargando-lhes as suas atribuições e tornando delas exclusivamente dependente a solução de múltiplos casos, cuja sujeição à decisão do Governo central por acaso chegara às vezes a ser deprimente das suas atribuições, que devem ser altas e bem outras de aquelas que, pela legislação em vigor, muitas vezes é forçado a exercer.

E noutro passo do relatório dizia:

... direi em todo o caso que a lição do passado nos pode proficuamente ajudar no futuro, se, vistos os inconvenientes até hoje verificados, tivermos a forca precisa para reagir contra a rotina e, descentralizando sem emancipar, soubermos escolher os homens e facultar-lhes os meios.

Vozes:-Muito bem, muito bem!

O Orador: - Também, no 2.º Congresso Colonial Nacional, de 1924, o antigo Ministro Manuel Ferreira da Bocha, na sua tese «Bases orgânicas da administração colonial adequada a cada colónia», escreveu:

Convém não esquecer que comete erro grave quem esperar das leis remédio único e bastante para os inconvenientes que se notam ainda hoje na administração das colónias; tanto ou mais do que leis, tem directa e imediata influência a escolha do pessoal governativo, principalmente a escolha dos governadores. Nesse ponto -triste é confessá-lo-, o atraso, talvez mesmo o retrocesso, em Portugal é considerável: selecção de pessoal administrativo não existe de facto. Governadores são em regra escolhidos conforme a sua influência na política partidária ou parlamentar.

Bem conhecemos todos o esforço ingente desenvolvido ao longo das últimas décadas para melhorar a eficiência da administração ultramarina, mas pesa-me reconhecer que nem sempre os governadores se aperceberam das suas grandes responsabilidades.

Vozes: -Muito bem, muito bem!

O Orador: - Tenho para mim que muitas das questões agora suscitadas não teriam sequer adquirido relevo, se bem que também estejam em causa os homens que nas províncias desempenhavam funções de direcção na vida política, económica e social, sem tirarem o devido partido de instituições cuja autenticidade não chegou a ser revelada.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Em minha opinião, a função de governo é essencialmente política. Governar não é administrar. Não basta que se faça política em Lisboa. Também no ultramar há que fazer política - a mais hábil em verdade e justiça.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - O prevalecimento da política sobre a administração revela-se cada dia mais instante para defesa da coesão interna: a nossa maior força na luta contra os inimigos e adversários da unidade nacional.

Para tanto, todos e cada um, dentro das possibilidades, devem ser portadores de espírito de missão no combate ao desgaste moral dos indivíduos e das instituições, proporcionando-lhes uma intervenção mais activa no governo da res publica. Se o soubermos fazer, cumpriremos a nossa obrigação e defenderemos o património histórico que, vitoriosamente, tem de ser continuado pelas novas gerações.

Vozes:-Muito bem, muito bem!

O Orador: - Sim, vitoriosamente!

Mas, juventude de Portugal, repara que tens na retaguarda, e até mesmo à vista, alguns que te atraiçoam e querem negociar com o inimigo o solo da Pátria!

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Dá o teu coração e a tua vida para defenderes a liberdade dos que connosco vivem, há séculos, sob a bandeira de Portugal. Mas desembainha a tua espada para expulsar os traidores.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Eles hão-de exclamar, como Eneias:

O terque quaterque beati queis aute ora patrum, Trojae sub moenibus altis!

Expulsa-os! Força-os a gritar, lá de bem longe: «Felizes, mil vezes felizes, aqueles a quem foi dado morrer, à vista dos pais, sobre o solo da Pátria!»

Vozes: -Muito bem, muito bem!

O Orador: - Tem sempre presentes, é juventude, os versos de Camões, quando Vasco da Gama, no meio da tempestade, se dirige à «Divina Guarda»:

Oh! Ditosos aqueles que puderam

Entre as agudas lanças africanas

Morrer, enquanto fortes sustiveram

A Santa Fé nas terras mauritanas!

De quem feitos ilustres se souberam,

e quem ficam memórias soberanas,

De quem se ganha a vida, com perdê-la,

Doce fazendo a morte as honras dela!

Expulsa-os! Não merecem a tua sentinela!

Vozes: -Muito bem, muito bem!

O Orador: - Tenho autoridade para o dizer, como todos os que, como eu, têm filhos em armas na terra querida e mártir de Angola e nas demais terras, igualmente queridas, de além-mar.

Vozes:-Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.