portuguesa em condições de poder juntamente com as outras apreender os conhecimentos do ensino primário.

O Sr. Gonçalves Rodrigues: - V. Ex.ª dá-me licença?

A Oradora: - Faz obséquio.

O Sr. Gonçalves Rodrigues: - Gostaria de saber como são formados os professores que se destinam ao ensino da língua e onde está a escola normal que prepare o corpo docente destinado a essa função específica. Onde se aprendem os métodos do ensino da língua portuguesa como segunda língua, porque no fundo parece que é disso que se está a tratar? Exige-se uma didáctica nova, e não apenas a convicção de que basta saber português para o ensinar. Tudo isso põe problemas de organização científica de definição de planos de estudo apropriados. Não há institutos de fonética, não há preparação de foneticistas. Parece que seria por aí que se devia começar.

A Oradora: - Mas temos de aproveitar o que há...

O Sr. Gonçalves Rodrigues: - É preferível parar para se reflectir antes de prosseguir por caminho errado.

A Oradora: - Julgo que para ensinar a falar e a entender a língua àqueles povos não é preciso ter muita preparação...

O Sr. Burity da Silva: - V. Ex.ª dá-me licença?

A Oradora: - Faz favor.

O Sr. Burity da Silva: - Referindo-me precisamente ao aspecto a que, o Sr. Deputado Gonçalves Rodrigues acaba de aludir, estou convencido de que, se formos a aguardar uma tecnicização perfeita para o problema do ensino do ultramar se encaminhar para uma solução, cairemos naquele ditado que diz que o óptimo é inimigo do bom.

Pelo menos em relação a Angola, sei que se está a fazer um esforço enorme e que estão criadas já algumas escolas de magistério. Estão a preparar-se professores auxiliares do ensino elementar, e esta é uma batalha enorme, imperiosa que não pode aceitar delongas.

Temos de andar para a frente sem perdermos de vista a necessidade de tecnicizar o ensino, de criar esses elementos de preparação de professores. Não há dúvida nenhuma de que esta primeira arrancada tem de se orientar em termos de se obter o satisfatório, se não se puder obter o óptimo.

O Sr. Gonçalves Rodrigues: - É evidente que temos de trabalhar tendo presentes as exigências imediatas, mas também a necessidade de uma planificação a longo prazo. Isso é que não se deve perder de vista.

Em pleno século XX, não se pode ficar no plano meramente empírico. Ternos de caminhar, e sei que as autoridades de Angola estão realizando nesse sentido os mais louváveis esforços. Mas uma planificação verdadeiramente nacional do ensino é coisa muito diferente; não podemos abandonar tudo ao desequilíbrio das iniciativas individuais, por meritórias que sejam.

A Oradora: - V. Ex.ª dá-me licença? Eu creio que precisamente nessa linha de rumo que V. Ex.ª acaba de expor, me referi também à necessidade de centros pedagógicos sérios.

O Sr. Gonçalves Rodrigues: - Mas criar centros pedagógicos é uma coisa, criar centros de estudos linguísticos é outra. Eu continuo a lamentar que exista uma escola na Universidade Técnica em que se ensina um pouco de tudo, desde a administração até à filologia, desde as ciências sociais até ao jornalismo.

E isto sem deixar de reconhecer o dinamismo da escola e o admirável espírito de romper contra a rotina, É mais um aspecto do forçado imobilismo do Ministério da Educação Nacional. Mas as coisas têm o seu lugar próprio; as línguas ensinam-se nas Faculdades de Letras e nos centros linguísticos e o ensino científico das línguas indígenas devia fazer-se nas Faculdades de Letras, que deverão estar equipadas para proceder a esse estudo em bases científicas.

O Sr. Pinto Bull: - Eu tenho a impressão, Sr. Professor, de que há aqui um equívoco. Em Angola e Moçambique estão criadas escolas do magistério primário, onde se formam professores primários.

O Sr. Gonçalves Rodrigues: - Quem são os professores dessas escolas?

O Sr. Pinto Bull: - São idênticos aos professores da metrópole, pelo menos na lei.

O Sr. Gonçalves Rodrigues: - Idênticos como?

O Sr. Pinto Bull: - As escolas do magistério primário são idênticas às da metrópole.

O Sr. Gonçalves Rodrigues: - Pois isso mesmo é que é de lamentar! Temos de sair do velho hábito: quantas vezes o Ministério do Ultramar se limita a ordenar que a legislação do Ministério da Educação se publique ipsis verbis no Boletim da respectiva província?

Os problemas hoje são muito diferentes, e se a revolução que vivemos neste momento não atingir em cheio a educação, ela não alcançará a plenitude dos objectivos nacionais que todos temos a peito.

O Sr. Pinto Bull: - Estamos neste momento numa guerra de vida ou de morte e há toda a vantagem em não parar.

O Sr. Gonçalves Rodrigues: - Mas não podemos esquecer que, se o óptimo é inimigo do bom, devemos ter sempre presente a visão ideal do óptimo, mesmo que só possamos realizar o bom.

O Sr. Pinto Bull: - Mas, enquanto não tivermos esse ideal, não podemos parar. Qualquer paragem neste momento seria morrer.

A Oradora: - É uma medida justa, pois que essas crianças sem essas classes estariam sempre sujeitas a uma diferenciação no ensino. Contudo, há necessidade de se fazer um ensino de base que comece muito antes das escolas primárias. O ensino pré-primário oficial, sobretudo nas áreas urbanas e suburbanas, muito contribuiria para que as crianças não só aprendessem mais rapidamente a língua portuguesa, como também adquirissem mais facilmente os hábitos e os costumes da vida civilizada. A necessidade do ensino infantil e pré-primário, já brilhantemente defendida nesta Câmara por alguns Srs. Deputados, torna-se mais premente ainda no ultramar, pelas razões que acabo de expor.