por concluir que, na verdade, certos problemas têm sido vistos muito à superfície, pois só assim se poderá compreender, por exemplo, como temos sido levadas a seguir, no terreno da prática diária, um sentido escandalosamente plagiado do médico do homem.

Para mim, além do plágio que contribuiu em parte para a falência da acção técnica e teve necessariamente as suas repercussões económicas na classe, julgo que a razão remota, ainda que aparentemente pouco verosímil, deve filiar-se na denominação de tão prestimosos técnicos - médicos veterinários.

Se apenas se denominassem veterinários, certamente já teriam sido atendidas as suas justas aspirações. Porém, também se chamam médicos, e aí reside a razão do seu infortúnio, pois é doutrina assente neste país, ainda que falha de objectividade, que médico é sinónimo de clínica livre, fingindo-se ignorar que isso é avis rara que muitos poucos possuem! E mesmo que assim não fosse, o fenómeno deveria considerar-se sadio estímulo, como aliás acontece a outros técnicos, e não motivo para se não pagarem condignamente os seus serviços.

O que até agora cá por casa se passa ensina-me a aconselhá-los a repudiar uma designação que traz o estigma do desinteresse e aviltamento.

Médicos são licenciados que, somos forçados a concluir, se desejam relegados para plano secundário, ainda que se saiba, mas facilmente se esqueça, que o curso é dos maiores, mais caros e daqueles que exige mais tempo de especialização e trabalho constante de actualização.

Ora é fora de dúvida que os médicos veterinários municipais, percebendo vencimentos de 2100$, 2200$ e 2300$ ilíquidos, conforme a categoria da câmara, não podem considerar-se remunerados de maneira compatível com o plano social em que se movimentam, mesmo quando os confrontamos com os próprios colegas que servem o Estado.

Esta diferença de tratamento, além das repercussões de carácter social, económico e até político, é ainda razão de des interesse profissional, pois não se vê que de tão magros rendimentos se possa extrair dinheiro para livros, revistas, etc., a fim de se aperfeiçoarem, actualizarem e cultivarem.

Comparando-os ainda com outros funcionários camarários de igual nível universitário, é evidente a sua inferioridade em matéria de proventos; lembremos que um engenheiro de uma câmara de 3.a aufere o dobro do seu vencimento, e todos sabemos que a estes é possível o trabalho particular em projectos, etc.

Não é de mais salientar que os proventos provenientes da clínica são praticamente inexistentes na maior parte dos concelhos ou, pelo menos, pouco apreciáveis. Deve ainda ter-se em conta a circunstância da indispensabilidade da actuação destes técnicos no controle alimentar e no fomento pecuário, problemas, aliás, da maior acuidade.

Os veterinários, e em especial os municípios sob cuja responsabilidade e intenso labor em parte se alicerça a saúde pública e determinado sector da produtividade, vivem em condições que hoje se podem considerar, sem exagero, incompatíveis com o grau universitário da sua formação científica e com o estímulo que lhes é devido pelo alto valor do seu mister.

São atirados para as câmaras, onde um vencimento pouco menos que medíocre os vincula à mediocridade material de uma vida sem horizontes, ainda que heroicamente vivida!

Salva a especificidade inerente a cada província, as considerações que vou fazer para o Algarve aplicam-se a todas as províncias, e, certamente, as razões dos médicos veterinários do Algarve são igualmente válidas para o resto do País.

Foi dado conhecimento ao grande público da orientação política do Governo em dois sectores que actualmente se consideram basilares para a economia nacional. Um, a reconversão da agricultura no sentido de lhe dar uma maior rentabilidade através do fomento e do melhoramento animal; outro, o turismo, que tem no Algarve as suas maiores e mais exuberantes potencialidades.

Não se me afiguram viáveis nem exequíveis tais programas sem a existência de técnicos, e a existência destes só aparecerá se se forem criando pólos de interesse para a juventude que procura uma profissão.

Gomo poderemos pretender ver preenchidos os nossos quadros técnicos se a maioria dos profissionais, mormente os universitários, não encontram justa remuneração para a sua actividade e até às vezes nem sequer ocupação?

Vem isto a propósito do problema dos veterinários e, adentro destes, dos médicos veterinários municipais.

O Algarve ocupa 507 000 ha, com 325 971 habitantes, possuindo 38 000 explorações agrícolas.

Pelo arrolamento de 1955, um efectivo pecuário constituído por:

de cabeças

Um abate médio anual nos matadouros municipais de 1872 t, distribuídas assim:

Uma indústria de salsicharia representada por 60 oficinas caseiras (ano de 1962).

Um consumo de leite em natureza de 3 970 794 1. Com um número de estábulos de vacas leiteiras de 1575, com uma população de 4465 vacas (ano de 1962).

Um consumo de ovos que se calcula nos 17 milhões de unidades (ano de 1962).

Cerca de 34 depósitos de bacalhau (ano de 1962).

Inúmeras lotas de peixe com um movimento anual, em 1960, de 43 106,5 t de peixe desembarcado, no valor de 183 312,9 contos (que deverão sofrer sempre a inspecção sanitária).

Um movimento de crustáceos calculado, em 1960, em 46,7 t, no valor de 7510,9 contos (não se contam as conquilhas, mexilhão, ostras e berbigão).

Inúmeros parques de cultura de moluscos bivalves (amêijoas), cerca de 681, espalhados numa área de 296 050 m2, donde saíram, em 1960, 320,4 t de amêijoa.